quinta-feira, 27 de março de 2014
Uma ferida que nunca cicatriza
No dia 22 de março houve nas capitais brasileiras uma tentativa de reeditar a marcha da família com Deus pela liberdade a qual originalmente foi levada a cabo no ano de 1964 e de cuja participação boa parte das pessoas se arrependeu, pois, embora não tivessem a intenção contribuíram para chocar o ovo da serpente, ou seja, deram suporte à implantação do regime sanguinário que se instalou no país no dia 01 de abril de 1964. Naquele tempo, a Guerra Fria estava em seu auge, e a estratégia da extrema direita era amedrontar a população usando o senso comum para convencer dos riscos da “ameaça comunista”. Hoje, sabe-se que a Igreja apoiou fortemente o golpe militar e que houve religiosos cooptados pela Central de Inteligência Americana (CIA) para desempenhar o importante papel de levar o povo às manifestações em apoio aos militares e opondo-se ao governo democraticamente eleito de João Goulart que sucedeu o renunciante Janio Quadros.
A verdade é que desde o tempo de Getúlio Vargas, os militares golpistas espreitavam o Poder, o suicídio de Getúlio adiou a sanha golpista, mas não a impediu. Os Estados Unidos da América não gostavam de ver o Brasil governado por líderes esquerdistas e temiam que a União soviética exercesse influência nos destinos do país e após a derrota que sofreram em Cuba (1959) não hesitaram em colocar sua esquadra no mar territorial brasileiro, pois, na eventualidade de que os militares amotinados não obtivessem êxito na execução do golpe o braço armado de “Tio Sam” invadiria o país para completar o serviço, no entanto, a não resistência do Presidente João Goulart para evitar um banho de sangue tornou as coisas mais fáceis para os golpistas e para “Tio Sam” que tratou de disfarçar as evidências que tinha contra si, mas o banho de sangue foi apenas postergado, pois, instalou-se no país uma ditadura que acabou com as liberdades civis na qual, políticos progressistas, professores, estudantes, artistas e intelectuais que defendiam a democracia passaram a ser perseguidos e milhares foram presos, torturados e mortos.
É uma ingenuidade pensar que o golpe se deu unicamente pelo medo da implantação de um regime socialista no país, pois, pesquisas mostraram que embora Jango tivesse a pretensão de fazer as famosas reformas de base, até hoje não realizadas, os verdadeiros motivos eram o tabuleiro de xadrez jogado por Estados Unidos e União Soviética na disputa da hegemonia mundial e os interesses econômicos estadunidenses contrariados pelo governo nacionalista de Jango, e principalmente a estreita amizade entre os militares brasileiros e estadunidenses cujos laços atados por ocasião da Segunda Guerra Mundial permitiram uma conversa franca e sem rodeios sobre qualquer tema, inclusive, o oferecimento de certas vantagens para alguns personagens militares de alto escalão. Sim, malas de dólares foram entregues para alguns líderes militares, que ao se venderem, venderam também o futuro do país. A direita representante da classe social privilegiada não apenas apoiou o golpe, como atuou para que ele ocorresse, pois, não admitia reformas que acabassem com os privilégios da minoria que representavam em benefício da população de maioria pobre.
A marcha de 22 de março de 2014 foi um fiasco, mas a vergonha não é pela pouca adesão ao movimento que pedia o retorno da ditadura militar, mas pelo fato de que em pleno século XXI existam pessoas com um pensamento tão retrógrado, alienado, fascista e sem nenhum senso de justiça social e com um total desconhecimento da história nacional que não a contada por aqueles que defendiam o regime e dele se beneficiaram, sejam políticos da direita, empresários e mesmo alguns jornalistas que hoje atuam na Grande Mídia (Redes de TV e grandes jornais e revistas) que insolentes chamam a ditadura de “ditabranda”, pois é próprio de pessoas fascistas além da desqualificação de quem pensa diferente jamais reconhecer erros cometidos. A ditadura militar infligiu na alma do povo brasileiro uma ferida que nunca cicatriza.
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