Leonardo
Boff afirma: “a águia e a galinha convivem em nós”, afinal, somos águias transformadas
em galinhas e como o meio acaba influenciando nosso comportamento, levamos uma
vida no chão, por que viver “rasteiramente” é normal, e, ser “normal” em nossa
sociedade é ser discreto, passar em brancas nuvens, por que quem abre as asas
incomoda, e ninguém quer alguém diferente por perto. Assim, tal como a águia,
precisamos fazer uma escolha: arriscarmo-nos ao vôo ou vivermos no chão e sermos
sujeitos normais, alienados, massificados, cujas almas foram extorquidas pelo
sistema, pois, já não vivemos, sobrevivemos, já não sonhamos, pois nos tiraram
o direito de alimentar as nossas tão necessárias utopias. Tudo está contra nós,
pois, até entre nós há aqueles que não
alçam vôos e preferem viver uma confortável (ou talvez nem tão confortável
assim) vida de migalhas, e a nos aconselhar a fazermos o mesmo. E aí pensamos:
se eles não conseguiram, quem sou eu para arriscar um vôo mais alto? E ficamos
debicando o milho e aceitando a limitação da galinha! E esperamos por um
“naturalista” que talvez nunca venha para dizer: Ei, você é capaz! Você pode
conquistar muito mais!
Mas uma águia sempre será uma águia e
o coração da águia não aceita viver de migalhas e se o Sol por um breve
instante iluminar seus olhos e houver uma palavra de incentivo, ou mesmo que
esta palavra de incentivo jamais ocorra, a consciência de ser águia impele ao
alto. Lembremo-nos do doloroso processo de renovação da águia, quando por volta
dos 40 anos, suas penas pesadas dificultam o vôo, as garras compridas e
flexíveis não permitem fazer a captura das presas, o bico comprido e curvado a
impede que se alimente, a águia tem então apenas duas opções: morrer ou voar ao
alto de uma montanha, com toda a dificuldade que isto encerra neste momento
delicado de sua vida, para lá arrancar o bico batendo-o contra as pedras,
esperar nascer um novo bico, para então arrancar as unhas e após surgir as
novas unhas, arrancar as penas e quando as novas penas surgem, fazer o vôo de
renovação e viver como se fosse águia jovem por mais 30 anos. Assim, tal como a
águia, precisamos renovarmo-nos e despirmo-nos de tudo aquilo que impede que
levemos uma vida plena.
A quem interessa que levemos uma vida
de galinhas? Certamente ao sistema, pois, uma vez vivendo como águias, seremos mais combativos,
enxergaremos melhor o que se esconde por trás da aparência, não seremos
enganados tão facilmente pela classe política e/ou patronal e lutaremos por
melhores condições de trabalho, pois a águia tem grande autoconfiança e prefere
arriscar-se ao vôo contra a nuvem de tempestade mais escura que se lhe
apresenta, pois sabe que no alto há sempre calmaria. A águia admirada por grupos humanos de diferentes
dimensões espaço-temporais é o maior exemplo para que o ser humano se liberte
das correntes imaginárias que o prendem a uma vida medíocre e lute
incansavelmente por uma sociedade melhor, menos injusta e que a todos
proporcione a dignidade humana.
Que a águia existente em você caro(a)
leitor(a) alce vôo ao céu infinito e pelo seu exemplo liberte outras águias
transformadas em galinhas pelo sistema!
Sugestão de boa leitura:
BOFF,
Leonardo. A águia e a galinha: Uma metáfora da condição humana.
Petrópolis/RJ: Vozes.
BOFF,
Leonardo. O despertar da águia: o
dia-bólico e o sim-bólico na construção da realidade. Petrópolis/RJ: Vozes.
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