A comunicação é algo de suprema importância para a sociedade humana. Dela depende a democracia para o seu pleno funcionamento. Não há democracia sem imprensa livre e, não há imprensa livre sem o direito à liberdade de expressão de seus profissionais. O povo precisa estar bem informado sobre os fatos que afetam a sociedade, porém, nem sempre isso interessa aos governantes.
Quando ditadores se instalam no poder, costumam atribuir à imprensa e aos seus profissionais, todas as ofensas possíveis. Nada que a imprensa publica é verdadeiro, tudo é manipulação com fins políticos, dizem. É verdade que em muitas empresas de comunicação há uma minoria de profissionais que não prezam pela ética no jornalismo, os quais, ao ter pela frente personagens públicas que não professam da sua "fé", agem como inquisidores numa cruzada aos "hereges", destruindo-lhes suas reputações na fogueira das convicções (desprovidas de provas), para satisfazer a seu público e patrocinadores, quando não para meramente regozijar (no ataque) a quem lhe desperta ódio por pensar diferente ou representar algo que defenestra. Sobre isso a ex-presidenta Dilma disse: "prefiro o barulho da imprensa livre ao silêncio das ditaduras".
A imprensa faz barulho e, precisa ter cada vez mais, todas as tonalidades. Neste espaço de divulgação de ideias, digito minhas letras "vermelhas" e que representam o sangue derramado pela classe trabalhadora ao longo de sua luta histórica por direitos. Os espaços de escrita e publicação de ideias costumeiramente são negados aos trabalhadores. Todo espaço precisa ser ocupado, pois, parafraseando Neil Armstrong (1930-2012) quando esteve na lua, representa "um pequeno passo na direção da democracia plena e um grande salto conquistado para a classe trabalhadora" dado o seu simbolismo.
Isto posto, digo que muitos escritos
brilhantes se produziu para a divulgação em jornais e revistas visando sua
popularização, ou seja, alcançar os diversos estratos sociais e de formação
instrucional da população. Digo isso, porque já li artigos publicados com tal
intenção, mas, que constituíam verdadeiros tratados científicos, dada sua
linguagem academicista. Há que se saber, que ao escrever, deve-se ter em mente o
perfil do público alvo. Dessa forma, o
academicismo deve dar lugar à inteligibilidade, ou seja, a capacidade de
expressar (de forma clara) o tema para o público geral e não apenas aos
intelectuais.
É nessa intenção, que tento trazer uma explicação sobre algo não compreendido por grande parcela das pessoas e, que costuma ser objeto de manipulação por parte de alguns. Na obra de Karl Marx (1818-1883) há a alusão a uma "ditadura do proletariado". E muito se fala que os simpatizantes do socialismo desejam, tal como seu ideólogo maior, a implantação de uma ditadura. Ocorre que para Marx, o termo ditadura, não tinha o significado que hoje conhecemos como designador de regimes autoritários (de exceção). Marx entendia que o Estado moderno, ou seja, o conjunto de instituições que o formam (governo, forças armadas, Justiça, etc.) foram criados pelo capitalismo e para o capitalismo, ou seja, o Estado Moderno é uma ditadura da burguesia, pois, está a serviço dos ricos. Sobre isso, muitos autores marxianos afirmam que, alcançar o poder e não derrubar os pilares do Estado burguês, implica em apenas administrar melhor o capitalismo (algo que a esquerda fez, quando no poder esteve).
É de uma grande ingenuidade pensar que obter o poder político é deter o poder de fato. O Estado está nas mãos da burguesia (especialmente, a do setor financeiro - bancos) ela detém o poder de fato. A eleição é para dar ao povo a ilusória impressão de poder escolher o destino de suas vidas. O grande capital, com seu dinheiro, governa, e elege a maioria da bancada parlamentar, e esta no parlamento atua de acordo a satisfazer seus patrocinadores.
Para tornar ainda mais claro, podemos dizer que o Estado
moderno, tal como o conhecemos, existe sob a hegemonia da burguesia (sob as
ordens do grande capital). Marx quando falou em ditadura do proletariado,
afirmava, que o socialismo se constituiria no fato de impor a hegemonia da
classe trabalhadora sobre o Estado, ou seja, colocá-lo a serviço da classe
trabalhadora. Em nenhum momento Marx falou em implantar um regime de exceção
(de opressão). Inclusive, em sua obra, Marx afirmou que no comunismo, ou seja,
no estágio posterior ao socialismo (que representaria mera fase transitória), o
próprio Estado (e suas instituições) seria extinto para que se chegasse enfim,
à sociedade sem opressores e oprimidos.
Inicio este artigo lembrando o genial escritor, jornalista e ensaísta político inglês George Orwell (1903-1950) quando disse "Quem controla o passado, controla o futuro". Na obra 1984, que inspirou o Big Brother, numa sociedade totalitária do futuro, o "Grande Irmão" vigia a tudo e a todos e mesmo nas residências há câmeras e microfones espiões. Ninguém está seguro para falar, planejar e realizar atos contestatórios ao governo do "Grande Irmão". A história é a todo momento reescrita por funcionários públicos contratados para tal fim. Eles recebem ordens "vindas de cima" e procedem as alterações de todos os registros sobre fatos e personagens dando a eles a interpretação desejada pelo establishment e, para tal, jornais são reescritos, de forma que ao ler microfilmes de jornais, as notícias estão diferentes do que as pessoas haviam visto, lido ou assistido pela teletela (espécie de TV bidirecional). As pessoas eram induzidas a pensar que tinham uma falsa memória (um engano) e dessa forma, a história era recontada e personagens desapareciam da história e da sociedade. Com o passar do tempo e, com a morte das pessoas (que vivenciaram os fatos) as dúvidas desapareciam e a história "oficializada" era a única existente. Parece algo exclusivo de obras literárias como a de Orwell ou de Blake Crouch, mas, é fato comum em países que tiveram ou têm regimes autoritários.
O Brasil não fez as pazes com o seu passado. É por isso
que muito dele permanece na atualidade. O país nunca puniu aqueles que romperam
a hierarquia, violentaram a Constituição Federal e tomaram de assalto o poder,
cancelando a democracia e suspendendo os direitos individuais. Contra tal
estado de coisas, estudantes, jornalistas, professores, operários, camponeses, políticos
e militares idealistas que ousaram defender a democracia e o respeito à ordem
legal estabelecida pela Constituição Federal tombaram vítimas da ditadura
(1964-1985) sendo arbitrariamente presos, torturados e mortos. Nos países
vizinhos, nos quais houve ditaduras sanguinárias como a vivida em nosso país,
as autoridades criminosas foram levadas a julgamento, aqui não. Nossas
instituições e nossa democracia nunca chegaram a tal nível de amadurecimento. Sob
a alegação da anistia geral e irrestrita, todos os crimes e criminosos foram
perdoados. A suposta generosidade dos generais para com os rebeldes subversivos,
tidos como "terroristas" e que lutavam contra a ditadura militar, era
na verdade, um salvo-conduto para que militares criminosos pudessem colocar o
pijama em suas casas e, não em celas. A criação da Lei da Anistia se impunha
pela necessidade que despontava no horizonte. Os militares precisavam abandonar
a condução do país, dado o caos econômico e social que produziram
(hiperinflação, endividamento externo e aprofundamento da desigualdade social).
Segundo o filósofo, escritor e músico brasileiro Vladimir
Safatle, em sua obra (Do uso da violência contra o Estado ilegal), "a
violência praticada pelo Estado ilegal (ditadura militar) contra o povo organizado
e, a deste em seus esforços de resistência não pode ser comparada equivalente.
Resistir, inclusive se utilizando da violência é algo garantido pelo Direito
Internacional e reconhecido pela ONU como direito dos povos na resistência à
ilegalidade do Estado. Não há que comparar, portanto, dada a desproporção, dada
a motivação, que, no caso da ditadura era oprimir para manter a situação de
ilegalidade". As forças armadas brasileiras historicamente se arvoram
representantes do quarto poder, o Poder Moderador, algo que não está previsto em
nossa Constituição, menos ainda de sua incumbência ou de sua capacidade para
tal. Se prestam a ser ferramentas da direita conservadora (e fascista) que, ao
fracassar nas urnas, sempre clama pelo seu retorno ao poder. Várias vezes se
prestaram a esse vergonhoso papel, rasgando a Constituição Federal,
desobedecendo a hierarquia e prestando desserviços à nação. Algumas autoridades
resolveram comemorar o dia 31 de Março às claras (veladamente sempre fizeram
isso) tentando normalizar e reescrever a história nacional. Comemorar o 31 de
Março é pisar nas poças de sangue das vítimas. É torturar as mentes dos
familiares que perderam seus entes queridos. É violentar novamente quem sofreu
a violência do Estado ilegal. É depreciar a democracia, a dignidade humana e renunciar
a qualquer espírito cristão. Enfim, 31
de Março não se comemora, se repudia!
O leitor certamente já ouviu falar de Simón Bolívar(1783-1830),
por conta do falecido presidente venezuelano Hugo Chávez (1954-2013) que fazia
seus discursos com uma tela do libertador ao fundo da imagem. Por iniciativa
presidencial e com aprovação parlamentar, o nome do país foi alterado para
República Bolivariana da Venezuela. Não demorou e começaram a dizer que Bolívar
era marxista, o detalhe é que quando Bolívar morreu, Karl Marx (1818-1883)
tinha apenas 12 anos e, mais curioso ainda, o próprio Karl Marx mais tarde
estudou a trajetória de Bolívar e a ele teceu duras críticas. Nos países
libertados por Simón Bolívar (Venezuela, Colômbia, Panamá, Equador, Peru e
Bolívia) ele é um herói universal, não se considera ser ele de esquerda ou
direita. Inclusive o nome oficial da Bolívia é em sua homenagem. Bolívar, nascido
em Caracas, era descendente de espanhóis, porém, "criollo" (nascido
em colônia), o que era motivo de depreciação ante os espanhóis. Bolívar ainda
muito jovem, perdeu seus pais e herdou uma gigantesca fortuna em fazendas,
escravos, minas, imóveis residenciais, etc. porém, somente após atingir a
maioridade e se casar teve acesso a seus bens. O jovem e rebelde Bolívar foi
enviado a Madrid, onde estudava e buscava recuperar um título nobiliárquico. Lá
conheceu Maria Tereza Rodriguez del Toro y Alayza (1781-1803) com quem se casou
em 1802. De volta à sua terra natal, sua felicidade foi curta, pois, sua esposa
faleceu de febre amarela.
Bolívar prometeu e cumpriu nunca mais se casar, porém,
galanteador, estava sempre acompanhado de namoradas e "amigas" nos
locais aonde a guerra o levava. Tal fato não contribuía para a boa imagem do
Libertador que, também era tido como autoritário. Ainda na Europa, havia jurado
que usaria todas as suas energias para libertar a América da Espanha. E usou não
só toda a sua energia, mas, todo o seu capital como contribuição para as
dispendiosas batalhas. Genial estrategista e cavaleiro incansável, conseguiu
vitórias assombrosas (dada a desproporção de forças em seu desfavor) e suas
conquistas épicas somente podem ser comparadas a do líder mongol Genghis Khan
(1162-1227) em área territorial. Bolívar foi um homem a frente de seu tempo. Seu
sonho da integração da América espanhola em uma federação à semelhança dos
Estados Unidos da América não vingou. Senhor de escravos, não teve dúvidas em
proclamar a abolição da escravatura. Autodidata, conseguia cativar a população e
conquistar braços para as batalhas. Preferia guerrear a governar. Provou o
gosto amargo das traições e das derrotas e ao final de sua curta vida, proibido
de voltar à sua Venezuela e doente, morreu pobre e foi enterrado em Santa Marta
(Colômbia) com roupas que lhe foram doadas, na presença dos poucos amigos que
restaram. Após sua morte, mesmo quem lhe traiu, mandou que se erigissem bustos
e estátuas em sua homenagem. O presidente venezuelano que proibiu seu retorno,
anos mais tarde, fez um acordo com a Colômbia, ficando em Santa Marta o coração
embalsamado de Bolívar e, sendo seu corpo transladado à Caracas, onde repousa
em um panteão. Simón Bolívar é uma personagem mundialmente reconhecida à
esquerda e à direita do espectro político-ideológico, então, chamar alguém de
"bolivariano" não constitui xingamento, mas, elogio. Fica a dica!
P.S. Na Netflix há uma série
imperdível intitulada Bolívar que conta a sua vida, amores e batalhas.
Sugestão de boa leitura:
Título: Bolívar, o libertador da América.
Autora: Marie Arana.
Editora: Três Estrelas, 2015, 607 p.