A obra conta a história de vida da jovem síria Doaa Al
Zamel e de sua família e todas as dificuldades resultantes da eclosão da guerra
civil síria que faz parte da série de eventos semelhantes que ficaram conhecidas
como "Primavera Árabe". Em tal ocasião, a população saiu às ruas
incitada e organizada por lideranças que
por meio das redes sociais tinham como objetivo exigir democracia,
liberdade e respeito aos direitos civis. Os protestos, tal como peças de dominó
enfileiradas foram se sucedendo no norte da África desde a Tunísia e atingindo
países como a Líbia, o Egito e, claro, a Síria (Oriente Médio). O povo,
obviamente clamava por direitos inalienáveis, afinal, na região haviam
ditadores que se perpetuavam no poder desde o período conhecido como Guerra
Fria (1945-1991). Não há que se criticar a justeza da reivindicação popular,
mas, há importantes estudos que demonstram que o descontentamento popular foi
turbinado a partir do exterior por meio da Internet (redes sociais) por agentes
e programas de inteligência artificial de agências de inteligência de potências
estrangeiras com uma estratégia de desestabilização política conhecida como
guerra híbrida.
A guerra híbrida é uma modalidade de soft power (poder
suave) cada vez mais utilizada por potências como os Estados Unidos da América com
o fim de derrubar governantes não alinhados com Washington. O hard power (poder
duro) somente é utilizado quando as opções não militares fracassam. Outras
opções do soft power são os embargos (econômicos/tecnológicos) e sanções
econômicas e o isolamento diplomático. A Síria é alvo de grande interesse
geoestratégico por ser um importante aliada da Rússia e do Irã. Derrubar o
presidente sírio Bashar Al Assad e colocar um governo palatável aos Estados
Unidos, à Europa/França e a Israel, isolando o país persa e enfraquecendo o
poder da Rússia no Oriente Médio seria algo maravilhoso para as potências
citadas. Além disso, se poderia cruzar o país com gasodutos para a Europa
reduzindo a dependência do gás russo. Enfim, não faltam motivos para os Estados
Unidos e a Europa com seus "ideais altruístas" desejarem levar a
democracia para a Síria.
É dentro dessa trama geopolítica que ocorre a história de
Doaa Al Zamel, cuja qualidade de vida da família despenca conforme a guerra
civil síria se desenrola. O governo sírio faz forte repressão à população que
adere aos protestos e grupos armados locais combatem as tropas governamentais. Aproveitando-se
da instabilidade política síria, o grupo terrorista Estado Islâmico também entra
no conflito com o objetivo de conquistar o país ou parte dele. Os bombardeios
realizados pelas potências envolvidas (EUA, França e Rússia) e os confrontos
nas ruas por diferentes facções e a destruição da infra-estrutura do país, leva
a família de Doaa a fugir para o Egito, onde inicialmente foram bem recebidos, porém,
logo passaram a ser hostilizados. Doaa resiste, mas é convencida pela família a
tornar-se noiva de Bassem, um jovem sírio (que ganhou as graças da família) por
ela apaixonado. Logo ela se vê correspondendo ao rapaz que a convence a ir para
a Europa, devido às dificuldades da vida no Egito. Pagam contrabandistas para
que os levem à Europa, sendo que várias tentativas são frustradas ainda em
terra, nas quais se vêm em perigo, sendo inclusive presos.
A propaganda de um
barco em boas condições é enganosa. Quinhentas pessoas vão empilhadas. Após
vários reveses, quando se encontravam a menos de um dia de aportar na Europa,
traficantes de outro barco abalroam propositalmente o barco de Doaa causando
seu afundamento. Doaa ouviu os traficantes rindo e desejando que os peixes
devorassem a carne dos náufragos. Centenas de pessoas morrem afogadas, outras
tantas se agarram a bóias e destroços. Doaa sobrevive numa bóia durante quatro
dias e quatro noites (em meio a cadáveres estufados) segurando duas bebês
(Malek e Masa) cujas mães morreram. Um navio cargueiro japonês faz o salvamento
dela, das bebês e de algumas poucas pessoas que sobreviveram levando-os à
Grécia. A pequena Malek não sobrevive. Doaa é aceita como refugiada na Suécia (para
onde o casal de noivos pretendia se dirigir) e consegue a permissão de levar
sua família (pais e irmãs). Doaa que viu seu noivo morrer no mar, diz ter
sobrevivido porque dela dependia a vida das bebês. Ela já foi a vários
programas de TV nos quais afirma sempre que as pessoas deixam seu país de
origem por não ter outra opção. História real, triste e comovente! De grande
valia para que as pessoas tenham mais empatia e combatam a xenofobia!
Sugestão
de boa leitura:
Título: Uma esperança mais
forte que o mar.
Autor: Melissa Fleming.
Editora: Rocco, 2017, 1ª edição, 272 pág.
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