sábado, 2 de agosto de 2014
Ariano Suassuna um brasileiro!
Na última semana a humanidade perdeu um ser iluminado Ariano Suassuna (16/06/1927– 23/07/2014) que dispensa qualquer apresentação e que é lembrado menos por ser membro da Academia Brasileira de Letras e de seus títulos Doutor Honoris Causa, mas, principalmente por ser o autor de o “Auto da Compadecida” dos inesquecíveis personagens João Grilo representado por Matheus Nachtergaelle e Chicó (Selton Mello) em minissérie da Rede Globo que contou com um elenco de grandes estrelas. Escrevo neste espaço há seis anos e sempre foi meu propósito inarredável de que tudo o que aqui postasse fosse algo resultante da minha reflexão sobre a contribuição de outros autores/pensadores e/ou criação própria, mas, como aprendemos na escola que “para toda a regra existe a exceção” resolvi quebrar meu intento original e partilhar um texto do inesquecível e imortal Ariano Suassuna. O texto ora partilhado é semelhante a uma ideia que anotei há alguns anos para um dia escrever e que na ocasião de sua passagem para a eternidade ao aprofundar as leituras sobre artigos publicados e entrevistas por ele dadas constatei que Ariano já havia escrito sobre o tema com uma abordagem condizente com o que pretendia, mas, com o aprofundamento e brilhantismo que lhe era característico e que eu jamais alcançaria lograr. Nada mais há para ser dito, o texto de Ariano Suassuna é irretocável bem como sua obra. Ariano Suassuna não pode ser ressuscitado pela flauta de João Grilo, porém, sempre que alguém tocar uma flauta vai trazer mais próxima a sua luz para iluminar as mentes e os corações desse povo tão especial e sofrido que é o brasileiro, principalmente, o pobre.
Esquerda e Direita - Por Ariano Suassuna
Não concordo com a afirmação, hoje muito comum, de que não mais existe esquerda e direita. Acho até que quem diz isso normalmente é de direita. Talvez eu pense assim porque mantenho, ainda hoje, uma visão religiosa do mundo e do homem, visão que, muito moço, alguns mestres me ajudaram a encontrar. Entre eles, talvez os mais importantes tenham sido Dostoievski e aquela grande mulher que foi Santa Teresa de Ávila. Como consequência, também minha visão política tem substrato religioso.
Olhando para o futuro, acredito que enquanto houver um desvalido, enquanto perdurar a injustiça com os infortunados de qualquer natureza teremos que pensar e repensar a história em termos de esquerda e direita. Temos também que olhar para trás e constatar que Herodes e Pilatos eram de direita, enquanto o Cristo e são João Batista eram de esquerda. Judas inicialmente era da esquerda. Traiu e passou para o outro lado: o de Barrabás, aquele criminoso que, com apoio da direita e do povo por ela enganado, na primeira grande “assembleia geral” da história moderna, ganhou contra o Cristo uma eleição decisiva.
De esquerda eram também os apóstolos que estabeleceram a primeira comunidade cristã, em bases muito parecidas com as do pré-socialismo organizado em Canudos por Antônio Conselheiro. Para demonstrar isso, basta comparar o texto de são Lucas, nos “Atos dos Apóstolos”, com o de Euclydes da Cunha em “Os Sertões”. Escreve o primeiro: “Ninguém considerava exclusivamente seu o que possuía, mas tudo entre eles era comum. Não havia entre eles necessitado algum. Os que possuíam terras e casas vendiam-nas, traziam os valores das vendas e os depunham aos pés dos apóstolos. Distribuía-se, então, a cada um, segundo a sua necessidade”. Afirma o segundo, sobre o pré-socialismo dos seguidores de Antônio Conselheiro: “A propriedade tornou-se-lhes uma forma exagerada do coletivismo tribal dos beduínos: apropriação pessoal apenas de objetos móveis e das casas, comunidade absoluta da terra, das pastagens, dos rebanhos e dos escassos produtos das culturas, cujos donos recebiam exígua quota parte, revertendo o resto para a companhia” (isto é, para a comunidade).
Concluo recordando que, no Brasil atual, outra maneira fácil de manter clara a distinção é a seguinte: quem é de esquerda, luta para manter a soberania nacional e é socialista; quem é de direita, é entreguista e capitalista. Quem, na sua visão do social, coloca a ênfase na justiça, é de esquerda. Quem a coloca na eficácia e no lucro é de direita.
Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/A-esquerda-e-a-direita-segundo-Ariano-Suassuna/4/31455 - Acesso em 27 de Julho de 2014.
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