No inicio de seu mandato, mais especificamente em seu discurso de posse, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que com sua posse, o povo brasileiro seria libertado do socialismo e do politicamente correto. Libertar o povo do socialismo é algo no mínimo cômico, afinal, quando foi, em que momento da história nacional, o Brasil foi socialista? O socialismo é um sistema socioeconômico que tem como principal característica a supressão da propriedade privada dos meios de produção (fazendas, bancos, indústrias, etc.). Isso nunca ocorreu no Brasil, portanto, jamais houve socialismo. Ao escrever estas linhas, me vejo obrigado a afirmar obviedades, mas, vivemos uma triste e obscura época em que afirmar o óbvio é uma necessidade premente. A chamada "constituição comunista", ou seja, a Constituição Federal (1988) apenas procurou garantir o atendimento a demandas estancadas da sociedade pela ditadura militar (1964-85).
A "constituição cidadã" como chamada por Ulisses
Guimarães (1916-92) procurava implantar no Brasil um Estado de Bem-Estar Social
(social-democracia) oferecendo à população, em sua maioria pobre, a gratuidade
do acesso à educação pública (das séries iniciais à Universidade), ao
atendimento médico-hospitalar (SUS), à aposentadoria pública (garantida pelo
Estado), quem já se informou sobre os problemas que o sistema privado chileno
trouxe aos cidadãos daquele país sabe do que estou falando. O Brasil é talvez o
único país do mundo onde o pobre que não pode pagar pelos serviços atualmente
prestados pelo Estado (educação, saúde, previdência social, etc.) defende sua
total privatização. Na Europa, a classe média se opõe à elite econômica (do
patrimônio), pois sabe que esta ao fim e ao cabo defende ideais quanto ao papel
do Estado que lhes são prejudiciais. No Brasil, há o pobre de direita, que
apesar de fazer parte da classe trabalhadora e de não possuir fazendas, bancos,
indústrias, etc. se une à elite patrimonial do país, porém, enquanto esta
defende seus privilégios históricos, o pobre de direita (a classe média)
conserva a sua pobreza.
É com grande exasperação que assisto o Ministro da
Economia Paulo Guedes reclamar do aumento da expectativa de vida da população
brasileira, algo que seria comemorado por qualquer governo sensato e com senso
humanitário. Guedes que já criticou o governo Lula (2003-2010) no qual, segundo
ele, a empregada doméstica teria ido até para a Disneylândia, por conta do
aumento do poder aquisitivo da classe trabalhadora no período, voltou à carga e
criticou o fato de que o FIES financiou até a entrada do filho do porteiro na Universidade,
evidenciando pensar que Universidade não é lugar de pobre. Guedes, como
"Chicago boy" que é, parece não se conformar com a utilização de
recursos públicos para a manutenção de Universidades públicas e para o ingresso
de filhos de trabalhadores na formação superior, afinal, Universidade é local
onde se formam pensadores e, gente que pensa (sobretudo das classes populares),
incomoda os conservadores. Sobre a crise econômica agravada pela pandemia,
Guedes disse que o Governo Federal devia ajudar as grandes empresas, pois,
colocar recursos públicos nas empresas pequenininhas seria perder dinheiro.
Ora, são estas as mais frágeis e as que mais oferecem empregos segundo o CAGED.
Nessa fala Guedes demonstra que sua ação não é pautada em princípios de Estado
e de administração racional, mas, de ideologia de classe, a classe dos
super-ricos, do grande capital. Quanto aos funcionários públicos, disse serem
parasitas, ou seja, sugam os recursos do Estado e nada oferecem em troca. Nesta
fala, Guedes busca convencer a população de que serviços públicos não devem ser
ofertados de forma pública e gratuita, dessa forma, prega o Estado Mínimo, mas,
omite que o objetivo é colocar o Estado e seus recursos financeiros a serviço
exclusivo dos super ricos, do rentismo (do qual ele faz parte).
Bolsonaro, por meio de suas falas absurdas, joga cortinas
de fumaça para desviar a atenção do povo, enquanto seu governo é extremamente
eficiente em esquartejar o patrimônio nacional e o entregar na bandeja para o grande
capital nacional e estrangeiro. Sua retórica carregada de preconceitos, ódio e
pouca ou nenhuma racionalidade mantém fiel seu eleitorado formado por conservadores
privilegiados, liberais fanáticos e trabalhadores analfabetos políticos. O
bolsonarismo revelou ao mundo a face oculta do povo brasileiro que intelectuais
ao criar o mito fundador nacional, tentaram esconder. O bolsonarismo é anterior
a Bolsonaro.
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