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quinta-feira, 21 de junho de 2018

A Elite do Atraso - uma leitura crítica e necessária


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            Sempre tive a convicção de que a elite brasileira é a responsável pelo fracasso do Brasil como nação. Em 2015, me referi a ela como o Cavalo de Tróia Tupiniquim. Essa elite nacional é o presente de grego entregue pelas metrópoles ao país para que este jamais ocupe o papel de potência para o qual sempre entendi sê-lo naturalmente destinado. Ainda em 2015, escrevi um artigo intitulado “A Casa Grande e os Capitães do Mato” em que discorria sobre o papel de capitães do mato exercido por significativa parcela da classe média, para a qual nunca poupei críticas, e em consonância com Marilena Chauí que afirmou ser esta violenta, fascista e ignorante, também a assim considero. Há algum tempo soube do pré-lançamento do livro “A elite do atraso: da escravidão à Lava jato” de Jessé Souza e o adquiri. Agora, passado um ano, o livro virou best-seller e seu autor Jessé Souza passeia em meio ao barulho que sua obra causa nos circuitos acadêmicos e populares. Jessé ousou construir uma obra que rompesse com o academicismo, pois, visava sua popularização, ou seja, ir além do circuito acadêmico e ser entendida por todos. O público leigo e não os doutores eram o seu objetivo. Souza foi ousado também ao tecer críticas fundamentadas ao que até aqui se considerou como cânones da sociologia nacional (Gilberto Freyre, Sergio Buarque de Holanda, Raimundo Faoro e Roberto Damatta) e causou um abalo tão grande ao edifício que sustenta a teoria sociológica nacional que somente é menor que aquele causado pelo golpe de 2016 (que impôs ao país um gigantesco estrago socioeconômico), para cujos responsáveis, não poupa críticas.
            O Brasil vive uma crise homérica, e, momentos de crise são ocasiões em que um país, seu povo e suas instituições podem se reinventar. Mas, seja no plano individual ou coletivo, não há como se reinventar sem saber a sua origem, a sua identidade, aquilo que faz com que um povo ou alguém seja o que é. A contribuição de Jessé Souza vem nesse sentido: lançar luzes sobre o Brasil e os brasileiros para entender quem somos e porque o somos. Souza tece duras críticas a Gilberto Freyre ao questionar o continuísmo com Portugal, tese que fundamentou no meio popular a ideia de que somos um povo e um país inferior porque fomos colonizados pela nação ibérica e que se tivéssemos sido colonizados pela Inglaterra talvez tivéssemos outra sorte. A verdade é que há nações colonizadas pela Inglaterra e também não tiveram melhor destino, pois, embora os fatores históricos sejam preponderantes, muitas vezes a estes se somam os fatores geográficos a selar o destino das nações. Jessé critica também Sergio Buarque de Holanda e Roberto Damatta, pois, suas respectivas teorias do brasileiro cordial (dos instintos, do corpo em oposição às virtudes do espírito de europeus e anglo-saxões) e do jeitinho brasileiro fundamentam o vira-latismo nacional.
            Souza também critica a tese de Raimundo Faoro de que o patrimonialismo é uma herança portuguesa, pois, tal conceito inexistia naquela época (anterior à Revolução Francesa) e o patrimonialismo no Brasil é considerado uma manipulação grosseira, pois, embora haja a corrupção dos agentes políticos no seio do Estado, é o Mercado incensado como beato e imaculado o verdadeiro e gigantesco agente da corrupção. O Mercado, por meio de grandes corporações nacionais e estrangeiras utilizando-se de estratagemas ilegais que devidamente legalizados por parlamentares e magistrados lançam-se ao saque do tesouro nacional desde a mais tenra infância do Brasil no cenário internacional. Jessé critica a USP e os intelectuais dela oriundos que por meio de suas teorias fundamentadas em ideias equivocadas serviram à manutenção do status quo nacional como uma das nações mais injustas do mundo no tocante à distribuição de renda. Critica ainda a esquerda que, alienada não percebeu a armadilha em que caiu e acabou por fortalecer uma ideologia que lhe é contrária. Afirma ser a nossa herança escravocrata a raiz de nossos problemas. A elite menospreza as classes populares e por elas têm verdadeiro ódio, mas, terceiriza esse ódio utilizando a classe média como massa de manobra. A classe média (elite do capital cultural) inveja a elite do capital financeiro e odeia as classes populares. Isso se dá respectivamente tal como os senhores da Casa Grande (elite do capital financeiro) e os Capitães do Mato (classe média) odiavam os escravos. Segundo Souza, somos um país que não progride porque nossas elites estão mais preocupadas em impedir os avanços dos menos afortunados e preferem a dominação estrangeira de nossa economia e riquezas a ver a ascensão da ralé. E como afirmar em alto e bom som que odeia pobre é algo que vai contra a suposta nobreza da alma que julgam possuir, essas “nobres” elites preferem manifestar seu ódio contra os políticos e partidos que em benefício dos pobres fazem algo lhes atribuindo os piores adjetivos possíveis, e, para isso contam sempre com o apoio do onipresente partido da imprensa golpista (PIG), para desinformar e manipular, levando os dominados a odiar as vítimas e a admirar os opressores. Ao ler essa obra magistral, senti uma pontinha de satisfação, pois, dentro das minhas limitações intelectuais e de leitura, já havia conseguido enxergar, mesmo que de forma míope, o que Jessé Souza revela com lentes de aumento: a realidade nacional, nua e crua!

Sugestão de boa leitura:

A Elite do Atraso: da escravidão à Lava Jato - Jessé Souza. Rio de Janeiro, Ed. Leya, 2017.  

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