Powered By Blogger

segunda-feira, 27 de junho de 2022

Maria Bonita: Sexo, violência e mulheres no cangaço

 

Adriana Negreiros nasceu em 1974, em São Paulo, cresceu em Fortaleza e vive no Porto, em Portugal. Iniciou-se no jornalismo em 1996, como repórter de política do Diário do Nordeste, e trabalhou nas Revistas Veja, Playboy e Cláudia. Graduou-se em Filosofia pela USP, tem na obra "Maria Bonita: Sexo, violência e mulheres no cangaço" seu livro de estréia. (Companhia das Letras).

            Após ler o livro tomei conhecimento de que era a obra de estreia da referida autora. "E que estreia" foi o que pensei. A autora tem uma predileção pela pesquisa e desenvolvimento de obras que retratem a mulher. Afirma que sua intenção é a de resgatar as mulheres da invisibilidade a que muitas vezes lhes é imposta. A obra aqui resenhada é uma narrativa do cangaço realizada sob o viés feminino, sendo este o seu diferencial em relação às demais obras já publicadas que abordavam sobretudo o modus operandi do cangaço, em especial do bando de Lampião. Adriana observou que muitas dúvidas sobre o real papel das mulheres no cangaço permaneciam e realizou uma intensa pesquisa para lançar luzes sobre o cotidiano e a realidade das mulheres dentro do cangaço. E obteve grande sucesso.

            A personagem central é Maria Bonita, mas, a autora discorre sobre o cotidiano não apenas desta, mas, das demais mulheres que ingressaram no bando e também sobre a forma como o bando agia. Inversamente ao que se popularizou, a maioria das mulheres cangaceiras ingressaram no bando sob ameaças, era acompanhar o cangaceiro ou morrer. Na época havia um temor muito grande por parte dos pais de que algum cangaceiro se encantasse por suas filhas. Este era o temor destas também. Dentre as cangaceiras, algumas quando ainda brincavam de boneca foram raptadas, estupradas e obrigadas a seguir com os cangaceiros. No cotidiano, Elas deviam estar sempre disponíveis para o seu "marido", não havia possibilidade de escolha. A morte do cangaceiro não era a libertação delas, pois ficavam à disposição de qualquer cangaceiro do bando que a quisesse como mulher. E elas torciam para que isso ocorresse, pois, se assim não fosse seriam eliminadas para não contar segredos do bando.

            As mulheres cangaceiras quando capturadas pelas volantes eram tratadas com grande violência e quase sempre eram estupradas pelos policiais. Acreditava-se que elas participavam do cangaço por livre vontade, o que na quase totalidade dos casos não correspondia a verdade. Sofriam violência de seus companheiros e quando capturadas, os policiais buscavam vingar-se dos "maridos" cangaceiros, violentando-as. As mulheres tinham armas para a sua defesa pessoal, mas não participavam dos embates. Nem elas tinham essa intenção, nem os cangaceiros queriam que elas fizessem parte das refregas. Sobre Maria Bonita, ela era uma mulher à frente de seu tempo. Insatisfeita e irritada com as traições do marido, viu em Lampião o passaporte para deixar o casamento. A autora afirma que, de forma geral, não se pode falar que com o ingresso das mulheres no cangaço, seus parceiros se tornaram menos violentos ou que elas estimulavam a violência destes, pois, a única mulher que tinha alguma voz perante o seu parceiro era Maria Bonita, porém, raramente Lampião atendia seus pedidos de clemência para alguma pessoa cuja sentença de morte fora por ele determinada. Adultério (por parte da mulher) era algo não tolerado por nenhum cangaceiro. Lampião deixava tais casos para serem decididos pelo marido traído. Quase sempre o castigo era a morte. O nível de violência é que variava. A traição da mulher ao seu "cabra" era algo imperdoável na visão da própria Maria Bonita. A propósito, Maria Bonita tinha como nome Maria Gomes de Oliveira e era conhecida como "Maria de Déa" e ninguém no bando a chamava de Maria Bonita. Tal apelido lhe foi dado após sua morte. Enfim, concluo, dizendo que a leitura dessa obra é prazerosa e culturalmente enriquecedora!

Sugestão de boa leitura:

Título: Maria Bonita: Sexo, violência e mulheres no cangaço.

Autor: Adriana Negreiros.

Editora: Objetiva, 2018, 296 pág.

 


domingo, 19 de junho de 2022

Um certo Capitão Rodrigo

 

A obra "Um certo Capitão Rodrigo" faz parte da trilogia "O tempo e o vento" do escritor gaúcho Érico Veríssimo (1905-1975). Publicada separadamente, no entanto, é encontrada no volume 1 (O Continente). Caso o leitor tenha lido a trilogia ou o volume citado, trata-se da mesma trama lá encontrada. A obra "O tempo e o vento" ganhou duas apresentações audiovisuais: a série de 1985 com Tarcísio Meira (1935-2021) no papel de Capitão Rodrigo e o filme de 2013 cujo referido papel foi protagonizado pelo ator Thiago Lacerda. Particularmente, prefiro a versão de 1985. A trama tem inspiração nos fatos históricos do tempo nela retratado, dentre estes a Guerra da Cisplatina (1825-1828) e a Revolução Farroupilha (1835-1845), mas não é de forma alguma uma obra histórica.

            Em "Um certo Capitão Rodrigo", a trama se inicia com a chegada do Capitão Rodrigo ao fictício povoado de Santa Fé no ano de 1828. A referida personagem tem uma personalidade bastante caricata, fanfarrão, mulherengo, aventureiro, porém generoso. Rodrigo é festeiro e alegre e busca a felicidade nas coisas simples do dia a dia. O povoado de Santa Fé tem poucos habitantes, é um lugar pacato e, Rodrigo ao nele chegar não é bem recebido. Sua farda e fanfarronice causa ojeriza aos locais. Logo na chegada arranja confusão com Juvenal Terra que o chama para briga, Rodrigo então pede desculpas e diz que não está a fim de briga. Juvenal diz para ele que não deve esquentar assento em Santa Fé, pois, ali o povo é ordeiro, pacífico e não gosta de sujeitos que tirem o sossego do lugar. Afirma para ele que ali nada há para o seu estilo de vida, pois, as mulheres ou são casadas ou para se casar,  sendo todas sérias. Rodrigo fala que gostou das paisagens do local, que pode ficar um pouco ou quem sabe o resto da vida. E diz que quando enjoar ele pega seu cavalo e como chegou, vai embora.

            O Capitão Rodrigo se aloja em um quarto na venda do Nicolau. Rodrigo, mulherengo, logo começa a dormir com Paula (a esposa deste) quando ele não se encontra em casa. A personalidade de Rodrigo quebra o sossego do local, as moças por sua vez se encantam por sua beleza. A família Amaral é a mais poderosa da localidade e, em Santa Fé eles ditam as regras. Era dia de Finados, quando Rodrigo chegou a Santa Fé e, no cemitério conhece Bibiana, a filha do melancólico e racional Pedro Terra. Bibiana é irmã de Juvenal. O Capitão Rodrigo encanta-se com a moça de 22 anos, que resiste há anos as investidas de Bento Amaral, filho do Coronel Amaral, poderoso mandatário do povoado. Conforme ficou sabendo da chegada de Rodrigo, o Coronel Amaral solicitou ao Padre Lara que avisasse-o que devia seguir seu caminho, pois não era do interesse da comunidade a sua permanência. Rodrigo pede ao Padre Lara para que consiga um encontro com este. O Padre Lara é um religioso que embora seja benquisto pelo povo não ousa contrariar a elite local. Rodrigo vai à casa do coronel com o intuito de conseguir o consentimento para a sua permanência, pois não deseja confusão e ir embora está fora de cogitação dada atração que sente pela filha de Pedro Terra. Ele que jamais levou moça alguma a sério, passa a afirmar que a terá como mulher, mesmo que para isso precise com ela se casar.

            No povoado todos, inclusive sua própria família, atestam que Bibiana muito se parece com sua avó Ana Terra, pois tem o mesmo gênio. O pai não gosta de Bento Amaral, por isso, jamais fez pressão para que ela com este se casasse, porém, via em Rodrigo o oposto do que desejava para a sua filha. Ver sua filha casada com Rodrigo era ainda pior do que vê-la casada com o rico herdeiro do Coronel Amaral, pelo menos com este ela teria conforto e um marido presente. Em seu ver, Rodrigo era um aventureiro e mulherengo incorrigível que após encher ela de filhos, em um dia qualquer a abandonaria  sem lhe dar satisfações e seguiria sua vida errante. Bibiana, no entanto, que jamais almejou se casar, apaixonara-se por Rodrigo. Não demorou e a discórdia se instalou entre os dois pretendentes à mão de Bibiana. Bento Amaral desafia Rodrigo para um duelo. Rodrigo prontamente aceita. Com local e hora marcado, bem como escolhidos as armas e os padrinhos de cada lado. Rodrigo faz seu testamento oral (para o caso de vir a falecer) e diz que em sua família (os Cambarás) nenhum Cambará macho levou desaforo para casa. Disse ainda que nenhum Cambará macho morreu na cama, todos morreram jovens, seja nas batalhas ou em duelos e, que também ele não almeja chegar à velhice. Paro aqui para não dar spoiler, muito havia o que falar da referida obra, porém não quero estragar o prazer da descoberta na leitura.

Sugestão de boa leitura:

Título: Um certo Capitão Rodrigo.

Autor: Érico Veríssimo.

Editora: Companhia das Letras, 2005, 1ª edição, 192 pág.


domingo, 5 de junho de 2022

Covidei-me

 

        Sou uma das pessoas mais cuidadosas quanto ao uso de máscara, dessa forma, nem mesmo nas caminhadas pelas ruas a dispenso. Em meu ofício de lecionar, mesmo após a liberação para uso ou não, continuei utilizando. Foi com surpresa que após ter sintomas que poderiam ser de um estado gripal, recebi a notícia de que estava com Covid 19. A enfermeira que me atendeu disse-me que o vírus estava ativo e colocou-me uma pulseira, orientando-me sobre a necessidade do isolamento. Em seguida fiz uma consulta médica na UBS Presidente Vargas de minha cidade e somente tenho a elogiar o atendimento que recebi, seja pela atendente, a enfermeira que realizou o exame, a médica, sem esquecer, é claro o pessoal de apoio, inclusive aquele que faz a limpeza da unidade, que constitui um trabalho tão importante e tão invisibilizado pela sociedade. Passado o susto inicial, no meu caso, possuo comorbidades, avisei minha família para que se precavessem de cuidados para o meu retorno para casa.

            Minha esposa sugeriu-me que ficasse isolado na biblioteca de casa, a princípio não era essa a minha ideia, depois, considerei acertada. Nela tinha TV, computador e, claro, livros, muitos livros. Colocamos um colchão e ali fiquei isolado e, somente saía do espaço para ir ao banheiro, ocasiões em que utilizava duas máscaras. Minha família também utilizou máscaras em casa. O cuidado com a higienização dos locais em que eu tocava também foi seguido à risca. Felizmente, obtivemos sucesso e ninguém mais pegou a doença. Minha filha fez exame, porém, o caso dela era apenas dor de garganta, consultou, foi medicada e melhorou. Eu tive os seguintes sintomas: inicialmente dor de garganta, depois, sensação de obstrução das narinas (pouco muco), dor nos pulmões, tosse seca, dor de cabeça, febre leve e dores no corpo. Também tive uma espécie de conjuntivite, mesmo agora, estou colocando colírio para lubrificar os olhos, pois tenho a sensação de irritação (secura). Na volta ao trabalho, a sensação de cansaço ao lecionar foi grande (respiração ofegante). Pretendo marcar consultas com médicos pneumologista e oftalmologista para verificar estas situações.

            Quanto ao fato de me contagiar mesmo utilizando a máscara, sei que foi no local de trabalho, pois vários colegas também foram contagiados e no prazo de sete dias não estive em outro local, além de casa, onde ninguém teve a doença. Penso que talvez tenha sido no momento do lanche, ocasião em que mesmo observando algum espaço, retirava a máscara e, infelizmente, sabemos que o vírus não dá uma trégua para as refeições. Ou, quem sabe, em classe, tenha inadvertidamente colocado a mão contaminada nos olhos, vai saber. Estou escrevendo estas linhas, apenas para sugerir que continuem/voltem a usar máscaras especialmente em locais fechados, pois, se é verdade que com a vacinação os casos graves da doença ocorrem em menor proporção, ter Covid é incômodo e tira temporariamente profissionais do trabalho e estudantes das aulas. As novas variantes são ainda mais contagiosas e ninguém pode prever como seu organismo vai reagir à doença e se poderá deixar alguma sequela. No meu caso, levando em conta as comorbidades que tenho, penso que as três doses que tomei foram de grande valia contra uma manifestação mais grave da doença.  Ainda hoje li que os casos de contágio de Covid aumentaram 78% em trinta dias.

P.S. Apesar de ficar na biblioteca, pouco li, não estava com ânimo para tal. Cuide-se e aos seus! Viva a vacina! Viva o SUS!