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sábado, 13 de setembro de 2025

A falência

 

Mais do que o simples relato de uma ruína financeira, "A Falência" é um mergulho profundo na alma humana, um retrato sensível e crítico de uma época e de seus paradoxos. Escrita por Júlia Lopes de Almeida (1862-1934), uma das vozes mais importantes e, injustamente, mais esquecidas do Brasil do século XIX.

A história nos apresenta a família Teodoro, um microcosmo da elite carioca pós-abolição. Francisco, o patriarca imigrante português, construiu um império do café com suas próprias mãos. Sua esposa, Camila, é a bela matriarca que gravita um mundo de aparências, futilidades e segredos. Seus filhos, o bonvivant irresponsável Mário, a sonhadora Ruth e as gêmeas Lia e Raquel desfrutam de uma opulência nababesca, alheios às bases frágeis sobre as quais a vida é construída.

A narrativa tece com maestria os fios da traição, da hipocrisia e dos desejos reprimidos. Camila mantém um caso com o médico da família, Gervásio, um segredo conhecido por todos menos pelo marido, mas que corrói a dinâmica familiar, especialmente o ressentimento do filho Mário.

Contudo, o grande triunfo de Júlia não é apenas narrar a decadência moral, mas conectá-la à queda material. A "falência" do título é muito mais que um evento econômico, é o colapso de um mundo. Quando Francisco perde toda a sua fortuna em especulações na bolsa, a família é brutalmente arrancada de seu universo de sedas e festas e obrigada a confrontar uma realidade brutal para a qual não estava preparada.

Júlia, com sua escrita realista e afiada, não poupa críticas. Ela expõe a frivolidade dos ricos, o preconceito racial latente e a exploração dos trabalhadores recém libertos, mostrando os dois lados de um Brasil em transformação. A genialidade da autora está em nos fazer sentir, primeiro, um certo asco pela futilidade daquela família e, depois, uma comovente compaixão por sua fragilidade exposta.

"A Falência" é a obra-prima de uma mulher à frente de seu tempo, uma autora que viveu da pena e que, apesar de ter sido excluída da Academia Brasileira de Letras por ser mulher, legou à literatura brasileira um romance poderoso, humano e eternamente relevante.




Sugestão de boa leitura:

Título: A falência.

Autor: Júlia Lopes de Almeida.

Editora: Penguin-Companhia, 2019, 304 p.

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