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domingo, 16 de julho de 2023

O beijo no asfalto

 


Nelson Falcão Rodrigues (1912-1980) foi um escritor, jornalista, romancista, teatrólogo, contista e cronista de costumes e de futebol brasileiro. É considerado o mais influente dramaturgo do Brasil. Nascido no Recife (PE), mudou-se em 1916 para a cidade do Rio de Janeiro. Foi repórter policial durante longos anos, de onde acumulou uma vasta experiência para escrever suas peças a respeito da sociedade. Sua primeira peça foi "A mulher sem pecado" (1941), que lhe deu os primeiros sinais de prestígio dentro do cenário teatral. O sucesso veio com "Vestido de noiva" (1943), que trazia, em matéria de teatro, uma renovação nunca vista nos palcos brasileiros. Com seus três planos simultâneos (realidade, memória e alucinação construíam a história da protagonista Alaíde), as inovações estéticas da peça iniciaram o processo de modernização do teatro brasileiro. A consagração se seguiria com vários outros sucessos, transformando-o no maior dramaturgo brasileiro do século XX, apesar de suas obras terem sido, quando lançadas, tachadas por críticos como obscenas, imorais e vulgares. Politicamente, gostava de se intitular como um reacionário. Chegou a apoiar o regime militar, posicionamento que revisou quando seu filho Nelsinho foi preso e torturado, tendo então militado pela anistia ampla, geral e irrestrita aos presos políticos. (Fonte: Wikipedia)     

            Neste espaço, várias vezes nos referimos a Nelson Rodrigues, principalmente quanto aos conceitos de Narciso às avessas e Complexo de vira-latas que o dramaturgo afirmava que o brasileiro médio era portador. Apesar de muito ter lido e assistido sobre Nelson Rodrigues, somente agora li na íntegra uma obra sua, trata-se de "O beijo no asfalto". A referida peça foi encomendada a Nelson Rodrigues pela brilhante atriz Fernanda Montenegro que desejava encenar no teatro alguma criação do famoso dramaturgo, fato que aconteceu em 1961. Nelson Rodrigues costumava escrever sobre o cidadão médio, aquele que tinha uma vida comum, mas nele buscava desvendar suas contradições ante a hipócrita moralidade coletiva. É dessa forma que se desenvolve a trama de "O beijo no asfalto", nela Aprígio (o sogro) e Arandir (o genro) caminham até a Caixa Econômica Federal na intenção de obter um  empréstimo para o marido de sua filha. Momento em que presenciam um acidente que ocorre muito próximo a eles. Um rapaz que caminhava no meio-fio tropeça e cai na rua, uma lotação não consegue parar e o atropela.

            Arandir que estava muito próximo, levanta a cabeça do rapaz moribundo e beija-o na boca. Ante a circulação normal de pedestres e motoristas pelo local, o acidente e a cena insólita do beijo, deixam atônitas as pessoas presentes no local que não compreendem a reação de Arandir. Amado, um jornalista conhecido pelo sensacionalismo de suas matérias, pouco ligadas à realidade dos fatos, e que passava pelo local presenciou a cena. O jornalista vê nela uma oportunidade de vender mais jornais e começa a levantar hipóteses desvirtuando a realidade do fato observado. Nesse mesmo sentido, a polícia conduz a investigação e interroga Arandir. Tanto o delegado Cunha, como o jornalista, lançam suspeição sobre Arandir. Arandir e a vítima eram desconhecidos (como afirma Arandir)? Os dois rapazes, embora casados, eram amantes? Arandir teria arremessado a vítima, que caiu e, assim foi atropelada pela lotação?

            Aprígio conta o fato ocorrido para a bela filha Selminha (esposa de Arandir) e também para Dália, a filha mais nova. Aprígio é viúvo e, após a morte da esposa, jamais se casou. A versão contada por Aprígio é, segundo o próprio, tal como ele viu. As duas irmãs não concordam com a narrativa do pai. As irmãs afirmam que os comentários raivosos do pai se deve ao ciúme que tem de Selminha, pois era contra o casamento, prova disso é que ao se referir a Arandir chama ele de "genro" ou "seu marido" (para Selminha). Selminha afirma que o marido é muito homem (a procura muito) e que a prova disso é a sua gravidez. Dália concorda e diz que se a irmã não houvesse se casado com Arandir ela faria isso. Aprígio afirma que há homens que tal como as lâminas, cortam dos dois lados. Selminha conta ao pai que Arandir (não intencionalmente) viu Dália nua e que sentiu atração, mas, contou para ela de forma a não haver mal entendido. Seu marido era muito homem e também um marido fiel. E que acredita que o ato do marido foi genuinamente humano, beijar alguém que estava morrendo.

            A escalada de desinformação promovida pelas matérias de capa do jornal sensacionalista torna a vida da família um inferno. Arandir é solto e, novamente procurado, ninguém sabe seu paradeiro. Selminha é conduzida para interrogatório numa casa determinada pelo delegado Cunha (procedimento incomum). Selminha é interrogada e por afirmar não saber o paradeiro de Arandir (estava escondido na casa) e por não dar as respostas (certas), ou seja, aquelas que confirmavam a hipótese do delegado é colocada nua visando quebrar seu moral e resistência. Selminha é libertada e conta a Dália a humilhação que passou, pois foi colocada nua pelo delegado. O jornalista vai ao encontro de Aprígio em busca de novas informações e dá a ele a sua opinião. Amado afirma que fosse ele o sogro, daria uns tiros no genro que não apenas desonrou o casamento com sua filha, mas o nome da família. Aprígio pergunta ao jornalista por que ele está dizendo isso, se ele quer mais sangue para vender ainda mais jornal. Paro aqui para não dar spoiler. Fica a dica!

Sugestão de boa leitura:

Título: O melhor de Nelson Rodrigues: teatro, contos e crônicas.

Autor: Nelson Rodrigues.

Editora: Nova Fronteira, 2018, 240 pág.

 

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