Este é o primeiro artigo do corrente ano.
Impossível começar o novo ano sem fazer breves reflexões sobre o ano que
passou. Neste espaço muito já falamos que as pessoas desejam sempre um ano
melhor, porém, raramente fazem as necessárias mudanças em suas práticas diárias
para que ele ocorra. Também já comentamos sobre a visão do intelectual
socialista italiano Antonio Gramsci (1891-1937) que considerava a passagem do
ano um engodo, uma forma do capitalismo renovar a esperança dos trabalhadores
que, a despeito da miséria, da exploração e da opressão sofrida durante todo o
ano que finda, acreditam surrealmente na redenção sem que uma revolução
aconteça. Gramsci, acertadamente afirmava que o sistema não se interrompe e
recomeça a cada novo ano. Os acontecimentos do ano anterior prosseguem
influenciando e determinando o que ocorrerá no ano que começa. Mas, seja ópio
ou não, ver as luzes de natal, a queima de fogos, os cumprimentos de ano novo
entre as pessoas que nos são mais queridas, impossível não se deixar contaminar
pelo clima festivo, embora saibamos que muito provavelmente 2019 repetir-se-á
nos anos seguintes, pois, há condições determinantes que fogem ao nosso
alcance. Podemos mudar atitudes e a forma de encarar obstáculos, mas, haverá
sempre as decisões tomadas nos grandes centros de poder que nos afetarão dada a
nossa condição subalterna característica da classe trabalhadora.
Qual é a melhor forma de iniciarmos o novo ano? Acredito que
esta época deve ser (como é), para muitos, um momento de reflexão sobre a
caminhada realizada no ano que passou, e, se os homens constroem a própria
história não como a desejam, mas, com as condições dadas como nos ensinou Karl
Marx (1818-1883), também é verdade que se por um lado o pessimismo teórico é
inevitável, o otimismo prático deve ser a ferramenta utilizada nos embates
diários ao longo do período que se inicia. Afinal, o que foi a vida das
gerações de trabalhadores que viveram antes da nossa? Uma rotina de exploração,
opressão e condições degradantes de trabalho em meio a relações sociais que
sempre lhes impuseram a humilhação por sua condição social, como se subumanos
fossem, algo que pouco ou nada mudou com o avançar dos séculos. Apesar disso,
os integrantes da classe trabalhadora do passado como da atualidade, nunca
deixaram de perseguir suas utopias. No dizer de Eduardo Galeano (1940-2015), “a
utopia está lá no horizonte. Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois
passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu
caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que
eu não deixe de caminhar”.
A conjuntura política e econômica que hoje se apresenta é
extremamente lesiva aos interesses da classe trabalhadora. Trabalhador que sou,
olho e escrevo tendo como suporte o chão em que piso. Penso ser muito natural
que a leitura de meus artigos ou, a consciência acerca da ideologia que me é
própria, incomode (a nível psicológico) pessoas reacionárias que buscam
conservar seus privilégios quando compartilhamos dos mesmos espaços públicos.
No entanto, surrealmente observo que pessoas mais pobres do que eu também defendem
grupos políticos cujos projetos têm uma forte ênfase em garantir a eternização
dos privilégios de uma minoria que se beneficia do Estado Brasileiro desde os
tempos coloniais. É o famigerado pobre de direita. A desgraça nacional. Afinal,
como nos disse Simone de Beauvoir (1908-1996): “o opressor não seria tão forte
se não houvesse cúmplices entre os oprimidos”.
A esse mesmo respeito, o intelectual e escritor Luis Fernando Veríssimo
questionado sobre se era cansativo ser de esquerda ou se seria mais cansativo
ainda não ser de esquerda, disse: “talvez ingenuamente, eu não entendo como uma
pessoa que enxerga o país à sua volta, vive suas desigualdades sociais e sabe a
causa das suas misérias pode não ser de esquerda. Ser de esquerda não é uma
opção, é uma decorrência. Mas que às vezes desanima, desanima”. Essa fala faz
todo o sentido, afinal somos um país em que as pessoas não sabem o que as
ideologias de esquerda e de direita representam. Assim, muita gente vota em
candidatos e partidos de direita esperando ser atendidos em reivindicações que
constituem a pauta central de preocupações da esquerda e não da direita.
Segundo o intelectual Jessé Souza, somente duas coisas
salvariam o Brasil: consciência de classe e interpretação de texto. É isso que
desejo ao povo brasileiro, pois, a redenção do país não virá de cima, o povo
precisa estar à altura do país que deseja ter. Não dá para esperar de braços
cruzados. É uma construção. Cada um tem que colocar um tijolo. E nenhum prédio
fica em pé sem uma base forte. Que em 2020 continuemos alimentando nossas
utopias! Feliz Ano Novo!
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