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quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Feliz Ano Velho, pois 1964 é logo ali!



            Quando adolescente li a obra Feliz Ano Velho de Marcelo Rubens Paiva. O autor é filho do falecido deputado Rubens Paiva, dado como desaparecido durante a ditadura e que somente a alguns anos ex-militares envolvidos no caso confirmaram à Comissão Nacional da Verdade ter sido assassinado pelo regime. A obra escrita por um jovem de vinte anos de idade tem um marco representado pelo acidente que sofreu ao nadar em um rio de águas rasas e com pedras no fundo de seu leito que dividiu sua vida em antes e depois. O escritor deu um mergulho imitando o Tio Patinhas e tornou-se paraplégico. No livro o autor conta a sua vida anterior ao acidente numa linguagem atraente aos jovens carregada de palavrões e gírias. Fala de casos pitorescos de suas paqueras, namoradas e a forma como via a vida. Tudo muda com o acidente. Lembro-me que após ler a obra, eu que costumava ir a riachos e fazer mergulhos, abandonei tal prática.
Naquela época, o Brasil vivia os seus últimos anos da ditadura civil-militar (1964-1985) que assaltou o Poder e jogou a democracia no calabouço. Veio as Diretas Já, e, os militares mostraram que não estavam mortos e derrotaram a emenda Dante de Oliveira que estabeleceria a eleição direta para presidente. Derrotada a emenda, a eleição foi mesmo pelo Colégio Eleitoral. Paulo Salim Maluf foi escolhido o candidato do PDS, novo nome da extinta Arena (Aliança Renovadora Nacional) muito marcada por ser o partido da ditadura. A eleição é ganha por Tancredo Neves (MDB) que tinha na chapa José Sarney (ex-Arena). Tancredo tinha grande carisma junto ao povo, mas, surrealmente era homem de confiança dos militares (que o preferiam a Maluf). Chegou a ser apoiado pelos militares como primeiro-ministro na intentona golpista contra Jango quando da renúncia de Janio Quadros em 1961. Presidente eleito pelo povo, só em 1989 (Collor), numa campanha suja que se pensava ter acontecido devido a nossa democracia estar ainda engatinhando e que com o amadurecimento das instituições e do povo isso jamais tornaria a ocorrer. FHC ganhou duas eleições ao se vender como Pai do Plano Real. A verdadeira paternidade é do falecido Itamar Franco (PMDB). Na reeleição FHC jogou sua biografia no lixo ao dar um golpe na Constituição Federal e aprovar para si mesmo a reeleição com a compra de votos de deputados ao valor de duzentos mil reais cada, fato comprovado pelo ex-deputado Ronivon Santiago (PP/AC).
Depois vieram os anos Lula, a pobreza diminuiu, o nível de empregos e de renda aumentou e revistas conservadoras estampavam: “nunca fomos tão felizes”. O Brasil deixava de ser figurante e passava ao corpo de atores principais do palco geopolítico mundial. O Brasil ajudava os países irmãos mais fracos e tinha coragem de dizer não aos Estados Unidos. Lula deixou a presidência com aprovação recorde. Dilma se elegeu, se reelegeu. Fez um governo abaixo da expectativa e foi derrubada por um processo de impeachment farsesco, pois, jamais houve a comprovação de sua culpabilidade. Temer, o traidor, que em surdina junto com seus asseclas havia elaborado o projeto “Ponte para o Futuro”, deu um cavalo de pau no rumo do país e levou-o de volta para o passado. Os dados sócio-econômicos do país despencaram como breves pesquisas nos principais jornais do país demonstram. O ciclo de redução da desigualdade social foi interrompido. Os ricos tornaram-se mais ricos e a miséria voltou com força. O desemprego e a informalidade aumentaram. A desindustrialização do país se aprofundou. O Brasil abandonou o protagonismo e voltou a ser figurante. O risco país aumentou, mas isso não foi mais divulgado na mídia golpista, porém, o PIB de 1,0% de 2017 (que nos anos petistas era tratado como “pibinho”) foi motivo de forte comemoração.
A história nos traz vários exemplos de que nem sempre a mudança (em si tão desejada pela sociedade) pode trazer dias melhores. Os nazistas quiseram mudanças e elevaram Hitler ao Poder. Os brasileiros quiseram mudanças e elevaram Bolsonaro ao Planalto. Na passagem de ano, mais especificamente no dia seguinte, quando Temer passar a faixa presidencial para Bolsonaro, uma segunda porta (a primeira foi o golpe de Estado de 2016) se fechará atrás de nós. Estaremos adentrando em território de trevas (fascismo) dominado por almas que amam a escuridão e que combatem a luz. E todos os seres de luz (conhecimento) têm a obrigação de iluminar e resgatar pessoas da escuridão do fascismo. Feliz Ano Velho, pois, 1964 é logo ali!

quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Os fantasmas do Sr. Scrooge



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            Alguns leitores privilegiados tiveram a oportunidade de assistir a belíssima apresentação de balé da escola Ballerina de Laranjeiras do Sul no ano de 2017 retratando o tema, porém, muitos lembrar-se-ão do filme ou do desenho animado dos estúdios Disney. No desenho, o Sr. Scrooge é representado pelo Tio Patinhas. A obra “Um conto de Natal” de Charles Dickens publicado em 1843 retrata um empresário rico de nome Ebenezer Scrooge que continuava trabalhando na mesma empresa cujo sócio Jacob Marley tinha falecido. Tal como o sócio falecido, o Sr. Scrooge era insensível às questões sociais e não se deixava influenciar pelo espírito do Natal. Tinha uma alma egoísta, dura. Explorava seu empregado pagando-lhe salários miseráveis. Por sua forma de ser e de agir era ferrenho defensor da ideologia da meritocracia e do liberalismo econômico. Tudo começa a mudar quando em sonho lhe aparece o espírito do seu falecido sócio que conta os castigos que recebeu e o adverte para mudar sua forma de viver para não passar pelo mesmo e anuncia que os fantasmas do Natal Passado, do Natal Presente e do Natal Futuro irão lhe visitar. Os fantasmas aparecem, um de cada vez, na ordem cronológica, e levam-no a refletir sobre sua vida e a forma como tratou e trata as pessoas. Ao final, após rever vários momentos de sua vida, e principalmente ao ver a situação difícil de sobrevivência de seu próprio empregado e do filho doente deste, Scrooge modifica toda a sua vida.
Há muitos Scrooges em nossa sociedade. Muitos deles adoram o Natal pelo potencial de lucros que proporciona, mas, não fazem desse momento uma época de reflexão sobre os erros e acertos da sua trajetória de vida. Muitos se dizem cristãos, mas, defendem a tortura e as prisões ilegais bem como a morte, sendo que o próprio Cristo foi arbitrariamente preso, torturado e morto. Cristo que nunca discriminou ninguém e que defendeu a prostituta ante a hipocrisia dos moralistas sem moral (os quais foram e continuam a ser muitos na sociedade), prometeu o paraíso até mesmo ao criminoso, quando em nossa sociedade “cidadãos de bem” defendem a pena de morte, quando muitos já pagam a pena de vida, encarcerados pelo preconceito étnico, social, de gênero ou de opção sexual. Há muitos Scrooges que dirigem igrejas e que dizem falar inspirados pelo Cristo, mas, que fazem da religião um negócio lucrativo no qual enriquecem. Há os Scrooges que doutrinam seus fiéis a neles votar para que no Poder trabalhem por um país que se encontra diametralmente oposto ao que Cristo pregava, o Reino de Deus que precisa acontecer aqui na Terra e não servir de alienação visando à acomodação, a apatia na espera de uma recompensa post-mortem.
Os Scrooges de nossa sociedade possuem um apetite voraz pelo vil metal, deixam de viver para acumular, mas, esquecem que caixões não possuem gavetas, não dá para levar o que acumulou. Também, são contra a justiça social, o que Cristo entendia como o mundo feito por Deus para ser compartilhado por todos. Eles entendem a justiça social como sendo comunismo. Os Scrooges são contra partidos e programas de governo voltados para a superação da pobreza e da desigualdade social. Os Scrooges não se contentam em ter sua própria fortuna, precisam também, que ela seja reconhecida por todos como de seu legítimo merecimento. Mas, por trás da fortuna dos Scrooges, há sempre um ou vários crimes cometidos. Há Scrooges que apesar de votarem e até agirem contra políticos e partidos que realmente trabalham para minorar as injustiças sociais, também combatem políticas sociais com o pseudo discurso da meritocracia, pois, precisam da pobreza, assim, podem fazer algumas ações de caridade e aparecer como bons moços para a sociedade. Em muitos lares neste país, o Natal não será feliz como na sua casa. Não haverá presentes e nem carne será servida na hora do almoço. Muitos pais estão desempregados. A família voltou à extrema-pobreza. Perdeu o auxílio bolsa-família em virtude da política neoliberal do ilegítimo governo Temer. Milton Santos nos disse: “a fome é uma decisão política, se ela existe, é porque assim decidimos que seja”. Afinal, sobram alimentos no mundo. Desculpe se lhe causei certa amargura com esta reflexão. É que compartilho do pensamento de Milton Santos quando diz: “o intelectual existe para criar o desconforto. E ele tem que ser forte o bastante sozinho para continuar a exercer esse papel. Não há nenhum país mais necessitado de verdadeiros intelectuais no sentido que dei a esta palavra do que o Brasil” e concluo dizendo de forma consonante a Paulo Freire: “sonho com o dia em que a justiça social venha antes da caridade”!

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Defender o SUS é defender a democracia!



                A Constituição Federal do Brasil (1988) estabelece em seu artigo 196 que: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Além disso, a Declaração Universal dos Direitos Humanos também assegura que: “todas as pessoas têm direito à vida [...]”. É importante que se diga que ao ofertar o SUS o Estado não promove caridade, afinal, a população paga impostos justamente para custear serviços públicos de caráter imprescindível. Vejo muita gente que critica o SUS e que defende o seu fim. Ninguém se atreveria a dizer que o SUS não tem problemas. E a crítica ao SUS é salutar. A crítica a que me refiro deve ser no sentido da superação de tais problemas. Em todos os setores da economia há bons e maus profissionais, e também bons e maus serviços prestados, e isso independe de ser o órgão público ou privado. Há algum tempo conversei com uma pessoa do setor da saúde, a qual afirmava que apesar de seus esforços tratando com a mesma dedicação pacientes do SUS e particulares, no SUS apenas recebia críticas. A generalização quanto à qualidade do atendimento e da seriedade dos profissionais não constitui crítica honesta.
Há também os que afirmam que a manutenção do SUS é cara e que com o fim do SUS, o governo poderia cobrar menos impostos. Ledo engano, a maior parte do orçamento brasileiro (50,66%) é utilizada para pagar os serviços da dívida pública e apenas 3,66% é investido em saúde. É necessário ter consciência de que o SUS não é grande demais, como afirmam os defensores do Estado Mínimo. É o SUS quem executa o programa de transplantes de órgãos e procedimentos caros muitas vezes negados por planos de saúde. Além disso, o SUS oferta um dos mais completos programas de vacinação do mundo. Tudo isso sem cobrar da população. Os impostos pagos pela população sustentam tais programas. Mas, há quem defenda que banqueiros e especuladores recebam mais dinheiro. A emenda constitucional nº 95/2016 proposta por Temer (e em vigor) é extremamente prejudicial ao SUS, pois, congela os recursos ao patamar de 2016 acrescido no máximo do índice de inflação, quando o setor precisa de mais investimentos. O que se pode esperar é uma situação futura ainda mais caótica na saúde pública. E sabemos: sempre que o Estado deseja deixar de ofertar um serviço público, reduzi-lo ou entregá-lo à iniciativa privada, o caminho malandramente utilizado é o da precarização dos serviços e a publicização midiática sobre a ineficiência e os altos custos destes.
            Um documentário muito interessante sobre saúde foi produzido pelo premiado diretor estadunidense Michael Moore. O documentário Sicko¹ que remete à palavra inglesa sick (doente) mostra a situação da saúde nos Estados Unidos totalmente entregue às companhias privadas de planos de saúde, as quais visam alta lucratividade. A ganância dos planos de saúde é tanta que milhares de pessoas são condenadas à morte pela recusa no atendimento dos planos de saúde que possuem profissionais encarregados de investigar a vida das pessoas visando encontrar meios para não cobrir as despesas de doenças graves e custosas alegando serem pré-existentes. O documentário mostra políticos estadunidenses confirmando que o sistema é ruim, mas, que seria ainda pior no modelo socializado. Moore vai então ao Canadá, Inglaterra e França e observa o quanto o sistema público socializado desses países é mais eficiente e humano do que o estadunidense, sem falar que é gratuito (“ah... esses países socialistas!”). Por último, acompanhado de bombeiros que trabalharam no atentado de 11 de setembro e ficaram com sequelas dele resultantes (doenças respiratórias), e que não conseguem atendimento nos EUA (apesar de serem considerados heróis). Moore vai à prisão estadunidense de Guantánamo (Cuba) e exige para eles o mesmo tratamento médico gratuito e de boa qualidade ofertado aos terroristas do referido atentado, obviamente, não consegue. Disposto a conseguir atendimento médico para os doentes, leva-os a Cuba onde fazem exames avançados, são diagnosticados e tratados. O documentário mostra que a medicina cubana tem caráter preventivo (evitar doenças) e não o habitual caráter mercadológico que visa prioritariamente lucros para planos de saúde e indústrias farmacêuticas. Em Cuba, uma ilha carente de recursos e que constitui um país de terceiro mundo, e que, além disso, sofre um embargo econômico há 59 anos, toda a população é assistida e os remédios têm preços apenas simbólicos, pois, são subsidiados pelo governo. Nos EUA, pacientes de hospitais são desovados na rua por falta de pagamento ou recusa de planos de saúde. Nós temos o SUS, e lutar pela manutenção dele e de sua melhoria deve ser o nosso SUL! Defender o SUS é defender a democracia. É defender a vida!

Referência:

  1. SICKO: SOS Saúde e a mercantilização da vida (EUA-2009) – Michael Moore – disponível no You Tube.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

O eterno marido



            Fiódor Dostoiévsk (1821-1880) é um dos grandes nomes da prestigiada literatura russa. Seu nome está ao lado de Liev Tolstoi, Ivan Turguêniev e outros que facilmente formam um dream team da literatura a ponto de deixar com inveja grande parte dos países do mundo. Dostoiévski viveu na época do Império Russo e foi escritor, filósofo e jornalista. Seu pai (Mikhail Dostoiévski) era médico militar e sua mãe era dona de casa. A profissão do pai não era valorizada financeiramente e a família que tinha origens nobres encontrava-se em plena decadência, mesmo com dificuldades, seu pai mantinha seis serviçais para manter as aparências de um passado que se mostrava cada vez mais distante. A mãe morreu de tuberculose, uma doença que ceifava muitas vidas à época, na ocasião Dostoiévski contava quinze anos de idade. Seu pai que era alcoólatra e depressivo morreu três anos mais tarde, e, existem duas versões para a sua morte, sendo a primeira de que teria sido vítima de acidente vascular cerebral e a segunda de que teria sido assassinado por seus servos revoltados por conta dos maus tratos que lhes impunha. O jovem Fiódor também desejou a morte de seu pai por conta dos maus tratos que sofria, porém, conta-se que a morte do pai lhe trouxe remorsos por ter alimentado tais pensamentos.
            Dostoiévski serviu o exército russo no qual obteve a patente de tenente e se formou em engenharia em 1843. Fiódor estava sempre às voltas com dívidas resultantes de seu envolvimento com jogos e mulheres. Trabalhou como tradutor de obras do escritor francês Honoré de Balzac e isso o estimulou a experimentar-se no campo da literatura. Fez isso após deixar o exército em 1844, ano em que lança seus primeiros livros. Dostoiévski fazia parte de um grupo clandestino intitulado Círculo de Petrachévksi, no qual liam e discutiam textos proibidos. O mentor do grupo (Petrachévksi) era adepto do socialista utópico Charles Fourier. Descoberto, foi condenado à morte por fuzilamento. No último instante (mesmo), por ordem do Czar Nicolau I a pena foi convertida em quatro anos de prisão na Sibéria com a imposição de trabalhos forçados e outros cinco anos de pena nos quais deveria servir como soldado raso no exército. No exílio conheceu e se apaixonou por sua primeira esposa (Maria Dmítrievna), o detalhe é que ela era casada, porém, como enviuvou, casou-se com ela três meses depois. Em 1864, morreram sua primeira esposa (tuberculose) e também seu irmão. Além de seus filhos, precisava sustentar a viúva e os filhos de seu falecido irmão além de outro irmão alcoólatra. Várias vezes escreveu obras “a toque de caixa” para pagar dívidas contraídas junto a agiotas que o importunavam cobrando-lhe, dos quais algumas vezes fugiu temporariamente mudando de endereço. Aos quarenta e seis anos conheceu e contratou a estenógrafa (taquigrafa) Anna Grigórievna Snítkina de vinte e quatro anos de idade com quem se casou. Dostoiévski publicou várias obras de sucesso, dentre elas: Crime e castigo e Os Irmãos Karamazov, sendo esta sua última obra. Faleceu em decorrência de enfisema pulmonar.
            O escritor não gostou de sua obra “O eterno marido”, no que foi contrariado pelo público e pela crítica que a aclamaram. A obra trata dos “eternos maridos”, homens que suportam as traições de suas esposas e cujos chifres parecem lhes cair bem, e também de um tipo muito específico de esposas, as quais se casam virgens, mas, que utilizam desculpas referentes aos defeitos do marido para dar vazão a toda sua volúpia, sem ter com isso nenhum sentimento de culpa ao traí-los. No afã de situar o leitor na trama, o primeiro capítulo traz uma leitura um pouco burocrática, mas, depois se torna envolvente. A trama conta com dois personagens principais Aleksei Ivánovitch Veltchanínovch, um playboy, arrogante e hipocondríaco que em sua juventude considerava ainda mais interessante ser amante de mulheres casadas. A outra personagem (Pável Pavlóvitch Trussotski) é o marido traído, que em plena madrugada, espantosamente bate à porta de Veltchanínov. Na trama, Veltchanínov conhece a filha de dez anos de Pavlóvitch (doente e maltratada pelo pai), o qual após a morte da esposa adúltera se tornou alcoólatra, violento e passou a assustá-la ameaçando suicidar-se. Veltchanínov desconfia que a filha (adoentada) pode ser sua tendo em vista a época dos relacionamentos que teve com a sua mãe, mas, somente tem a confirmação por Pavlóvitch após a morte da menina. Em certa noite, Pavlóvitch cuida de Veltchanínov (hipocondríaco) fazendo-o melhorar, porém, quando este adormece tenta matá-lo. Mais forte, Veltchanínov frustra o plano. Anos mais tarde, em uma viagem de trem, Veltchanínov reencontra Pavlóvitch casado com uma bela e rica jovem, e constata que nada mudou: Pavlóvitch continua a ser o eterno marido e forma com sua esposa e um cadete um triângulo amoroso.

Sugestão de boa leitura:

Obra: O eterno marido (1870) – 211 páginas.
Autor: Fiódor Dostoiévski.
Editora: Penguin Companhia, 2018.
Preço: R$ 26,90.


quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Carroça vazia



            O leitor certamente deve ter conhecimento do conto que narra a conversa entre pai e filho no qual o primeiro ao ouvir o barulho de uma carroça antecipa ao filho de que ela está vazia, pois, afirma: “carroça vazia faz mais barulho do que quando carregada”. Nada mais adequado para caracterizar Bolsonaro e o desenho que faz de seu futuro governo cujas primeiras indicações para o Ministério constituem traições à parcela ingênua do seu eleitorado, pois, nada mais sinaliza que o velho jeito de fazer política. Nisso, não há nenhuma surpresa, afinal, Bolsonaro está na política há trinta anos e nesse período foi um dos parlamentares mais ineficientes de todo o Congresso Nacional, pois, consta que apenas três projetos de sua autoria foram aprovados. Bolsonaro parece ainda estar em campanha, pois, continua a jogar para a sua torcida fazendo falas ao gosto dela: declarações pouco inteligentes, insensatas e que dão a impressão que ele vive na época da Guerra Fria (1945-1989) e em plena ditadura militar.
            A impressão que dá é que os conhecimentos de Bolsonaro na área da política externa são os rudimentos recebidos enquanto militar, porém, hoje o mundo é outro! É necessário conhecimento e sensibilidade, e na falta destes, um de seus estragos ocorreu quando numa atitude lambe-botas dos Estados Unidos declarou que vai mudar a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém contrariando a própria ONU, pois, Jerusalém no plano de partilha da Palestina de 1947 constava como uma cidade internacional de livre visitação para judeus, árabes e cristãos, por constituir um nó górdio. Ao tomar partido em favor de Israel, os países árabes ameaçam retalhar boicotando produtos exportados pelo Brasil, o que afetaria não somente, mas, duramente, o setor do agronegócio (frigoríficos) com prováveis repercussões em nossa região. O Egito chegou a cancelar uma agenda com o Ministro das Relações Exteriores Aloysio Nunes (PSDB) por causa da fala desastrada de Bolsonaro.
            Bolsonaro na condição de parlamentar foi um ferrenho opositor à criação do Programa Mais Médicos durante o governo da presidenta Dilma. Programa este, que tinha a intenção e levou a termo a antiga e frequente reclamação da população da falta de atendimento médico em municípios interioranos, apesar dos enormes esforços de inúmeros prefeitos em atraí-los. Embasado numa mentalidade doentia, obcecada pelo confronto Leste x Oeste, Bolsonaro conseguiu a proeza de implodir o acordo que o país tinha com Cuba. Bolsonaro que sempre afirmou que não se tratavam de médicos, mas, de agentes da ditadura cubana, tendo inclusive comparado os médicos cubanos a açougueiros (pedindo perdão aos açougueiros), pois, em seu ver não teriam conhecimento da medicina para atender a população brasileira (algo que vai à contramão de inúmeros relatos de pacientes atendidos pelos médicos cubanos no Brasil e em sessenta e cinco países do mundo). Bolsonaro que em campanha promoveu inúmeras falas depreciativas aos médicos cubanos e a Cuba, conseguiu o que pretendia, a OPAS (Organização Pan Americana da Saúde) numa atitude de preservação da dignidade ante as falas estereotipadas de Bolsonaro rompeu o acordo com o Brasil e os médicos cubanos estão se retirando do país. Para substituir os médicos cubanos, o Governo Temer (pressionado pelos prefeitos, e estes pela população) abriu inscrições para candidatos brasileiros, mas, as primeiras inscrições indicam que eles querem trabalhar nas capitais, e não em locais com pouca infraestrutura. Tal como Bolsonaro assegurou, o Brasil vai voltar a ser como era a quarenta ou cinquenta anos atrás: Isso para quem é rico não constitui problema algum. A questão é: você que é trabalhador assalariado, portanto, pobre, está preparado?

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

A morte de Ivan Ilitch




            O autor russo Lev Tolstói (1828-1910) é um dos grandes nomes da literatura mundial. Não por acaso, suas obras são presenças constantes nas estantes de bibliófilos (amantes e/ou colecionadores de livros). É de Tolstói a célebre obra Guerra e Paz, a qual foi retratada em filmes e séries sempre com grande sucesso de público. Outra obra de Tolstói adaptada com sucesso para o cinema foi Anna Karenina. O autor de grandes obras que testam a disposição de seus leitores ante ao grande número de páginas, também fez sucesso com um pequeno livro de apenas oitenta páginas. Trata-se de A morte de Ivan Ilitch.
            Tolstói nasceu numa família aristocrática, portanto, herdou uma propriedade rural de seus pais. A mãe e o pai morreram poucos anos após seu nascimento. Não chegou a se formar no ensino superior, cursou por algum tempo Línguas Orientais, e mais tarde, Direito. Era um bon-vivant, atirou-se aos jogos e às mulheres, vícios que o endividaram fortemente. Serviu o Exército e após dele se retirar publicou seus primeiros livros. Casou-se com Sófia Andréievna Behrs com quem teve treze filhos e nos primeiros anos de casamento publicou suas mais famosas obras. No auge do sucesso, envolto a crises existenciais passou a se dedicar à espiritualidade e renegou sua literatura. Pouco antes de morrer, o escritor russo Ivan Turguêniev escreveu a Tolstói: “Faz muito tempo que não lhe escrevo porque tenho estado e estou, literalmente, em meu leito de morte. Na realidade, escrevo apenas para lhe dizer que me sinto muito feliz por ter sido seu contemporâneo, e também para expressar-lhe minha última e mais sincera súplica. Meu amigo volte para a literatura!”. Não se sabe o quanto o pedido de Turguêniev influenciou Tolstói, no entanto, A morte de Ivan Ilitch foi a obra que marcou seu retorno à literatura.
Trata-se de um pequeno livro, porém, de uma sensibilidade gigantesca ao retratar de forma tão humana, a impotência de um ser que se vê morrendo, enquanto observa o quão fúteis são os valores pelos quais se dedica uma vida, e quão falsas são as relações humanas. O livro conta a história de um jovem ambicioso (Ivan Ilitch) que galga posições dentro do Poder Judiciário, contrai matrimônio por conveniência, ganha o cargo de promotor em São Petersburgo por indicação de um amigo no Poder, e que após alcançar a estabilidade financeira, se vê acamado por uma doença grave que o dinheiro e os melhores médicos não conseguem curar. Cada vez mais debilitado, perturbado com o mal que o acomete, irrita-lhe a saúde de seus familiares e amigos, pois esta lhe falta. Sabe que na sua repartição há quem espera sua morte para ocupar seu cargo. A filha no auge da mocidade, feliz, segue sua vida noivando com um jovem e ambicioso juiz de instrução, tal como um dia ele fora. Os membros da família vivem suas vidas enquanto a sua vai se esvaindo até que Ivan dá o suspiro final. Em pleno velório, sua esposa procura se informar com um grande amigo do morto sobre como conseguir mais dinheiro junto ao Governo. Este percebe que ela já estava suficientemente informada sobre o que fazer e dela se esquiva, deixa a casa do morto onde se realiza o velório, e vai ao encontro dos outros amigos do falecido que preferiram não ir ao velório e resolveram se reunir para jogar cartas. O grande amigo descontraidamente toma seu lugar à mesa e no jogo que o falecido costumava ser um dos parceiros. É uma obra para refletir sobre a insignificância de nossa existência e a superficialidade de nossas relações, e para alguns leitores, certamente pode ser uma obra perturbadora.

Sugestão de boa leitura:

A morte de Ivan Ilitch

Autor: Lev Tolstói.
Publicação original: 1886
Editora 34
Ano: 2018
Preço: R$22,80

sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Guerra híbrida no Brasil



            O autor de Guerras Híbridas: das Revoluções Coloridas aos Golpes (Andrew Korybko) afirma que o Brasil se tornou alvo dos Estados Unidos desde a eleição de Lula em 2002 por seu movimento em direção à multipolaridade e também pela descoberta de substanciais reservas de petróleo no Pré-Sal. A participação do Brasil no bloco BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) em contraponto à hegemonia estadunidense no sistema financeiro internacional também causou irritação em Washington que temia ver acelerada sua perda hegemônica que se faz gradual. Segundo Korybko, uma intensa guerra híbrida foi travada em território brasileiro desde 2013 com o objetivo (à época) de desestabilizar o governo Dilma e de inviabilizar o Partido dos Trabalhadores com vistas à eleição de 2018. E Bolsonaro, há muito foi visto como um candidato mais palatável aos EUA1. O leitor atento e bem informado certamente lembra-se das denúncias veiculadas pela Folha de São Paulo envolvendo o então candidato Bolsonaro sobre um suposto esquema de caixa 2 financiado por empresários, o qual teria pago os disparos de Whatsapp que chegaram a milhões de eleitores com postagens contra o Partido dos Trabalhadores, em grande parte, fake news2.
            Agências especializadas como a NSA, ou ainda, prestadoras de serviços como a Cambridge Analytica, de posse dos dados de milhões de usuários das redes sociais e de estudos de seus perfis ideológicos, nadaram de braçadas na Internet trabalhando o lado psicológico de uma população desinformada e/ou cega de ódio ao PT e que ansiosamente buscava um salvador da pátria. Segundo o jornalista argentino Marcelo Falak3 de No Ámbito (de Buenos Aires), uma importante autoridade das Forças Armadas teria lhe dado uma entrevista em 2014 e afirmado que as Forças Armadas previam que haveria polarização em 2018, e que Bolsonaro era o candidato ideal para enfrentar o PT. Na ocasião, os militares sugeriram a Bolsonaro abandonar o nacionalismo econômico e adotar o liberalismo. O oficial das Forças Armadas disse que os militares tinham profundo ressentimento quanto ao fato de serem considerados cidadãos de segunda classe, pois, mesmo graduados, não podiam assumir ministérios e que ansiavam por uma nova democracia. Os militares brasileiros há algum tempo conhecem a estratégia das guerras híbridas. Esse conhecimento, se utilizado, pode ter sido útil na campanha de Bolsonaro. Durante a campanha, o General Villas Boas (Exército) se manifestou publicamente contra a possibilidade da concessão do habeas corpus à Lula4. Recentemente Villas Boas afirmou que os militares “estavam no limite”. Afirmava “não aceitar a impunidade, e exigia o respeito à Constituição Federal”, porém, se isso fosse feito, obviamente Lula teria que ser solto, pois, isto é o que determina a Constituição Federal (Art. 5º Inciso LVII). Ora, sabendo que Bolsonaro era candidato das Forças Armadas desde 2014, como afirma o jornalista argentino que entrevistou o oficial das Forças Armadas, a interpretação que se faz em respeito à racionalidade, é que o movimento no tabuleiro de xadrez executado pelos militares nunca foi contra a impunidade, mas, sim para manter preso quem traria dificuldades à eleição do seu candidato (Bolsonaro), tendo em vista que os militares mantiveram-se em silêncio quanto à impunidade de Aécio Neves (PSDB), e outros.
            Não pretendo aqui discutir um terceiro turno das eleições de 2018, afinal, sórdidas ou não, as estratégias do staff de campanha de Bolsonaro funcionaram, e nada indica que o TSE tenha coragem de caçar a chapa. Ele é o presidente! Manipulada ou cega de ódio ao PT, foi a vontade da maioria do povo brasileiro. E nisso, a esquerda é melhor do que a direita, pois, não deseja a destruição do país em troca do Poder como fez Aécio Neves (PSDB) e apaniguados. O governo Bolsonaro vai tensionar fortemente as instituições, ou elas resistem, e lhe impõem o freio do Estado Democrático de Direito ou o Brasil viverá anos obscuros! À esquerda cabe vigiar as ações de um governo ultraliberal, e que contraria a soberania nacional e o projeto de uma sociedade menos desigual e lhe fazer oposição. À Bolsonaro cabe entender o significado da democracia, aprender economia e política externa, algo que em seus quase trinta anos de vida parlamentar não foi capaz ou teve preguiça. Ele também precisa entender que não somos os Estados Unidos da América e que nem sempre o que é bom para o país ianque é bom para o Brasil! E que no posto de presidente do país deve deixar de falar asneiras, mesmo, que para isso precise evitar os microfones, tal como fez ao fugir dos debates para não perder votos!

FONTES: 
                                                                                      
1. Disponível em: https://tutameia.jor.br/brasil-e-alvo-de-guerra-hibrida/ - acesso em 12 de Novembro de 2018.




sexta-feira, 9 de novembro de 2018

As Guerras Híbridas: das Revoluções Coloridas aos Golpes




            A Internet surgiu no contexto da Guerra Fria (Arpanet) e tinha como objetivo conectar computadores militares dos Estados Unidos da América. Porém, é após o fim da Guerra Fria que ocorre seu boom. Na atualidade, em que a Guerra Fria oficialmente não mais existe, mas, as tensões entre os velhos protagonistas persistem, a Internet é onipresente e tornou-se uma arma de guerra e o ciberespaço, juntamente com o espaço, a terra, o ar e o mar contam com doutrinas militares específicas da superpotência estadunidense para propagar o seu poderio. As pessoas se expõem na Internet e apesar de ser possível apagar o histórico de navegação nos celulares ou nos computadores, isto não ocorre de forma plena, pois, toda a navegação (páginas visitadas e postagens) permanece registrada nos Data Center de empresas como o Google, Facebook, etc. que sabem mais sobre as pessoas do que elas próprias.
            De posse dos dados de navegação na Internet e postagens nas redes sociais, agências especializadas estadunidenses como a Agência de Segurança Nacional (NSA) contam com um conhecimento profundo das sociedades de quase todo o planeta. Entendem a fundo a psique das sociedades alvo e conseguem explorar os seus problemas identitários. Andrew Korybko é o autor do livro “Guerras Híbridas: das Revoluções Coloridas aos Golpes” lançado no Brasil no mês de Outubro de 2018. A obra originalmente publicada em 2015 tem atualizações que visam deixar ainda mais explícito o mecanismo de funcionamento das Guerras Híbridas. O conceito de Revolução Colorida consiste em utilizar as redes sociais (Facebook, Whatsapp, etc.) para estimular e organizar campanhas de desestabilização de governos que contrariam os interesses estadunidenses. No livro, o autor discorre sobre a Primavera Árabe de 2011, que consistiu numa onda de protestos e revoluções populares no Oriente Médio, o barril de pólvora era a crise econômica e a falta de democracia, mas, cujo gatilho foi acionado por agentes ligados ao governo estadunidense e robots (programas de inteligência artificial) que interagem e estimulam os protestos fazendo inclusive postagens (muitas vezes “fake news”) nas redes sociais, multiplicando as mensagens e empoderando os revolucionários virtuais.  O autor faz uma dissecação dos casos que envolveram a Síria e a Ucrânia e que ocorreram no contexto da desestabilização do eixo Rússia, China e Irã, alvo estratégico da geopolítica dos EUA, ou seja, impedir a concretização da nova Rota da Seda que é estratégica para a China; desestabilizar a periferia da Rússia para tornar mais próximo o dia da derrocada desta; isolar e enfraquecer o Irã com vista à deposição do regime e a substituição por um governo fiel aos interesses estadunidenses.
Quando a Revolução Colorida fracassa, os EUA lançam mão da Guerra Não Convencional, ou seja, estimulam e financiam grupos locais a pegar em armas com vistas a derrubar o governo alvo. Os EUA não toleram que países estratégicos aos seus interesses mantenham relações próximas com a China, a Rússia e o Irã. A superpotência ianque também se utiliza da Guerra Híbrida que pode ser a Revolução Colorida e/ou a Guerra Não convencional para derrubar governos que impeçam seu acesso a recursos estratégicos importantes como o petróleo. O autor afirma que a defesa contra as Guerras Híbridas é difícil. O país pode restringir ou monitorar as mídias sociais, mas, isso pode soar como censura e irritar a população. O cidadão, por sua vez, precisa desenvolver sua criticidade e criar o hábito de checar a veracidade das informações. Os partidos políticos e lideranças atingidas precisam entender o mecanismo das Guerras Híbridas para saber delas se defender, de preferência utilizando-se da verdade, pois, embora os ataques sofridos visem à destruição de suas reputações com o uso de fake news, caso as vítimas também recorram ao mesmo expediente, podem ser desmentidas, e com isso terão sua credibilidade destruída. As Guerras Híbridas e as fake news vieram para ficar. É uma forma de guerra mais barata e causa menos desgaste junto à opinião pública mundial do que as guerras convencionais, além disso, o país promotor, no caso, os EUA, pode fazer à surdina. A opinião pública mundial pode desconfiar dos EUA, mas, não terá sua confissão. O Ciberespaço é palco de guerra. Matrix é aqui!

Sugestão de boa leitura: 

Guerras Híbridas: das Revoluções Coloridas aos Golpes – Andrew Korybko – Editora Expressão Popular, 2018 – R$25,00

sábado, 3 de novembro de 2018

O Brasil saiu do armário ou o Editorial de O Globo 1964 – Bis


           Este escriba quando nos bancos universitários se encontrava, recebeu lições de seus mestres de que o Brasil era uma democracia racial. Este país acolhia e respeitava todas as etnias que para cá vinham. Tal teoria se embasava na obra de pensadores dos anos 1930. Na verdade, se buscava criar uma fábula para adultos de que o gigante da América do Sul era diferente do gigante da América do Norte (os Estados Unidos da América), uma nação preconceituosa e xenófoba, não por acaso, berço da famigerada Ku Klux Klan, organização segregacionista que prega a superioridade da raça branca anglo-saxã, e que desejava, quando de sua criação, a deportação dos negros de volta à África ou para outros países.            
            Eis que em pleno século XXI, o Brasil sai do armário, elege Bolsonaro, um político que em várias oportunidades fez falas fascistas, xenófobas, machistas, racistas, homofóbicas, misóginas e carregadas de preconceito de classe. Não se pode pensar, sob pena de contrariar um mínimo de racionalidade, que as pessoas que elegeram Bolsonaro, o fizeram sem ter consciência disso. Há inúmeras gravações. Se ele foi o político mais votado é porque seus eleitores são também fascistas, xenófobos, machistas, racistas, homofóbicos, misóginos e portadores de preconceito de classe, ou pensam que isso é algo sem importância, o que evidenciaria uma suprema falta de inteligência. Afinal trata-se da pessoa que irá representar o país perante o mundo.  O (a) Globo, após ter pedido desculpas pelo apoio ao Golpe Militar de 1964, fez uma reedição do mesmo, aparentemente para comemorar a vitória de Bolsonaro sobre o partido que lhe é indigesto, o PT. Nele tenta pintar em Bolsonaro as cores da direita, quando isso não corresponde à verdade. O (a) Globo deveria saber que não adianta maquiar um monstro. Até um dirigente da Ku Klux Klan manifestou apoio a Bolsonaro. A imprensa internacional vê (corretamente) em Bolsonaro a extrema-direita. Aquela que já foi a de Hitler (Alemanha), Mussolini (Itália), Franco (Espanha), e dos militares na ditadura militar brasileira (1964-1985). Reportagens e charges em jornais e revistas estrangeiras mostram a bandeira nacional sendo substituída pela bandeira nazista, o Cristo Redentor fazendo a saudação nazista, etc.. O mundo vê estarrecido e com tristeza a escolha do Brasil. Um político estadunidense afirmou que toda nação tem o direito de se destruir e que o Brasil escolheu se suicidar.  
            No editorial, O (a) Globo fala na oxigenação que esta eleição proporcionou, embora Bolsonaro nada tenha de novo, pois, há três décadas exerce cargos legislativos. Bolsonaro representa a velha política. A política da Casa Grande que reconduz à Senzala a classe trabalhadora, sempre que ela se assanha a dela querer sair. De acordo com uma pesquisa somos a terceira nação mais ignorante do mundo. E, sabemos que um povo pouco afeito à leitura da história está condenado a repeti-la. No editorial, O (a) Globo não poupa críticas ao PT, e tal como no editorial de 1964, faz um contorcionismo textual dando as cores que deseja (e não as reais) aos fatos que resultaram na queda do PT e de Lula. O (a) Globo tem grande expertise em manipulação ideológica. Não fala, por exemplo, que a ampla maioria de candidatos em igual situação de Lula (condenados em segunda instância) puderam se candidatar e à Lula isso foi negado. Lula era o único candidato que poderia livrar o Brasil do vexame internacional e do risco que Bolsonaro representa. Foi impedido justamente por ser potencialmente o vencedor. A Constituição é clara, “ninguém pode ser preso antes do trânsito em julgado” (Art. 5, Inciso LVII). Somente após a condenação em definitivo é que Lula poderia ser preso e perder os direitos políticos. Não há no processo, provas concretas contra Lula, apenas ilações (delações premiadas, pois, os réus sabem o que a Lava-Jato deseja ouvir e disso querem se beneficiar).
            Após a recondução dos escravos (a classe trabalhadora) para a Senzala (de onde pensa que não deveria ter saído), O (a) Globo em seu editorial (1964 Bis) alerta para a necessidade de pacificação do país, o que soa zombeteiro, pois, a extrema-direita da qual Bolsonaro é signatário, costuma fazê-lo com a repressão policial-militar. A paz social que a Casa Grande (da qual O (a) Globo faz parte) deseja é o silêncio da Senzala (as vítimas de uma das maiores desigualdades sociais do planeta). Talvez daqui a cinquenta anos, O (a) Globo peça desculpas por este editorial e por ter apoiado Bolsonaro. Eu de minha parte espero que a Globo acabe antes disso. A Globo ao empreender a campanha anti-petista chocou o ovo da serpente da extrema-direita. Bolsonaro (no governo) é sua cria!



domingo, 28 de outubro de 2018

Um canalha à porta do Planalto


Um canalha à porta do Planalto

POR FRANCISCO ASSIS - EURODEPUTADO DO PS PARA O JORNAL PÚBLICO (PORTUGAL)

Carlos Alberto Brilhante Ustra foi um dos maiores, senão mesmo o maior torcionário, no tempo da ditadura militar que vigorou no Brasil entre 1964 e 1985. Em 2008 foi o primeiro oficial condenado por sequestro e tortura. Comprovadamente, maltratou física e psicologicamente centenas de pessoas e chegou ao limite de obrigar crianças a presenciarem o dilacerante espectáculo do espancamento dos respectivos progenitores. Nunca reconheceu os seus crimes nem manifestou o mais leve arrependimento pelos seus actos desumanos. Era um canalha. Morreu em 2015, em Brasília, na cama de um hospital. Foi precisamente este torcionário miserável que o então deputado federal Jair Bolsonaro homenageou no momento em que votou a favor do impeachment da Presidente Dilma Rousseff. Nessa ocasião, Bolsonaro pronunciou uma declaração que o define integralmente: dedicou o seu voto à “memória do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff”. É impossível imaginar, naquele contexto, uma afirmação mais vil, um comportamento mais indigno, uma atitude mais asquerosa. Bolsonaro revelou-se ali o que ele verdadeiramente é: um canalha em estado puro.
O que é um canalha em estado puro? É alguém que contraria qualquer tipo de critério moral e se coloca num plano comportamental pré ou anticivilizacional. Quem elogia o torturador de uma jovem mulher absolutamente indefesa atribui-se a si próprio um estatuto praticamente sub-humano. Bolsonaro é dessa estirpe, desse rol de gente que leva à interrogação sobre o que subsiste de humano no homem que literalmente se desumaniza. [...] A barbárie tem muitos rostos: é estúpida, boçal, intolerante, sectária, fanática, simplista, racista, xenófoba, homofóbica, sexista, classista, irremediavelmente preconceituosa, inevitavelmente primária. Jair Bolsonaro é um dos rostos perfeitos dessa barbárie em versão actual. Tudo nele aponta para a pequenez: é um ser intelectualmente medíocre, eticamente execrável, politicamente vulgar. Nele observa-se uma prodigiosa ausência de qualquer tipo de grandeza e uma assustadora presença de tudo quanto invalida um cidadão para o desempenho da mais humilde função pública. Por isso mesmo ele é extraordinariamente perigoso: é a expressão quase exemplar do homem sem qualidades subitamente erigido a um papel de liderança.
[...] Alguns analistas políticos, uns por ignorância, outros por má-fé, tentam convencer-nos que os brasileiros terão de escolher nas eleições presidenciais entre a cólera e a peste. Isso não corresponde minimamente à verdade. Equiparar Haddad a Bolsonaro constitui um acto moral e politicamente inqualificável. Quem o faz torna-se cúmplice de Bolsonaro, da sua vertigem proto-fascista, da sua propensão para o culto da violência. É por isso que não pode haver hesitações neste momento da história do Brasil e, de uma certa maneira, da própria história da Humanidade. Haddad é um intelectual sofisticado, um democrata respeitador dos princípios fundamentais das sociedades abertas e pluralistas, um homem de reconhecida integridade cívica e moral.
[...] Uma vitória de Bolsonaro significaria um retrocesso civilizacional para o Brasil e para o mundo. Não estamos, por isso, a falar de um confronto político e ideológico normal. Estamos perante um verdadeiro confronto entre a civilização, por mais ténue que esta seja, e a barbárie. Haddad é hoje mais do que Haddad, é mais do que o PT, é mesmo mais do que o Brasil. Haddad é o símbolo da luta da razão crítica contra o obscurantismo, da liberdade face ao despotismo, da aspiração igualitária diante do culto das hierarquias de base biológica ou social. É por isso que este combate nos interpela a todos. Estamos perante um momento de divisão clara entre o que no Homem há de apelo à razão, ao culto da liberdade, ao sentido da fraternidade, e o que no mesmo Homem há de impulso básico para o autoritarismo, a servidão e a anulação da inteligência crítica. Há horas na história em que tudo se reconduz a uma dicotomia simples que é ela própria o oposto de uma redução ao simplismo. Sejamos claros, no Brasil, hoje, a opção é evidente: Haddad significa a civilização, Bolsonaro representa a barbárie [...].

Leia o artigo completo acessando o link abaixo:

FONTE: Disponível em: https://www.publico.pt/2018/10/11/mundo/opiniao/um-canalha-a-porta-do-planalto-1847097 - Acesso em 14 de outubro de 2018.


quinta-feira, 18 de outubro de 2018

A democracia acima de tudo!



            Há algumas semanas publiquei neste espaço o artigo “o pior dos mundos” afirmando ser um (improvável) confronto entre Alckmin (PSDB) x Bolsonaro (PSL). Reitero que há muito tempo sou opositor ferrenho ao que o PSDB representa na política brasileira. Porém, as leituras e o tempo de reflexão me esclareceram sobre o que faria neste embate que não se realizou. No Rio, ferrenhos opositores de Eduardo Paes (DEM) estão declarando voto nele, pois consideram Wilson Witzel (PSC) ainda pior. Eu, mesmo que a contragosto, votaria em Alckmin para evitar que um político fascista e tudo o que ele representa suba a rampa do Palácio do Planalto. Logicamente faria isso por não haver alternativa, com Alckmin perderíamos os anéis (aprofundamento do neoliberalismo, desmonte de direitos trabalhistas, reforma previdenciária, privatizações entreguistas, corte de gastos sociais, aumento da desigualdade social, etc.), mas, manteríamos os dedos (a democracia). Com Bolsonaro perderíamos os anéis e também os dedos, basta verificar todas as suas falas fascistas que evidenciam o seu pensamento, que infelizmente seduz milhões de seguidores que se vêm nele representados.
            Apesar das orientações de que era necessário dialogar com os bolsonaristas, esclarecer o perigo que Bolsonaro representa para a nação, excluí mais de duzentos seguidores de Bolsonaro da minha rede de amigos virtuais do Facebook. Porém, nem isso me livra da decepção que com eles tive, pois, não se trata de mera divergência ideológica, mas, moral. Na Alemanha, berço do nazismo, há um adágio que explica o que penso: “se em uma mesa estão sentadas dez pessoas, e nela um nazista vem se sentar. Se as dez pessoas não se retirarem, na mesa estarão onze nazistas”. Sei que nada demove os bolsonaristas de sua intenção, o fascismo está em seu DNA. De igual forma, na Alemanha pré-nazista, nada foi capaz de mudar a opinião dos judeus que pretendiam votar em Hitler, apesar dos esforços dos judeus opositores do líder nazista em esclarecer o perigo que ele representava para o povo judeu. Sempre disse que sou avesso a qualquer tipo de ditadura seja de direita ou de esquerda e defendo sempre a democracia, que pode não ser perfeita, mas ainda é o que há de melhor.
A história demonstra que temos uma tradição autocrática, a democracia ocorre nos intervalos de períodos autoritários. Esse apego de grande parcela do povo brasileiro aos regimes autoritários tem sua raiz no sistema escravagista, que em nosso país persistiu por tanto tempo que fez dele o último a extinguí-lo. Li que na época da escravidão, havia uma parcela de trabalhadores livres (imigrantes europeus) que eram contrários à libertação dos escravos. Sentiam-se superiores, pois, embora miseráveis, não eram escravos. Da mesma forma, há na atualidade, trabalhadores que se dizem de classe média (equívoco conceitual) que são opositores de qualquer programa que vise melhorar a situação da parcela miserável da sociedade. Gostam de se sentir especiais devido às qualidades pseudo meritocráticas que atribuem a si próprios.
O único lado positivo do Golpe de Estado de 2016 e de tudo que se seguiu a ele foi o fato de desnudar a sociedade brasileira evidenciando perante o mundo que se Deus é brasileiro, não é muito popular nestas bandas. Aqui há grande possibilidade de um político que já afirmou ser defensor da tortura e da morte se eleger com o apoio de religiosos cristãos que esquecem que Cristo foi torturado e morto. Estes religiosos apóiam a “política do bandido bom é bandido morto” tal como os religiosos que pediram a morte de Cristo. Enfim, o Brasil demonstra não ser um pais sério como diz a célebre frase. A eleição está sendo e poderá ser decidida por fake news em grupos de Whatsapp. Será por vontade do povo se Bolsonaro for eleito, mas, não sem importantíssima contribuição da Mídia, do Poder Legislativo e Judiciário que chocaram o ovo da serpente desde 2013 (guerra híbrida). Resta pedir ao eleitor indeciso que reflita sobre qual Brasil quer para si, seus filhos e netos, pois, a arma (Bolsonaro) que muitos desejam ver liberada pode se voltar contra você e sua descendência! A democracia pode não ser perfeita, mas, ainda não se criou nada melhor! A democracia acima de tudo!

P.S. A frase “o Brasil acima de tudo” denota a origem, pois, na Alemanha Nazista se utilizava a expressão: “Deutschland über alles”, ou seja, A Alemanha acima de tudo!

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Não aprendemos!



            Costumamos criticar o quadro atual da política brasileira como se este não tivesse nenhuma relação conosco enquanto sociedade. A verdade é que não encaramos a política com a seriedade e o bom senso necessário. O ato de votar consiste em passar uma procuração para o representante escolhido pelo eleitor, mas, parece que muitos eleitores disso não têm consciência. Você passaria uma procuração para que alguém o representasse inclusive com o poder de negociar seus direitos sem conhecer bem as intenções, o caráter e o passado desta pessoa? Você, por uma paixão extremada indicaria como seu procurador uma pessoa de caráter duvidoso, cujas intenções constituem uma grande incógnita, preterindo dessa forma o outro procurador possível, o qual ostenta credenciais claramente superiores apenas por que ele torce pelo clube de futebol que você aprendeu a detestar e a se opor? O leitor poderia dizer que futebol e política não têm nada a ver, porém, em se tratando do Brasil, digo que está equivocado. Tratamos a política tal como ao futebol, paixão e ódio se misturam. O mundo sabe que nosso futebol está em decadência, como também a nossa democracia, aliás, estamos em franca decadência como sociedade.
            Nas eleições de 2014 elegemos o pior parlamento desde o fim da ditadura militar (grande parte com pendências judiciais). Em 2018, elegemos um ainda pior. Em um momento em que o Brasil figura novamente no mapa da fome da ONU, os eleitores brasileiros ampliaram as representações da Bancada do Boi, da Bala e da Bíblia que representam o que há de mais conservador e avesso ao avanço do país rumo a uma sociedade menos injusta, tendo em vista que figura entre as mais desiguais do planeta. A eleição do ator pornô Alexandre Frota (PSL) e a reeleição de Tiririca (PR) e de Aécio Neves (PSDB) demonstram que a culpa talvez não seja dos políticos, mas, do eleitor, pois, já não é possível falar que foi enganado pela lábia dos candidatos e que não conhecia o passado dos mesmos. Falta seriedade ao eleitor brasileiro, que age como se a política fosse o confronto entre agremiações adversárias num jogo de futebol, porém, quando o jogo de futebol acaba, não traz consequências práticas para a vida dos torcedores, o que não é o caso da política. Com a expansão da bancada da Bíblia no parlamento, o Estado laico, símbolo das sociedades democráticas encontra-se cada vez mais ameaçado. A mistura de religião e política no seio do Estado, sempre gerou historicamente sociedades pouco democráticas, nas quais os fundamentos religiosos de um grupo se impuseram até mesmo às pessoas que deles não compartilhavam tolhendo-lhes seus direitos individuais.
            A eleição também demonstrou que o eleitor brasileiro reelegeu figuras envolvidas em corrupção. Isso demonstra que a corrupção é seletiva. Para muitos eleitores somente é corrupto o político da agremiação adversária. Dessa forma, políticos que tiveram forte atuação favorável ao Golpe de Estado de 2016 foram reeleitos, por sua vez, políticos que tiveram grande destaque na defesa da legalidade, dos direitos trabalhistas e da soberania nacional ante o entreguismo instalado pelo governo golpista foram rejeitados nas urnas. É o caso de Roberto Requião (MDB), um dos parlamentares mais cultos, patriotas e preparados do Parlamento. Em seu lugar assume o Professor Oriovisto Guimarães (Podemos), cuja trajetória, ideologia e classe de origem indica que tomará rumo diverso ao de Requião. Flávio Arns (Rede), por sua vez, carece de capacidade combativa e de constância ideológica. Requião é uma voz em defesa da legalidade, da soberania nacional e dos diretos dos trabalhadores cuja falta se ressentirá a nação e a classe trabalhadora. Outra falta no Senado será a do também legalista e defensor da classe trabalhadora Lindbergh Farias (PT). Eduardo Suplicy e Dilma Rousseff ambos do PT também poderiam contribuir muito com a pauta da classe trabalhadora num parlamento majoritariamente ocupado por representantes da classe dominante. A classe dominante é majoritária na política brasileira com grande ajuda do pobre de direita que constitui o mais importante produto fabricado pelo capitalismo brasileiro. Enquanto houver pobre de direita que por odiar pobres (que ao fim e ao cabo também é) vota sempre contra os seus próprios interesses, a elite agradece e a miséria permanece!

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

A falência das instituições – o Poder Judiciário!




Quando um Ministro do Supremo Tribunal Federal (Barroso) sente a necessidade de informar que as instituições estão funcionando normalmente, e de que não estamos em um estado de exceção, torna ainda mais evidente o contrário. É da percepção de toda e qualquer pessoa honesta, e bem informada, que vivemos um momento de anormalidade democrática. A história demonstra que não possuímos tradição democrática. A democracia (de baixa intensidade) ocorre nos intervalos entre os golpes de Estado, sempre praticados por forças conservadoras, portanto, da direita. O colega do Ministro Barroso, Ricardo Lewandoski definiu à Revista Exame a situação em que o país se encontra ao afirmar: “o impeachment de Dilma foi um tropeço na democracia, os quais, o país costuma ter a cada 25 ou 30 anos”.
Para quem já leu Kafka, especialmente a obra “O Processo”, sabe que não há nada de mais kafkiano (absurdo, ilógico, etc.) que a forma como foram conduzidos os processos contra Dilma e Lula. A forma como o Judiciário tem se comportado, é traduzida na frase de François Guizot: “Quando a política penetra o recinto dos tribunais a Justiça se retira por alguma porta”. O Ministro Marco Aurélio de Mello (STF) comentou: “vivemos tempos estranhos” ao se referir a algumas atitudes do Juiz Sergio Moro responsável pela Lava-jato. O Judiciário impôs várias chicanes à defesa do ex-presidente Lula, o qual segundo juristas renomados, não teve direito a um processo legal, imparcial e em absoluta conformidade com a Constituição Federal e a legislação. Ciente disso, a ONU concedeu liminar em favor de Lula, a qual foi desobedecida pelos togados ensimesmados e pouco patriotas que parecem não enxergar (ou são anuentes) o desmonte da nação levado a cabo por um governo ilegítimo em benefício do Grande Capital nacional e estrangeiro, e impuseram ao país o status de nação pária (grupo de nações que  desobedecem a ONU).
Uma juristocracia se implantou no país. A qual em consórcio com a Grande Mídia e setores corruptos da classe política e empresarial pôs abaixo o edifício da democracia. O Ministro Marco Aurélio Mello ao definir o atual momento citou Ruy Barbosa: “A pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário, contra ela não há a quem recorrer” e reiterou: “o país está desprovido de segurança jurídica para a quadra delicada que o país atravessa”. Temos em nosso país um dos poderes Judiciários mais caros do mundo, nem por isso mais eficiente. As regalias concedidas e autoconcedidas aos magistrados coram de vergonha seus pares na Suécia, os quais não poupam críticas aos magistrados brasileiros questionando a moralidade destas. O país vive um momento de grave crise política e econômica, mas, os magistrados insensíveis à situação de penúria com que vive grande parte da população, não se fizeram de rogados e aumentaram os seus já nababescos salários, turbinados que são por gratificações e auxílios imorais como o auxílio-moradia. Os aumentos concedidos aos vencimentos dos Ministros do STF provocam efeito cascata sobre o funcionalismo público de alto escalão, algo catastrófico para um país em crise, mas, o Ministro Tofolli (STF) encontrou a solução, propôs desvincular o salário de Ministro do STF das demais categorias, assim, o efeito cascata não mais ocorreria. Dessa forma, o salário dos togados poderia aumentar livremente, talvez, no modelo “o céu é o limite”. O momento de ilegitimidade por que passa o país é campo aberto para a colheita dos magistrados (56% de reajuste desde o golpe). Em 2015, Dilma negou reajuste ao Judiciário. Negar reajuste ao Judiciário é algo que somente faz quem tem legitimidade e nada a esconder.
O poder Judiciário perdeu a credibilidade (que não era muita) perante a população. O Ministro Barroso afirmou que os juízes estão do lado certo da história. Parece que ele não foi um estudante aplicado de história, pois, os Juízes não estavam do lado certo ao dar suporte ao regime escravagista no Brasil e ao Apartheid na República da África do Sul. Na Alemanha, Hitler falou: “que teríamos feito sem os nossos juristas?”, os quais foram essenciais para o suporte do nazismo. Em 1936, a Corte Suprema (atual STF) deu anuência para que Olga Benário (esposa de Luís Carlos Prestes) fosse entregue ao regime nazista de Hitler que a assassinou. O STF deu suporte à ditadura militar (1964-1985), apenas para citar alguns exemplos. Enfim, o Poder Judiciário é uma instituição que não só se amolda às forças dominantes e conservadoras da sociedade como também muitas vezes é protagonista. Romantismo é pensar que o Poder Judiciário tem como fim precípuo a observação e aplicação inflexivelmente fiel do Direito “sem olhar a quem”. Quando magistrados são flagrados e condenados por  atividades ilícitas (raramente, pois, há muito corporativismo) geralmente são aposentados com vencimentos integrais. Os privilégios que os magistrados desfrutam, além de imorais constituem um entrave para o avanço da democracia, pois, não os tornam símbolos a serem seguidos na busca de uma sociedade ideal, sem privilégios e com justiça social para todos. Na Suécia, as pessoas acham estranho quando se pergunta sobre corrupção no Poder Judiciário do país, pois, não existe. Precisamos de um Judiciário ao estilo sueco, impoluto e sem privilégios imorais, ou seja, à altura do país que queremos e iremos construir!

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

A falência das instituições - a mídia!



            A credibilidade é para as empresas de comunicação tão importante quanto o capital de giro. A credibilidade, sinônimo de respeito ao público e de bom jornalismo, dá ao meio de comunicação, a audiência (emissoras de TV e rádio), e a venda de exemplares de revistas e jornais cujo maior alcance de leitores, traz em seu bojo, maior quantidade de anunciantes. Assim, se costuma dizer que a credibilidade é o principal ativo de uma empresa de mídia.
            Em nosso país, devido à falta de capacidade da direita que se mostrou acéfala e incapaz de fazer uma oposição política competente, a Grande Mídia tomou para si o papel de oposição aos governos progressistas de Lula e Dilma. Ao renunciar ao jornalismo sério, se tornou uma poderosa usina de fake news. A regra imposta e denunciada por vários jornalistas demitidos era pauta negativa para os governos petistas e ignorar o resto. A manipulação se tornou tão absurda, que, para ter acesso à informação de boa qualidade sobre o Brasil, a mídia europeia, enviou mais correspondentes ao país, pois, constatou que a Grande Mídia nacional não era fonte confiável para levar ao seu público a noção do que realmente se passava no país quanto aos processos kafkianos contra Dilma, e, mais recentemente contra Lula.
            Há alguns dias, soube que Bolsonaro havia se reunido com os herdeiros do grupo Globo para a costumeira sabatina privada (em minha opinião, algo reprovável e que possui um ranço coronelístico). Dias depois, tomei conhecimento de que o candidato sofrera um atentado, o qual teve ampla cobertura da TV Globo. Logo pensei: começaram as armações! Não fui o único a cometer tal equívoco! Muita gente ainda põe em dúvida o atentado. É um equívoco compreensível! Afinal, todos se lembram da edição do debate de 1989, em que a Globo operou a favor de Collor e contra Lula. Todos lembram também do fake news sobre Lurian, filha de Lula, no último programa eleitoral de Collor. Também teve o episódio em que arremessaram um objeto na cabeça do candidato Serra e ele fez até tomografia com ampla divulgação, que obviamente nada acusou, e peritos ao analisar os vídeos constataram se tratar de uma “perigosa” bolinha de papel. São apenas alguns exemplos de um rol que remonta há décadas.
Pela Grande Mídia, o brasileiro é muito informado sobre a crise na Venezuela (governo de esquerda), mas, pouquíssima informação recebe sobre o caos econômico da Argentina do direitista Macri. A Grande Mídia apostou todas as suas fichas no liberalismo daquele país e perdeu. A Argentina está afundando tal qual o Titanic, sendo o iceberg da vez, o neoliberalismo. E tal como em 1912, não há botes salva-vidas para a terceira classe. O cidadão brasileiro foi informado de que a quarta eleição consecutiva do esquerdista Evo Morales na Bolívia era algo péssimo para a democracia, pois, a não alternância de governo resultava na prática em uma ditadura. No entanto, essa mesma crítica não foi veiculada quando da quarta eleição consecutiva da direitista Angela Merkel na Alemanha. A Grande Mídia costuma impor aos partidos e regimes à esquerda a pecha de antidemocráticos, mas, não informa à população que todos os golpes contra a democracia brasileira foram realizados pela direita. A Grande Mídia critica os programas sociais (que beneficiam os pobres), mas, não mantém o mesmo tom quanto aos recursos, isenções fiscais e perdões de dívidas costumeiramente concedidos pelo Estado em benefício de grandes capitalistas, sejam eles, industriais e/ou latifundiários. A Grande Mídia demoniza o Estado e divulga a corrupção de agentes, mas, pouco ou nada faz para mostrar que o grosso da corrupção é realizado no Mercado (setor privado). A Grande Mídia luta para que o Estado seja mínimo (para a população), o que libera mais recursos para o grande capital no qual ela se insere, mas, isso ela não divulga.
Em nenhum país há o que aqui temos. Em contrariedade à Constituição Federal, seis famílias possuem o monopólio da informação ao deter a propriedade cruzada de jornais e revistas; emissoras de rádio; e, emissoras de TV. O Brasil necessita urgentemente da regulação econômica dos meios de comunicação. A qual não visa censurar ou regular conteúdo, mas, impedir a propriedade cruzada dos meios de comunicação e acabar com esse danoso monopólio. A democratização da mídia é condição imprescindível para o florescimento de uma verdadeira democracia no país!


sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Golpe de Estado 2.0

       Dilma Rousseff avisou em 2016 que o golpe travestido de impeachment (golpeachment) em curso era contra os trabalhadores e a soberania nacional, pois, o que se pretendia era retirar direitos trabalhistas e realizar o entreguismo das riquezas nacionais para o capital estrangeiro. Tudo se confirmou. A terceirização irrestrita foi aprovada. Houve o fim da política de valorização real do salário mínimo, a redução/extinção de programas sociais. A crise fabricada não dá tréguas. A classe trabalhadora não mais suporta, mas, é obrigada a pagar por ela. Crise que não afeta o andar de cima ocupado pela elite escravocrata que sorri, mesmo que à custa da destruição nacional e do retorno da miséria traduzida nas barrigas vazias de crianças. O bilhete premiado que o Brasil conquistou com investimentos da Petrobrás na procura de petróleo no Pré-Sal, inclusive nos mesmos locais que companhias estrangeiras falharam, não vai mais para a Educação, a Saúde e para o Fundo Soberano das futuras gerações. Vai para o exterior, pois, está sendo recebido pela Shell, Chevron, Total, Statoil, Sinopec, etc. O governo golpista concedeu vinte anos de isenção tributária para as petroleiras estrangeiras e trabalha para retirar o que puder da Petrobras para repassar a estas. Tudo dentro da normalidade de um governo que carece de legitimidade e busca apoio de potências imperialistas colocando o país em posição de submissão.
     Crise não é algo ruim para todos. O grande capital nacional e estrangeiro adora fabricar crises em países vulneráveis, e tal como piratas, saqueiam nações periféricas e transportam o butim para alimentar o centro do sistema. A crise é o momento em que se pode chamar a classe baixa e média para pagar a conta da jogatina do cassino em que se transformou o capitalismo global. O neoliberalismo que é a atual forma do capitalismo global constitui uma das mais acabadas formas de fundamentalismo. O neoliberalismo é segundo seus defensores a única opção possível, a ditadura do discurso único. O radicalismo neoliberal é tal que seus agentes constituídos pela parcela do 1% mais rico do mundo não têm escrúpulos em destruir democracias e vidas. A democracia é para o neoliberalismo um obstáculo e precisa ser eliminada.  O mercado se tornou “Deus” e o capitalismo sua religião. Ninguém pode questionar o “Deus” Mercado sob pena de cometer heresia, e ser queimado na fogueira da ignorância que ocupa a parcela formada por mentes vazias de criticidade, porém, repletas de alienação diariamente alimentadas por TV Globo, revista Veja, etc. O golpe de 2016 está sendo muito bom para o grande capital nacional e estrangeiro, afinal, tal como abutres adoram uma carniça. Os ricos (eu disse ricos!) ganharam, mas, ganharam graças ao que os trabalhadores perderam. Os banqueiros que devoram quase 50% do orçamento nacional querem mais, desejam a reforma da Previdência que uma auditoria e uma tese de doutorado desmentiram ser deficitária. Triste é observar trabalhadores sem consciência de classe defendendo a reforma da previdência cujo objetivo é que mais recursos legalmente captados para esta passem a ser dirigidos para os bolsos dos abastados (1% mais rico).
  Eduardo Cunha (PMDB), importante operador do golpe em 2016, numa atitude de vingança contra Dilma e o PT, que não o defenderam de processos que contra ele pipocavam, ao declarar seu voto contra Dilma, tal como o carrasco ao lançar o machado sobre o pescoço da vítima, proferiu: “Que Deus tenha misericórdia dessa nação”. E “Deus” não teve misericórdia do Brasil, pois, “Deus” agora é o Mercado, e o Capitalismo a sua religião!


P.S. Recebo a notícia de que o golpe avança para o nível 2.0. O TSE indeferiu a candidatura Lula contrariando liminar da ONU. Agora o Brasil é uma nação pária. A gente sempre tem esperança de que o golpe acabe, mas, não devia, afinal, como disse Jucá trata-se de “um grande acordo nacional, com Supremo, com tudo”! E como nos ensinou o mestre Paulo Freire, a gente se frustra na espera, porque não conjuga a esperança na forma correta cujo verbo é esperançar! Fazer acontecer!