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segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Girando a chave

 

                Ao iniciar estas linhas, lembro da música "Eu também vou reclamar" de Raul Seixas (1945-1989). Digo isso, porque este espaço não surgiu para tratar apenas de literatura, embora eu tenha grande predileção pelos livros, e sinta uma vontade enorme de compartilhar com vocês leitores, as minhas experiências literárias, leitor inveterado que sou. Doravante, intercalarei artigos de opinião e literatura.

            Inversamente a Raulzito, não posso dizer que sou o primeiro, mas tenho grande responsabilidade em utilizar tinta vermelha, pois sabemos, a disputa pela hegemonia do discurso é também parte da luta de classes. E como nos ensinou Marx, a luta de classes é o motor da história. Roberto Marinho (1904-2003) acertadamente disse: "o maior poder de O Globo está naquilo que ele não publica". Isso vale para toda a mídia. A voz da classe trabalhadora é silenciada, pois ela não tem o mesmo espaço dado aos representantes do grande capital. Num mundo em que a alienação, se faz pelo fetiche da mercadoria e pela falta de acesso à boa e verdadeira informação, e no qual, a média das pessoas, têm diminuta capacidade de raciocínio crítico, quem recebe pouco mais que a média salarial da base da pirâmide socioeconômica brasileira pensa ser magnata.

            Tenho uma camiseta que possui a seguinte frase: "Era tão pobre, mas, tão pobre, que só tinha dinheiro". Essa frase se justifica pelo fato de que, em nosso país, uma grande parcela da burguesia, nada possui além do vil metal, pois é desprovida da luz, do conhecimento. Situação ainda pior é a do pobre de direita, sequer sabe que é pobre, sequer sabe que a direita sempre trabalhou e trabalha para a manutenção dos privilégios de uma minoria, da qual não faz parte. O pobre de direita é no entender de Bertolt Brecht (1898-1956), o analfabeto político. Não entende a política, as suas correntes ideológicas e nem se preocupa em iluminar-se. É eterno refém do grilhão que lhe aprisiona a uma vida medíocre e, para a qual contribui ad eternum.

            Nos últimos dias, vi muitos pobres de direita, gozosos pela posse de Donald Trump na presidência estadunidense. Donald Trump, aquele cidadão ignóbil, asqueroso e arrogante retribuiu a paixão desses "patriotas" afirmando que os Estados Unidos não precisam do Brasil e da América Latina. O que incomoda não é a frase dessa escória humana que atualmente ocupa a Casa Branca, mas a sabujice de parcela de alienados brasileiros. Não é surpresa! Seu "mito", quando ocupava o cargo de presidente do Brasil bateu continência para a bandeira americana. Sabujice e entreguismo capaz de fazer corar de vergonha até mesmo as caveiras dos falecidos generais da ditadura militar (1964-85).

 

sábado, 18 de janeiro de 2025

São Bernardo

 


        É de todos conhecida a expressão "por trás de toda grande fortuna, há um crime" cunhada por Honoré de Balzac (1799-1850). É esse o caso em São Bernardo, publicado em 1934 por Graciliano Ramos (1892-1953). Paulo Honório é a personagem central e narrador da obra São Bernardo. No afã de entender sua própria história de vida, resolve escrever um livro, ele que pouquíssimo estudo tinha e não gostava de ler literatura de ficção. Sua pouca leitura era sobre coisas úteis e práticas no seu entender, principalmente, novas técnicas agrícolas. Capitalista, divide a tarefa da produção do livro com alguns amigos, mas, não gosta do resultado, muito "rococó", quer uma escrita simples, direta e dura como ele.

            Toma para si a tarefa, conta da miséria de sua infância, de ter sido adotado por uma mulher muito pobre e de como amealhou sua fortuna, fazendo as vezes de caixeiro viajante negociando bugigangas, fazendo agiotagem, explorando pessoas em dificuldades financeiras e tomando como garantia imóveis pelo menor preço possível. Dessa forma conseguiu a Fazenda São Bernardo, que desde muito jovem sonhara possuir. Contratou funcionários, era com eles muito rude, humilhava-os, pagava pouco e exigia muito trabalho em troca.

            Transformou a Fazenda São Bernardo numa das mais produtivas da região. Possuía uma disputa de terras com Mendonça, com a morte (suspeita) deste, avançou a cerca sobre as terras de sua viúva. Construiu uma escola e pagava um professor para lecionar aos filhos dos empregados da fazenda, em atendimento ao pedido do governador, afinal, sempre é bom contar com as boas graças dele.

            Muito rico e poderoso, acostumado a resolver no braço (armado ou não) suas querelas, respeitado pelo temor que causava, lhe faltava um herdeiro. Faz suposições comparativas entre as moças disponíveis na região. Ser genro do Juiz poderia lhe ser de utilidade, mas, conhecera a professora Madalena, uma moça de 27 anos, "quase velha para casar",  uma loirinha, pequena, linda, ainda em idade de lhe dar herdeiros. Julga que, para ela, pobre, casar com ele, rico e poderoso, seria um bom negócio. Ambos teriam vantagem com o arranjo. E assim, como negócio fosse, propõe o casamento que ocorre pelo interesse de ambos. O correr dos dias torna o relacionamento difícil, o excessivo materialismo e dureza da personalidade de Paulo Honório na condução da vida e dos negócios é confrontada com o humanismo proletário de Madalena.

Sugestão de boa leitura:

Título: São Bernardo.

Autor: Graciliano Ramos.

Editora: Record, 2019, 288 p.

 

domingo, 12 de janeiro de 2025

Ainda estou aqui

 

♪♪ "Quem não curtiu o Globo de Ouro da Fernandaaa, bom sujeito não ééé...

É ruim da cabeçaaa, ou um doente manééé..." ♫♫♫

             

            Que início de ano maravilhoso, Fernanda Torres ganhou o Globo de Ouro em filmes da categoria drama competindo com atrizes brilhantes. Uma surpresa para o mundo, não para nós brasileiros, que nos acostumamos a assistir a sua versatilidade transitando maravilhosamente no drama ou na comédia.

            Tomei conhecimento do livro "Ainda estou aqui" pela forte repercussão nacional e internacional do filme. A obra trata da vida e da luta de Maria Lucrécia Eunice Beirodt Paiva (Eunice Paiva - 1929-2018) esposa do ex-deputado federal Rubens Paiva (1929-1971). Eunice tinha cinco filhos e levava uma confortável vida em uma família privilegiada há gerações. Rubens Paiva poderia desfrutar de sua excelente condição financeira, mas, pensava muito além do próprio umbigo. Era solidário, ajudava quem era perseguido político a se esconder. Foi descoberto, preso, torturado de forma tão selvagem que morreu no segundo dia de prisão. Tornou-se um desaparecido político.

            Eunice que jamais chorou em público (nem para os filhos), obrigava-os a sorrir para fotografias de reportagens. Formada em Letras, voltou a estudar, fez um curso de Direito e se tornou uma grande advogada militante dos direitos humanos, especializando-se na causa indígena. Ela passou a vida a percorrer os corredores de Brasília e dos Fóruns de Justiça exigindo que o caso Rubens Paiva e similares fossem esclarecidos. A família Paiva passou por dificuldades financeiras, não podia receber o seguro de vida e nem tocar o inventário, pois a ditadura criou um simulacro de que Rubens Paiva teria sido resgatado por "terroristas", para isso militares metralharam o próprio carro e o incendiaram conforme orientações superiores.

            No Governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), o Estado Brasileiro assumiu a culpa pelas mortes de presos políticos na ditadura militar (1964-1985), mas, foi com a Comissão da Verdade, no Governo de Dilma Rousseff (2011-2016), que o caso foi esclarecido e os nomes dos torturadores e assassinos se tornaram conhecidos. Ainda estou aqui, tem um triplo significado, afinal, os militares criminosos jamais pagaram por seus crimes e muitas "Eunices" aguardam justiça para aqueles que ainda estão vivos. O segundo significado é que a ditadura acabou, mas os defensores da democracia exitosos permanecem. O terceiro significado é que Eunice Paiva acometida de Alzheimer, em seus últimos anos, algumas vezes elaborava hiatos de reflexões lúcidas.

Sugestão de boa leitura:

Título: Ainda estou aqui.

Autor: Marcelo Rubens Paiva.

Editora: Alfaguara, 2015, 296 p.

sábado, 4 de janeiro de 2025

A importância da leitura e da análise do que se lê (2024)

 

            Todos os anos, faço uma retrospectiva das melhores leituras. Essa iniciativa não é a de se gabar, mas, a de inspirar. Algumas pessoas já me disseram que se iniciaram no hábito da leitura (ou a ele regressaram) ao ler as resenhas de livros que publico. Digo que também fui influenciado em tal sentido por mestres(as) que tive em toda a minha vida estudantil. Também foi assim quanto ao ato de escrever. A vida é uma troca entre gerações, apenas repasso as boas energias que recebi.

            No ano que passou, li 28 livros, mas não fui muito criterioso na escolha das leituras, em relação a autoria/continentes, assim foram as minhas leituras: Oceania: 3,6%; Ásia: 0,0%; África: 0,0%; Europa: 42,8%; América: 53,6%. Das leituras de obras de autores americanos, a América Latina aparece com 73,3% e a América Anglo-Saxônica com 26,7%. Quanto a leitura de obras latino-americanas por país: Brasil: 100% (39,3% da leitura global). Quanto a autoria/gênero das leituras realizadas: 85,7% sexo masculino e 14,3% sexo feminino. Fevereiro foi o mês que li mais (5 livros) e, Julho, Setembro, Outubro e Novembro, os meses que li menos (1 livro/mês). A partir desta análise, desejo ler em 2025 mais obras de autores latino-americanos (além do Brasil), africanos, asiáticos e, também mais obras de mulheres.

             As dez melhores leituras foram: 1. O buraco da agulha (Ken Follett); 2. Os europeus: o século XIX e o surgimento de uma cultura cosmopolita (Orlando Figes); 3. SPQR: uma história da Roma Antiga (Mary Beard); 4. Ainda estou aqui (Marcelo Rubens Paiva); 5. O avesso da pele (Jeferson Tenório); 6. Jardim de inverno (Kristin Hannah); 7. Morte e Vida Severina (João Cabral de Melo Neto); 8. Quincas Borba (Machado de Assis); 9. Dostoyevski: vida e Obra (Stefan Zweig); 10. A vida como ela é...em 100 inéditos (Nelson Rodrigues).

             Atribuo menções honrosas às seguintes leituras: *Um artista da fome (Franz Kafka); *A casa velha (Machado de Assis); *Feliz Ano Velho (Marcelo Rubens Paiva); *Caetés (Graciliano Ramos); *Fascismo à brasileira: como o integralismo, maior movimento de extrema direita se forjou e o que ele ilumina sobre o bolsonarismo; *O jogador de Xadrez (Stefan Zweig); *Fernão de Magalhães: o homem e seu feito (Stefan Zweig); *Segredo ardente (Stefan Zweig). A decepção literária do ano foi com a obra Madame Bovary (Gustave Flaubert). Tal frustração se deve ao fato de que minha expectativa era alta e não foi correspondida. Enfim, encerro desejando um ano novo repleto de boas leituras!