Retorno a este tema, apesar
da série de artigos aqui publicados com o título "O sionismo e o apartheid
na Terra Santa: do holocausto judeu ao holocausto palestino". Sou chamado
pela minha consciência a fazê-lo, tendo em vista a continuidade do massacre de
vítimas inocentes em Gaza e a polêmica gerada em torno da fala do presidente
Lula. A polarização que dividiu o país em "Nós" e "Eles"
fez com que a sociedade brasileira ficasse dividida entre os que aplaudem Lula
por sua fala corajosa e, aqueles que acreditam que o Brasil se tornou um pária
internacional, por não apoiar Israel em sua campanha militar na Faixa de Gaza.
Li, reli a fala do presidente Lula e, não vi nela nada
mais que a verdade. Lula fez o que as lideranças do mundo desenvolvido, por
covardia e conveniência, se omitiram. Nenhuma das grandes lideranças mundiais
criticou Lula, mas, romperam o silêncio e exigiram que cessem os assassinatos de
civis inocentes. Lembro que o apartheid na África do Sul somente acabou com
forte pressão internacional e, que os Estados Unidos, o Reino Unido e o Estado
de Israel apoiavam o governo segregacionista de minoria branca. A então
primeira ministra do Reino Unido Margaret Thatcher (1925-2013) se recusou a
adotar sanções contra a África do Sul e fez pronunciamentos nos quais acusava
Nelson Mandela (1918-2013) de ser um terrorista. A história colocou Mandela num
patamar muito acima de Thatcher dentre as grandes personalidades mundiais.
Há um Estado de apartheid em Israel, no qual os
palestinos estão confinados em seu próprio território (tal como os bantustões
sul-africanos) sem a liberdade de ir e vir, pois passam por constrangimentos e
humilhações diárias nos vários checkpoints instalados nas terras palestinas
ocupadas por Israel. A África do Sul, cuja ferida do apartheid ainda não
cicatrizou, foi certeira em denunciar Israel ao Tribunal Penal Internacional. Em
pleno século XXI, Israel, que desrespeita e desobedece a ONU, é um dos países
onde mais se descumpre os direitos humanos. O holocausto não pode servir de
salvo-conduto para o Estado de Israel impunemente cometer crimes contra a
humanidade.
Criticar o governo Netanyahu por sua política de
genocídio contra o povo palestino, não é desrespeitar a memória das vítimas do
holocausto judeu, nem mesmo o presidente Lula fez a comparação quanto à magnitude
do genocídio praticado pelos nazistas alemães com o genocídio que Israel pratica
contra o povo palestino, afirmar o contrário é cometer desonestidade
intelectual. Toda reação a um ato hostil deve ser balizado na proporcionalidade.
Israel já passou longe da resposta equivalente que lhe caberia dar, e ataca
civis inocentes, pois cerca de trinta mil civis (grande parte formada por
mulheres e crianças) já foram mortos desde sete de outubro de 2023.
Genocídios não deveriam ocorrer e comparar genocídios é
absurdo! Mas, quantas pessoas devem morrer para que seja considerado um
genocídio? Precisa chegar a seis milhões? Nesse caso, o genocídio contra os
povos indígenas supera em muito tal número, 57 milhões, mas Benjamin Netanyahu
insiste que o ocorrido com os judeus não tem comparação com nada na história
mundial. A vida dos indígenas vale menos? A vida dos africanos escravizados,
torturados e mortos no cativeiro em terras distantes valem menos? Toda vida
humana importa! As vidas indígenas e negras importam! As vidas palestinas
importam! Genocídio não é assim qualificado por um número absoluto de vítimas,
mas pela sua natureza, ou seja,por ser uma política sistemática de limpeza
étnica, de extermínio total ou parcial de um povo em situação de fragilidade.
Lula acertou quando disse que em Gaza há o ataque de um dos mais preparados
exércitos do mundo contra civis inocentes, vitimando em grande parte mulheres e
crianças indefesas.
Concordo com o assessor chefe da Presidência do Brasil
Celso Amorin, quando disse "Israel não deve desculpas ao Brasil, mas que
as deve à humanidade". Penso também que Netanyahu deve pedir desculpas à
memória das vítimas do holocausto, pois, tenho certeza que elas, não gostariam
que seus líderes fizessem com outras pessoas aquilo que lhes impuseram.
Benjamin Netanyahu se irrita quando é acusado de praticar uma política de
genocídio, porém, não há como classificar de forma diferente sua política de
governo. Lembro do saudoso político Leonel Brizola (1922-2004) quando afirmou
"tem focinho de jacaré, rabo de jacaré, patas de jacaré, corpo de
jacaré...então como que não é jacaré? Essa frase cabe bem na caracterização do
governo de Netanyahu e sua política genocida.
É bizarro que um povo que sofreu nas mãos da
extrema-direita nazista alemã tenha em sua história vários governos de
extrema-direita. Penso que em memória às vítimas do holocausto, o povo judeu
não deveria permitir que isso acontecesse. Ter a direita no poder é do jogo
político, mas não a extrema-direita. Um exemplo disso é a Alemanha que repudia
tal ideologia e vigia de perto os atos de grupos de extrema-direita no país,
afinal, o nazismo deixou profundas cicatrizes na sociedade alemã. Infelizmente,
uma das maiores infâmias da história mundial, colocou os judeus como vítimas, o
holocausto. A ONU sob a liderança do Brasil (Oswaldo Aranha) na sessão da ONU
(1947), criou o Estado de Israel e, na atualidade, a liderança sionista de
Israel coloca o quarto exército mais poderoso do mundo como algoz de um povo,
os palestinos. No entanto, sou sabedor que, assim como vacas às vezes vão parar
em telhados e, nos perguntamos como isso aconteceu, tragédias também ocorrem na
política, e sei que grande parte do povo judeu não compartilha do pensamento
das lideranças que governam o país, dadas as notícias sobre os protestos de
judeus contra a política de extermínio levada a cabo por Netanyahu.
Em 1948, os judeus, Albert Einstein (1879-1955) e Hannah
Arendt (1906-1975) que dispensam apresentações e, na companhia de uma centena
de proeminentes personalidades judaicas em uma carta publicada no jornal
estadunidense The New York Times já denunciavam que a extrema-direita (Partido
da Liberdade) de Israel que mais tarde veio a formar o Likud, o partido de
Benjamin Netanyahu, tinha por sua organização e metodologia, caráter semelhante
ao nazifascismo. Sob a luz do sol, há muito pouco no planeta que se pareça
tanto com o nazismo quanto a atual política governamental da liderança sionista
de Israel para com a questão palestina. Netanyahu em uma fala até "passou
pano" para Hitler quando disse que o líder nazista apenas queria expulsar
os judeus e não pretendia fazer o Holocausto. O presidente da Turquia já havia
comparado Netanyahu a Hitler e, não teve a mesma resposta irada dada a fala de
Lula. É que Netanyahu sabe que a posição do Brasil perante o mundo e a fala de
Lula tem um grande peso internacional, capaz de constranger as lideranças do
mundo desenvolvido, tirando-as da omissão covarde ante o genocídio contra a
população palestina em que se encontram.
Reafirmo o que disse em meu artigo, essa liderança
sionista de Israel é o principal entrave para a paz na palestina, pois, jamais
permitirá a criação do Estado Palestino independente, afinal os sionistas
anseiam pela criação do Grande Israel (Eretz Israel) e, para isso é necessária
a ampliação das fronteiras até alcançar os limites históricos e bíblicos. Para
atingir tal objetivo, muitas guerras para ampliação do território e de limpeza
étnica serão promovidas. Aproveito o ensejo, para explicar o subtítulo do artigo
científico que produzi, "[...] do holocausto judeu ao holocausto palestino",
afinal, alguém disse "vivemos um tempo em que afirmar o óbvio é necessário"!
Estudioso da questão, jamais quis comparar a magnitude do holocausto judeu ao
genocídio praticado sistematicamente desde 1948 e, mais especificamente após
1967 contra o povo palestino, mas, chamar a atenção para a natureza que é a
mesma, uma guerra de limpeza étnica, de genocídio.
A ONU e as
lideranças internacionais não podem ficar omissas ante o genocídio contra a
população palestina, nem por simpatias religiosas ou ideológicas, nem mesmo por
conveniências estratégicas. A sociedade mundial não pode se furtar ao dever
moral e humanitário de chamar as lideranças israelenses à razão, pois Israel
rapidamente está se convertendo em um Estado pária. Vidas palestinas importam!