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sábado, 14 de junho de 2025

A Educação e a Saúde e a saúde da Educação - Parte 1

 

             Há alguns dias, assisti um vídeo no Youtube, no qual um médico psiquiatra, chamava a atenção para a "insanidade" do sistema educacional. Ele comparava seus pacientes com os estudantes e afirmava que jamais conseguiria atender vários pacientes ao mesmo tempo como o fazem os professores, visto que as especificidades de cada paciente exigem atendimento individual, da mesma forma deveria ser com os estudantes que, no entanto estudam em classes que contam trinta  a quarenta estudantes e são atendidos por apenas um professor.

            Dadas as especificidades (psicológicas, cognitivas e sociais) de cada estudante, o professor deve lecionar aulas que alcancem a todos os estudantes (uma missão impossível, se nos desfizermos da hipocrisia e/ou da ingenuidade, que costuma caracterizar as ações de planejamento e gestão da educação). Dessa forma, temos profissionais que de forma submissa (via opressão) aceitam tacitamente ordens superiores, escritas no papel que tudo aceita (dos decretos, resoluções ou livros), mas, sem os "pés no chão da escola". O professor que ousa, do alto de sua experiência do "chão da escola" afirmar que determinada teoria/metodologia/política educacional não funciona, é taxado como "tradicional", "resistente a mudanças" ou "ultrapassado". A hipocrisia é companheira de fé das autoridades políticas que possuem o estranho, mas, costumeiro hábito contraproducente de jamais escutar professores e estudantes e, assim formular Políticas de Governo para a Educação desprovidas dos referidos "pés no chão da escola".

            Voltando ao vídeo do médico, este afirmou que uma classe jamais deveria ter mais de quinze estudantes. Sendo que, cada classe, deveria ter no máximo um destes, avaliado com necessidades especiais, para que o professor pudesse desenvolver um trabalho minimamente razoável. A realidade das salas de aulas, mostram classes com 30 alunos ou mais e com cinco a seis estudantes com necessidades especiais em cada turma.

            Também li na Internet, uma reflexão que considerei muito verdadeira. Novamente, a comparação era com o médico e afirmava o seguinte: "Se um médico receita alimentação moderada e saudável, prática rotineira de exercícios físicos e a ingestão de remédios específicos, caso o paciente não cumpra as orientações médicas e, permaneça doente ou seu estado de saúde agrave devido sua atitude relapsa, a culpa pode ser atribuída ao médico? Obviamente que não! E por que, no caso do professor, quando ele orienta ao estudante: "Preste atenção nas aulas, faça as tarefas e trabalhos e estude para as provas" e o estudante descumpre parcial ou integralmente as orientações, a culpa é atribuída ao professor?

            Tanto o médico, como o professor, auxiliam respectivamente o paciente e o estudante, mas estes últimos precisam fazer sua parte. Em ambos, os casos, mudar atitudes e estilos de vida pode se fazer necessário, inclusive a participação ativa da família, dando todo o suporte a ambos, é crucial. Penso que falta "pés no chão da escola" por parte de autoridades políticas, da família, da sociedade e, de muitos "educadores de gabinete", que elaboram belíssimas teorias educacionais que mais se parecem com belíssimos arranha-céus, porém, sem fundação, desabam ante a realidade da sala de aula.     

sábado, 7 de junho de 2025

Judas, o obscuro (com spoiler)

 

Inicio estas linhas perguntando como vai sua saúde mental, espero que esteja bem, se não for o caso, desaconselho a continuar a leitura desse artigo e,  obviamente do livro que aqui resenho. Judas, o obscuro é um livro, cuja escrita não possui filtros, é sombrio e severamente pessimista quanto à existência humana do dito cidadão comum, trabalhador, enfim, pobre.

            A palavra obscuro, cujo significado, é sem luz; que não está claro para o espírito; que é difícil de compreender, de explicar;  já traz o spoiler definitivo sobre a personagem principal desta obra do escritor e poeta inglês Thomas Hardy (1840-1928). Judas, o obscuro foi publicado originalmente em 1895, sendo seu último romance, tendo depois se dedicado unicamente às poesias, devido às enormes críticas que a obra suscitou.

            É importante lembrar que a publicação se deu na Era Vitoriana (1837-1901), cujo conservadorismo exacerbado, obviamente não receberia bem um livro que, apesar de muito bem escrito, tece fortes críticas à Igreja, ao casamento, à desigualdade social e à sociedade da época. O livro questiona também a pseudomeritocracia que impede a inclusão de jovens pobres que vêem seus sonhos se desfazerem e o moralismo que discrimina toda pessoa que pensa e age diferentemente do padrão traçado pela Igreja.

            A obra tem como personagem principal, o órfão Judas Fawley, cujo casamento dos pais (primos) dera errado. Foi criado pela tia (solteira convicta) em Marygreen. Judas, era pobre, mas tinha grande admiração pelo professor Richard Pilotson, que tinha a ambição de se tornar clérigo e professor universitário e, para isso, optou por se mudar para Christminster, uma cidade universitária.

            Judas sempre recebeu muito estímulo do professor e, inclusive livros para seu enriquecimento cultural. Pobre, trabalhava o dia todo como pedreiro e, à noite, à luz de velas, estudava até altas horas da madrugada, pois ambicionava estudar na Universidade, ser um homem erudito e, para isso pretendia mudar-se para Christminster.

            Seu destino muda quando, conhece a belíssima e de índole duvidosa  Arabella Donn, uma moça que mente estar grávida e, Judas, como bom moço, casa-se com ela, apesar de que casamento não estava em seus planos. O casamento fracassa, Judas não consegue dar a ela o padrão de vida que ela desejava e ela lhe conta ter trabalhado em cabarés, mas, "somente servindo bebida" e, que vai embora para a Austrália com a família. Casamento desfeito, mas sem o devido divórcio. Os jovens seguem suas vidas em separado, apesar dos olhares de recriminação da sociedade. Judas volta a perseguir seu objetivo.

            Em Christminster, Judas encontra Sue Bridehead, a bela e jovem prima de que tanto ouviu comentários e por quem se apaixona. Ela realiza alguns trabalhos artísticos para uma loja. Sue é uma mulher a frente de seu tempo, porém, apesar de suas ideias avançadas, não consegue viver em conformidade com seu pensamento devido aos valores arraigados da sociedade de sua época. Judas reencontra o professor Richard (que não se lembra dele), mas que está precisando de um professor assistente. Judas convence Richard a contratar Sue.

            O professor de meia idade se apaixona por Sue e a pede em casamento. Sue aceita o pedido e com ele se casa, para a decepção de Judas. O casamento é um fracasso. Richard apesar de muito relutar, aceita que Sue vá embora. Judas e Sue se envolvem. O casal tem filhos e, Arabella reaparece, solicita o divórcio para poder casar com um homem australiano com quem já vivia maritalmente. Na ocasião lhe conta que estava grávida quando o deixou e que precisa lhe entregar a guarda do filho, pois o marido não aceita a criança, um menino de personalidade melancólica, com pensamentos e falas adultas, que não possui sequer nome (não fora batizado), sendo chamado pelo apelido de "Pequeno Pai do Tempo".

            As dificuldades se somam na vida do casal. Judas, todos os dias, observa a pompa e a vaidade excessiva dos professores universitários e olha o portão da Universidade, que recusou seu ingresso à vida acadêmica devido sua pobreza e origem humilde. Observa os bem nascidos, menos inteligentes do que ele, mas de famílias ricas e tradicionais nela ingressando. Judas encontra dificuldades para conseguir emprego e moradia para alugar, devido viverem juntos sem serem oficialmente casados. Sue não quer o matrimônio oficial devido à tradição de fracasso da família. Sue conta ao menino "Pequeno Pai do Tempo" (do qual cuida como mãe zelosa) que está grávida e, ganha uma bronca dele, pois pobres não têm condições financeiras para ter filhos e se trata de uma irresponsabilidade tê-los.



*Caso tenha interesse em ler a obra e não queira spoiler, esse é o momento de parar a leitura dessa resenha!







           

                À dificuldade de sobrevivência, se soma uma grande tragédia para o casal. Todos os filhos morrem, acontecimento que tem por causa a pobreza, choca até mesmo a conservadora sociedade em que vivem. O filho denominado Pequeno Pai do Tempo, enforca os dois outros filhos (seus meio irmãos) e se enforca em seguida, deixando um bilhete afirmando que fez isso pois "eram muitos demais" e tornavam a pobreza ainda maior para os pais. Sue, tão avançada a seu tempo, crítica das convenções sociais, se convence que estão sendo castigados por Deus e que precisa voltar a viver com o professor Richard para fazer a vontade divina e sugere que Judas deva voltar para Arabella, cujo marido morreu.

            Sue é aceita pelo professor Richard e vive num casamento sem amor, mas consagrado para Deus, dedicando seus dias à oração. Richard saiu da pequena Marygreen com ambições que jamais conseguiu tornar realidade. Não se tornou clérigo e nem professor universitário. No entanto, na qualidade de professor conseguia, sem maiores dificuldades, dar a mera subsistência para Sue. Judas não consegue esquecer Sue e esta lhe diz que nunca irá voltar para ele, apesar de o amar, pois esta não é a vontade de Deus.

            Judas, inversamente a Sue, passou a desacreditar de tudo, da religião, de Deus, da família, afinal, o único parente que lhe dedicou alguma atenção, sua tia que o criou (mesmo a contragosto) morreu. Judas se torna um crítico ácido às convenções sociais. Arabella tenta lhe convencer a se casar novamente com ela, recebendo a negativa. Monta um estratagema com seu pai, o embebeda e casa com ele aproveitando-se de sua embriaguez e melancolia.

            Judas e Arabella voltam para Marygreen. Judas, melancólico, trabalha muito, mas a pobreza não o abandona e, mesmo muito doente (pneumonia) sai em meio a uma fria tempestade noturna (suicídio intencional). Arabella, convidada por jovens rapazes, deixa Judas adoentado na cama e vai a uma festa noturna na qual bebe e se diverte muito. Quando volta encontra Judas morto. Judas é preparado para o velório e, ao vê-lo no caixão, uma senhora que o conhecia, afirma para Arabella que Judas está com uma bela expressão. Arabella que nunca "se emendou" e, para a qual, apenas uma página de sua errática vida está sendo virada, responde que ele é realmente um belo defunto.

Sugestão de boa leitura:

Título: Judas, o obscuro.

Autor: Thomas Hardy

Editora: Sétimo selo, 2022, 432 p.