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sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

Sobre fazer novo o ano novo!

                Todo final de ano se parece, as pessoas exaustas por um ano de muita labuta, divergem ao conceituar o ano que finda. Alguns comentam que o ano anterior foi muito bom e que esperam repetir a dose, outros desejam esquecer o ano que termina e apostam firmemente que o ano que se inicia será melhor. Chamou-me a atenção uma imagem do réveillon numa praia em que um menino negro sem camisa, com os pés na água, pois, provavelmente foi pular as sete ondas na passagem do ano, olha na direção do oceano com uma expressão preocupada (estaria ele olhando preocupadamente sobre o que as ondas do destino lhe trarão ou o oceano de preconceito e desigualdade no qual terá que navegar?), nesta imagem, ao fundo, pessoas brancas vestidas com a cor padrão da passagem do ano e de costas para o menino se abraçam (estariam elas a demonstrar seu caráter ao virar as costas, mesmo inconscientemente, para não ver algo que as tire de seu paraíso idílico?). A imagem diz tudo: o ano novo começou no calendário, mas, não nos corações e mentes das pessoas. Apesar do novo ano, o gari, mesmo tendo em vista sua grande importância social para a saúde e bem-estar da população, continuará sendo tratado por muitos como o “mais baixo na escala do trabalho” em conformidade com o pensamento de famoso apresentador de telejornal. Pobres continuarão sendo pessoas que “têm mesmo que trabalhar no dia de natal, pois, não estudaram” na opinião de um cliente abastado e daqueles que partilham de seu pensamento. Professores, apesar de seus imensos esforços em condições de trabalho cada vez mais precarizadas, e, em que pese sua extrema importância ante a crise civilizacional, continuarão a ser taxados de doutrinadores (que, no entanto, já não conseguem sequer fazer os educandos estudarem para as provas). E negros, serão sempre aqueles que inconvenientemente apertam a buzina dos automóveis na visão de outro apresentador de telejornal e daqueles que comungam de sua opinião.
            Há um texto genial de Roberto Pompeu de Toledo, geralmente atribuído de forma errônea a Carlos Drummond de Andrade do qual extraio um fragmento: “quem teve a ideia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano foi um indivíduo genial. Industrializou a esperança fazendo-a funcionar no limite da exaustão. Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez com outro número e outra vontade de acreditar que daqui para frente vai ser diferente...”. A passagem de ano é uma celebração que Gramsci afirmava odiar, pois, entendia que esta se dava pelo signo do capitalismo, as pessoas celebravam porque seus antepassados celebraram. Ele não era contra as pessoas unirem-se em momentos festivos para celebrar o que fosse, mas, tal como Marx afirmava em relação à religião no século XIX, que a fé desprovida da luta, não muda o status societário, a passagem do ano, em si não mudava nada. Os opressores continuariam a ser opressores e os oprimidos continuariam oprimidos. Em seu ver, a não ser que a pessoa em seus propósitos resolvesse fazer de cada dia, um ano novo, e prestar contas consigo própria, porém, não em uma data fixa estabelecida pelo capitalismo, mas, a cada novo dia, em relação ao dia de ontem, o ano novo jamais ocorreria. Gramsci afirmava que não havia uma muralha que separasse o novo ano do que lhe antecedeu, pois, para a maioria, apesar do novo ano tudo continuaria como antes em virtude de seu imobilismo, de sua apatia em buscar fazer as mudanças ocorrerem ante as injustas situações postas.
            Para encerrar, cito um fragmento do artigo “Receita de Ano Novo” de Carlos Drummond de Andrade: “para ganhar um Ano Novo, que mereça este nome, você meu caro, tem de merecê-lo, têm de fazê-lo novo. Eu sei que não é fácil, mas tente, experimente, consciente. É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre”.
Afinal, fazer as coisas do mesmo modo e esperar um resultado diferente, não é mostra de persistência, mas de tolice! O ano de 2018 está dentro de você, cabe a você decidir se vai deixá-lo existir, ou se o aborta, e permanece em 2017, 2016, 1964, 1954, 1932...

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