Kadafi nascido em Sirte (cidade em que foi capturado e
morto), filho de beduínos pobres cujo pai esforçou-se em colocá-lo na escola
por considerar ter grande inteligência, acabou por aderir à carreira militar
onde rapidamente galgou postos de comando. E foi na condição de líder militar
que chegou ao poder líbio ao destituir a monarquia. Buscou sempre a união árabe
(no que fracassou) e, mais tarde a união africana (também sem sucesso). No
governo, publicou o Livro Verde no qual propunha uma alternativa ao socialismo
real e ao capitalismo. Era um grande marqueteiro, fazia discursos inflamados e
chamava a atenção mundial para temas com os quais podia capitalizar sua imagem,
porém, poucas eram as ocasiões que seu discurso estava afinado com sua prática.
Narcisista, estimulava a adoração à sua imagem como uma espécie de "pai de
todos".
O Governo de Kadafi caiu em meio à Primavera Árabe,
ocasião em que a população saiu às ruas incitada e organizada por lideranças
que por meio das redes sociais tinham
como objetivo exigir democracia, liberdade e respeito aos direitos civis. Os
protestos, tal como peças de dominó enfileiradas foram se sucedendo no norte da
África desde a Tunísia e atingindo países como a o Egito e a Líbia, porém, à
exceção destes países citados, noutros não logrou êxito. Há estudos que
demonstram que tais protestos tiveram auxílio estrangeiro (Soft Power ou Guerra
Híbrida) com a intenção de desestabilizar governos refratários aos interesses
das grandes potências. Tanto é verdade, que a virada na Guerra Civil Líbia se
deu com a entrada das potências (Estados Unidos, Inglaterra, França e Itália)
que à frente da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) bombardearam
as forças leais a Kadafi mudando o curso dos acontecimentos.
As potências obviamente afirmaram que com o auxílio
pretendiam retirar uma ditadura dando condições à instalação da democracia
naquele país. No entanto, sabemos que estas parecem acreditar que onde há
petróleo, a democracia deve receber mais estímulos. De forma alguma, criticamos
as razões que levaram o povo líbio a querer mudanças na política do país,
entretanto, não somos, ingênuos de acreditar que as potências o fizeram de
forma desinteressada. O tempo até aqui decorrido mostrou que a revolução
frustrou o sonho de dias melhores. O caos domina o país, traficantes de drogas
controlam cidades, guerrilheiros tribais disputam o poder e controlam áreas do território,
a economia colapsou,a pobreza aumentou enormemente.
A jornalista francesa Annick Cojean publicou em 2012 o
livro "O harém de Kadafi". Nele a autora conta a história de Soraya,
uma jovem e bela estudante de 15 anos, que fora escolhida pela direção da
escola em que estudava para entregar flores ao então presidente líbio em visita
à cidade. Muammar recebeu as flores e afagou o cabelo de Soraya, era a senha, a
líder da guarda presidencial feminina viria mais tarde buscá-la, tinha sido
escolhida para o harém. Na obra, Cojean publica os relatos de Soraya,
que por cinco anos teria sido mantida como escrava sexual do ditador (um grande
consumidor de viagra). No palácio havia uma área em que ficavam alojadas as
moças que podiam ser chamadas a qualquer momento do dia ou da noite para
atender aos desejos sexuais dele. Kadafi que em seus discursos pregava os bons
costumes (segundo a religião islâmica) e exaltava e valorizava o papel das
mulheres na sociedade, as tratava como objetos sexuais, inclusive obrigando-as
a consumir drogas. Cojean viajou para a
Líbia (após a morte de Kadafi) para buscar provas dos fatos relatados por Soraya e descobriu que o assunto virou
tabu naquele país, ninguém quer falar. Parte da população, porque admirava o
ex-presidente e ele está morto e, os opositores porque afirmam que isso
prejudica a imagem do país no exterior. No entanto, encontrou provas e locais
tais como descritos por Soraya.
Sugestão
de boa leitura:
Título: O harém de Kadafi.
Autor: Annick Cojean.
Editora: Verus, 2012, 4ª edição, 238 pág.