Powered By Blogger

quinta-feira, 26 de julho de 2018

A tolice da inteligência brasileira: uma leitura crítica e necessária!



Em sua obra “A tolice da inteligência brasileira: ou como o país se deixa manipular pela elite” Jessé Souza afirma que a dominação das classes privilegiadas sobre as demais ocorre por meio do convencimento. É necessário convencer o povo de que privilégios resultantes do capital financeiro adquirido por herança ou pelo capital cultural adquirido de berço são merecidos e que os excluídos são culpados de sua extrema miséria econômica e cultural. Souza alega que no passado o povo era convencido da justeza dos privilégios das elites pelos sacerdotes que garantiam que a nobreza tinha sangue azul por determinação divina e que hoje são os intelectuais a fazer este papel. Os privilegiados não querem apenas manter os privilégios, querem também convencer os excluídos de que seus privilégios são justos e que fazem por merecê-los. Para isso contam com intelectuais que tanto podem ser oriundos da elite ou conquistados mediante o poder financeiro. O autor faz profundas críticas a Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Roberto DaMata, Raymundo Faoro, etc. e desconstrói as teses da herança maldita de Portugal, do personalismo, do patrimonialismo, do brasileiro cordial, etc. demonstrando que a nossa sociedade é assim porque tem suas bases fincadas no sistema escravocrata e isso explica o caráter de nossas elites, no dizer de Darcy Ribeiro: “O Brasil, último país a acabar com a escravidão tem uma perversidade intrínseca na sua herança, que torna a nossa classe dominante enferma de desigualdade, de descaso” ou ainda “O Brasil tem uma classe dominante ranzinza, azeda, medíocre, cobiçosa, que não deixa o país ir pra frente”.
O autor reitera que há muito tempo o Brasil está entre dois projetos: continuar a ser uma sociedade com herança escravocrata em que cerca de 20% da população forma uma sociedade de consumo e mantém à margem a maioria da população, ou  incluir o restante da sociedade e formar uma grande sociedade de consumo em massa em que os pobres teriam asseguradas condições dignas de sobrevivência e os já ricos poderiam se beneficiar ainda mais. Jessé desmistifica o discurso meritocrático e prova ser ele falso ao demonstrar que a pessoa saída dos extratos mais pobres não tem a mesma condição para competir com a pessoa bem nascida (classe alta e classe média). Souza afirma que a classe média (capital cultural) tem uma inveja ressentida da classe alta (capital financeiro) e, que se considera melhor que aquela, pois, o que possui é seu por mérito tendo em vista não ter herdado grandes somas de capital e, por se localizar no meio, entre a classe alta (que sonha utopicamente ser), e a classe baixa (a ralé) constituída por pessoas excluídas do sistema. A classe média é muito importante para a classe alta, pois, constitui sua massa de manobra na manutenção da sociedade tal como se encontra. Assim, a classe média posa de moralista, faz o discurso da pseudo-meritocracia e luta contra qualquer possível avanço social das classes mais baixas. Nas palavras do saudoso intelectual Milton Santos (1926-2001): "A classe média não quer direitos, ela quer privilégios, custe os direitos de quem custar."  Neste sentido, a classe média quer manter para si o filão dos empregos melhor remunerados, seja na Medicina, na Magistratura, etc. conservando as vagas nas universidades públicas para seus filhos. O avanço dos setores populares quanto ao ingresso nestas universidades, ainda mais por meio de cotas, é motivo de grande revolta nesta categoria de pessoas bem nascidas.
Jessé Souza demonstra que a herança escravocrata falou mais alto em 1954 contra Getúlio Vargas (cujo suicídio adiou o golpe civil-militar em 10 anos), no golpe de 1964 contra Jango, e contra Dilma em 2016. O autor fala que a política de inclusão social dos governos progressistas de Lula e Dilma provocou leves mudanças na estrutura social, mas, foi o suficiente para a “elite do atraso” acionar seus buldózers destruindo as fundações da nova pirâmide social que se pretendia inversa. Jessé demonstra em seu livro que as mesmas elites que combatem o Estado e o desejam mínimo para a população que dele necessita, o quer máximo a serviço de seu enriquecimento privado. As mesmas elites que se dizem contra a corrupção, construíram impérios por meio dela e na maioria das vezes fazendo uso do Estado em seu benefício, seja por empréstimos a juros subsidiados e muitas vezes não pagos; por leis que privilegiam os latifundiários com a baixíssima tributação; ou ainda, por maracutaias financeiras livres de punição por meio de leis construídas por políticos aliados e/ou financiados para este fim; ou ainda pela omissão/participação do Poder Judiciário. Souza afirma ainda que a teoria sociológica hegemônica no país é utilizada por grupos corruptos que hipocritamente erguem a bandeira do combate à corrupção, e tal como o ilusionista (mágico) desvia o olhar da população que vê no Estado a causa de todos os seus males, quando na realidade este se encontra no sistema capitalista que favorece a corrupção não apenas no Brasil, mas, em todo o planeta, e no qual os verdadeiros e maiores agentes da corrupção (grupos financeiros, industriais e comerciais) encontram-se no mercado tido como virtuoso.
Jessé Souza pretende contribuir para que a multidão de excluídos e as parcelas da classe média progressista e a aquela feita de tola entenda que este país pode ser melhor para todos, quando todos conseguirem enxergar o que há por trás desse discurso cientificamente construído (para manter intactas as estruturas de uma das sociedades mais perversas do mundo), e, de posse deste saber renovado reconstruam o país de forma que a todos seja garantida a dignidade humana, e ao país, a soberania nacional.

Sugestão de boa leitura:

A tolice da inteligência brasileira: ou como o país se deixa manipular pela elite – Jessé Souza.  Ed. Leya, 2015.


           

domingo, 15 de julho de 2018

O grande salto para trás!



.
            Há alguns dias ao ler sobre a China e as reformas que tornaram o dragão asiático, no país cuja economia mais cresce no planeta há mais de duas décadas. Reformas estas lideradas por Deng Xiaoping. Recuei um pouco mais no tempo e lembrei-me do programa “O grande salto para frente” do timoneiro Mao Tsé-Tung. Não vou aqui discutir a eficácia do programa de Mao, até, porque, para o bem ou para o mal, as glórias ou as críticas cabíveis quanto ao sucesso da China atual cabem a Deng Xiaoping. Num insight tive a ideia de escrever um artigo intitulado “O grande salto para trás” retratando as reformas que promoveram o retrocesso do Brasil delineando em quais áreas. Mas, resolvi pesquisar no oráculo que tudo sabe (Google) se alguém já havia escrito sobre tal tema ou título e descubro um documentário francês sobre o golpe de Estado de 2016 e o retrocesso que ele causou ao nosso país, tão logo li a descrição do que se tratava comecei a assistir.
O documentário começa mostrando o espetáculo horrendo daquele “domingo da vergonha”, a data em que as TVs brasileiras bateram recordes de audiência mostrando “cidadãos de bem” ou seria “de bens” que em sua miséria intelectual e ética declaravam que seu voto contra Dilma, era dedicado à esposa, à família, etc. num espetáculo grotesco, 54 milhões de votos foram cassados fazendo com que a vontade da maioria do povo brasileiro fosse desrespeitada, a Constituição Federal rasgada e a democracia estuprada por um Congresso Nacional que não representa o povo, pois, as campanhas eleitorais são caras e 80% dos parlamentares representam os interesses de 10% da população (a elite do capital financeiro) e não o povo constituído em sua ampla maioria por trabalhadores. Parte do povo que sonhava com um Brasil inclusivo, atônito, silencia, chora, enraivece. Do outro lado, comemorações e estas não se resumem à parte do topo da pirâmide social. O golpe tem a força de um nocaute, a mídia dominada por seis famílias, manipula e desinforma a população. O Brasil está muito próximo de uma ditadura da mídia. Uma mídia que neste país sempre agiu em benefício das elites e contra a democracia. O golpe é moderno, não há tanques, nem pessoas torturadas. As Instituições funcionam, a questão é de que forma? Para quê? Para quem? O rito processual foi cumprido, só faltava o crime. Não há crime. Cortar juros e lucros da elite financeira? Para a banca isso está fora de questão!  A banca se cansou de Dilma! E precisa dar um jeito nisso!
A mídia confunde a população, grande parte da sociedade sequer sabia que Dilma nada tinha a ver com a operação Lava-Jato. O procurador Dallagnol, O Juiz Moro (que apesar de ser da primeira instância, tem poderes tais que desconhece hierarquias) e vários policiais federais miram no PT (um partido que nem é tão esquerda assim), em Dilma e Lula, e ao avistar políticos da direita desviam o olhar: não vem ao caso! E afirmam: “como o PT estava no poder, as delações se referem unicamente a este”! Há controvérsias. Caciques tucanos são considerados intocáveis. A perseguição à Lula se faz com várias arbitrariedades e com muita pirotecnia televisiva. Busca-se destruir a reputação daquele que é considerado o maior presidente da história nacional. As redes sociais reagem conta o pseudo-jornalismo da Grande Mídia. As grandes revistas utilizam seus obuses contra Lula e o PT o objetivo da força-tarefa midiático-judiciário-parlamentar é prender Lula e impedir sua candidatura que certamente seria vitoriosa, pois, “o povo não sabe votar. A elite é que sabe”. O processo contra Dilma e principalmente contra Lula é Kafkiano. Temer faz jantares para os parlamentares e neles devoram os direitos dos trabalhadores. A receita do golpe conduz a mais de setenta anos de retrocesso, mais, um pouco e a Lei Áurea seria revogada. Os índices de popularidade de Temer se equivalem à margem de erro da pesquisa. E Temer liga para pesquisa? É apenas o fantoche a fazer o serviço sujo que em programa de governo jamais seria eleito nas urnas. O objetivo é levar o país o mais próximo possível de sua origem: o regime escravocrata, pois, a elite é branca, rica, masculina, heterossexual e velha mentalmente como eram os senhores de escravos, cujos filhos não se conformam com a libertação dos escravos. Certamente ninguém quer desembolsar um vintém por escravos, mas, dói para a elite observar essa gentalha (negros, mulatos, pardos, indígenas, sindicalistas, esquerdistas, feministas, etc.) se achando gente.
Os tempos são outros, líderes evangélicos impõem uma cunha fundamentalista religiosa retrógrada e conservadora no Estado laico. O financiamento para a agricultura familiar sai de cena, entra mais recursos para os latifundiários. O financiamento de casas para a baixa renda dá lugar a mais recursos para casas de alto valor para a classe média e alta. A produção de alimentos orgânicos dá lugar ao pacote plus, ou seja, mais veneno nos alimentos mais envenenados do mundo na mesa da população. A pergunta: os veneneiros se alimentarão destes mesmos alimentos? Ou plantarão/comprarão orgânicos? Mas, liberar o veneno não era suficiente, nossos nobres parlamentares resolveram que para o “bem” da população era necessário dificultar o acesso aos perigosos alimentos orgânicos, principalmente aqueles produzidos pelo maior produtor da América Latina (MST).
 A grande mídia que seguiu à risca os ensinamentos do Ministro da propaganda nazista Joseph Goebbels do governo de Hitler fez com perfeição seu papel. O povo pobre odeia ou vê com desconfiança quem unicamente poderia lhe libertar e sabemos é impossível libertar quem não se reconhece na condição de escravo. Honduras, Paraguai, e finalmente, o Brasil, todas, Repúblicas das Bananas que recentemente tiveram seus governantes retirados do Poder por meio de golpes de Estado suaves ou se preferir, modernos. Nenhuma grande nação considera mais o Brasil como uma nação com algo importante a contribuir para o mundo. Somos motivo de estarrecimento, de preocupação ou de riso. O judiciário não se envergonha mais. Faz política. Rasgou a Constituição Federal e queimou os princípios elementares do Direito. Magistrados já não falam pelos autos, mas, buscam os holofotes da Mídia que tal como cocaína, os sacia de seu desejo e os aprisiona, afinal, assim como o viciado busca ter a simpatia do traficante, há magistrados que lambem as botas dos coronéis da mídia, seja pela busca do prazer que a exposição midiática lhe traz, ou quem sabe, por medo. Manter Lula preso é garantia de popularidade mesmo que parcial e de recursos por meio de palestras pagas por quem quer manter Lula atrás das grades (o grande capital nacional e estrangeiro). Carmem Lúcia disse que se o brasileiro soubesse o que ela sabe não dormiria de noite, e penso: e ela consegue? Se ela consegue, confirma não estar à altura do cargo que ocupa!
Penso que Temer no poder, age como um viciado em drogas pesadas vendendo tudo que há na casa para pagar o traficante, se satisfazer e ganhar mais tempo, o problema que a casa é o Brasil e o Brasil é o lar do povo brasileiro e o que ele vende pertence não somente a esta, mas, a futura geração de brasileirinhos e de brasileirinhas. O traficante é o grande capital nacional e estrangeiro. Eu disse povo? Essa é a estupefação dos europeus ao ver o desmonte que os abutres do MDB, PSDB, DEM e apaniguados estão fazendo com o país sem obter nenhuma resistência. Mas, isto é algo já explicado por Lima Barreto: “O Brasil não tem povo, o Brasil tem público. Povo luta por seus direitos, público apenas assiste”. Somos um país cuja população lamenta mais a perda da Copa do que a perda do Pré-Sal, da Embraer, dos direitos trabalhistas e previdenciários como se estes também não lhes estivessem sendo roubados. Somos um país que olha para os políticos e vê neles seu patrão ou pai e não seus funcionários.
A maior pobreza do povo brasileiro é a intelectual. Olhamos e não vemos. Escutamos e não ouvimos. Lemos e não compreendemos. Falamos e não dialogamos. Respiramos e não vivemos, porque viver é lutar, e em luta, antes há que se tomar partido, mas, delegamos ao outro que empreenda a nossa luta. O Problema é que ele faz o mesmo!

P.S.: O artigo é um misto de inspiração livre (liberdade poética) e relato do documentário Brasil: O Grande Salto para Trás (Brésil: Le grand bond en arrière) -  disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=XDZ5UtlsqdA – acesso em 09 de Julho de 2018.