O leitor, jovem a mais tempo, certamente conhece a frase que dá título a este artigo, afinal, desde nossa mais tenra infância, ouvimos que o Brasil é o país do futuro. Os mais jovens, a conhecem também, porém, munida de um complemento: Brasil: o país do futuro... "que nunca chega". Essa frase que virou quase que um sobrenome do Brasil, foi cunhada pelo escritor, romancista, poeta, dramaturgo, jornalista e biógrafo austríaco de origem judaica Stefan Zweig (1881-1942). (Wikipedia)
Stefan Zweig foi um renomado escritor de classe internacional,
sendo em sua época, aquele cujas obras eram as mais publicadas e traduzidas e,
como tal, viajava o mundo dando palestras e lançando seus livros. A paixão que
tinha pela literatura e seu hábito cosmopolita tornavam seu trabalho mais
fácil. Passava longos tempos fora de casa e aprendia muito com cada nova
cultura que conhecia. Esteve na América do Sul por três vezes, sendo que em
1936, quando estava a caminho de Buenos Aires, fez uma visita ao Brasil e foi
recebido pelo então presidente Getúlio Vargas. Em 1941, ele e sua esposa
Charlotte resolveram se instalar no Brasil para se manterem distantes do palco
da guerra que consumia a Europa que tanto amava. Stefan Zweig havia prometido
que escreveria um livro sobre o Brasil e anunciou que sua vinda ao país, tinha
também esse propósito.
Ao lermos a obra "Brasil: um país do futuro",
nos questionamos se ela é o resultado de uma visão superficial de um país que
nada tinha de paraíso ou modelo para o mundo no que tange às relações sociais
ou tentativa de agradar o presidente Getúlio Vargas, país no qual ele estava se
exilando e buscando conquistar o visto de residência. Pode-se alegar que Zweig
era grande demais para escrever um livro meramente propagandístico para o
Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) da ditadura Vargas (1930-1945),
contudo, há registros de viagens feitas pelo escritor pelo país e que foram
pagas pelo governo federal. No entanto, há cópias dos contratos que fez com as
editoras para a venda dos direitos de sua obra, na qual foi adequadamente
remunerado. Ao ler temos a impressão que em alguns momentos ele passa pano para
a ditadura brasileira quando a compara com aquilo que ocorria na Europa, mas,
obviamente o grau de ódio racial e violência no velho continente era
incomparável.
É importante lembrar que o autor teve grande parte de sua
vida atribulada pelos conflitos que varriam a Europa, sendo a Primeira Guerra
Mundial (1914-1918) e Segunda Guerra Mundial (1939-1945), sendo que esta última
foi o motivo que o levou a suicidar-se juntamente com sua esposa em Petrópolis
no ano de 1942, seis dias após submarinos alemães atacarem e afundarem navios
brasileiros em nossa costa, como se constata no trecho de sua nota de
despedida: "Deixo saudações a todos os meus amigos: talvez vivam para ver
nascer o sol depois desta longa noite. Eu, mais impaciente, vou embora antes
deles". Zweig, ao vir para o Brasil, já se encontrava deprimido, era um
crítico do materialismo estadunidense, havia se decepcionado com a União das
Repúblicas Socialistas Soviéticas e estava horrorizado com o terror racial
nazista. Tinha no Brasil e na América do Sul, a sua esperança de um novo
amanhã, do nascer de uma nova civilização.
A desesperança de Stefan Zweig, com a Europa, na qual a
guerra vitimara muitos de seus notórios amigos (intelectuais, literatos, etc.),
talvez tenha levado o autor a ter uma esperança no Brasil que beirava à utopia.
Zweig projetou mentalmente um Brasil em que as favelas não mais existiriam,
pois a miséria seria combatida e, pensou que a miscigenação de nossa sociedade
tinha condições de impedir o avanço do ódio racial que viu se agigantar na
Europa. Talvez por isto, tenha exagerado na louvação a um país que sempre
esteve entre os mais desiguais do mundo, que aceita facilmente o progresso
técnico, mas refuta governos e iniciativas de reformas sociais, de redução da
desigualdade social e, sabemos, nenhum país progride sem o combate à miséria,
sem políticas de distribuição de renda e de eliminação dos privilégios
hereditariamente obtidos.
A imprensa, censurada por Vargas, não podia criticar o
governo como gostaria, mas, nada a impedia de criticar a obra do famoso autor
que escrevera um livro de louvação ao país. O linchamento da obra de Zweig foi
diária e brutal com artigos ácidos escritos sobre "um estrangeiro que não
entendia nada do país", mas, que denotava a ânsia da imprensa em poder
mirar Vargas, algo totalmente inalcançável naquele momento, dada a repressão
oficial. Há quem veja na reação dos jornalistas e intelectuais brasileiros, uma
atitude provinciana, em não reconhecer a opinião de um estrangeiro, mesmo sendo
este, o renomado e mundialmente aclamado Stefan Zweig.
Também não podemos criticar Zweig, quanto a "ingenuidade"
com que olhou para a nossa sociedade, afinal, foi preciso que governantes e
governos que ousassem mexer no status quo do "eterno fazendão governado a
partir da Casa Grande" se instalassem no poder, para que o que há de mais
reacionário, odioso e violento mostrasse a sua cara e, enfim realmente
conhecêssemos o nosso vizinho, o nosso amigo, o nosso parente.
Não devemos descrer da utopia de sermos um país com um
grande futuro, mas, para isso precisamos cortar o que nos prende ao passado, à
colonização imperialista, à escravidão, ao genocídio, às sesmarias, à política
de branqueamento (do topo da pirâmide social), ao fascismo. Na atualidade, ver
o Brasil, como um país do futuro, soa à utopia, mas, de que vale viver, sem ter
uma utopia?
Sugestão
de boa leitura:
Título: Brasil: um país do futuro.
Autor: Stefan Zweig.
Editora: L&PM, 2008, 264 pág.
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