A história costuma ser
contada a partir da versão dos vencedores. Por isso, muita informação se produz
de forma incompleta ou manipulada. E isso não é algo à toa, pois, há uma clara
intencionalidade, a conquista da hegemonia do discurso. A história oficial (com
claro viés ocidental) registra que o dia da virada dos rumos da Segunda Guerra
Mundial foi 06 de Junho de 1944 (o dia “D”) quando ocorreu a invasão da
Normandia por tropas aliadas que cruzaram o Canal da Mancha e adentraram em
território francês ocupado pelas tropas nazistas. A história oficial concede
aos Estados Unidos da América o papel principal na derrocada do regime nazista,
mas, a história está sendo revisada, e sabe-se que o início do fim do regime
nazista, foi a derrota alemã para tropas soviéticas na batalha de Stalingrado.
A União Soviética teve a maior perda de vidas humanas de toda a Segunda Guerra
Mundial, estima-se que para cada soldado alemão morto em combate morreram dois
soldados soviéticos. A União Soviética após ter parte de seu território ocupado
por tropas alemãs que chegaram às cercanias de Moscou retomou o fôlego e
expulsou as tropas nazistas de seu território e de todo o leste europeu,
libertando inclusive os prisioneiros dos famigerados campos de concentração até
a conquista do bunker nazista em Berlim. Antes disso, Stalin implorava para que
os Estados Unidos abrisse outro front contra a Alemanha, pois, esta concentrava
a maior parte de seu arsenal contra a URSS e caso fosse atacada em dois flancos,
teria que dividir suas forças, mas, os EUA hesitavam (o que irritava Stalin). Mais
tarde, quando viram que havia a possibilidade de a URSS sozinha dar conta da
Alemanha apressaram-se em desembarcar na Normandia com o receio de que o
destino da Europa ficasse sob a influência soviética.
A escritora e jornalista bielorrussa Svetlana
Aleksiévitch se insere nesse grupo de pesquisadores que tem revisitado a
história na busca de relatos que fogem ao habitual. Ao invés de buscar as
fontes oficiais de informação e os personagens de alta graduação, ela vai ao
encontro do andar de baixo para buscar no meio do povo a história não contada
da superpotência soviética. Svetlana ganhou o Prêmio Nobel de Literatura de
2015 e entre suas principais obras estão “Vozes de Chernobyl”, “A guerra não
tem rosto de mulher” e “O fim do homem soviético”. Este escriba, após a
indicação de uma amiga virtual, tratou de comprar e ler a obra “O fim do homem
soviético”. Nesta obra Svetlana, com seu gravador e bloco de anotações visita as
cozinhas de várias residências, pois, é nestas segundo o antigo costume
soviético que se recebia as pessoas e onde ocorriam as acaloradas discussões
acerca da vida naqueles tempos. Svetlana buscou memórias de pessoas da
sociedade sobre como elas viram a história passar diante delas. Aleksiévitch
priorizou as pessoas que viveram os tempos de Stalin, Krushev, Brejnev,
Gorbatchev e Ieltsin. Procurou deixar as pessoas à vontade, pois, queria apenas
as impressões das pessoas sobre os tempos passados e atuais. O livro é
excelente e nele há todo tipo de relato, desde mulheres lindas que se casam com
homens machistas, beberrões e violentos aos fatos envolvendo o período de
grandes transformações da superpotência soviética e seus personagens
principais. Há relatos de dificuldades na sobrevivência diária, a falta de
produtos, bem como, declarações acerca da camaradagem entre as pessoas que na
visão delas com o advento do capitalismo se extinguiu. Há depoimentos de
pessoas desiludidas com o capitalismo, pois, tinham uma esperança acerca dele
que não se concretizou e que afirmaram que os proprietários de grandes fortunas
são criminosos que se apossaram das riquezas nacionais. Há também depoimentos
de pessoas que se sentiram traídas, pois, apoiaram Gorbatchev e Ieltsin pensando
que o socialismo seria reformado e não extinto. Ler a obra de Svetlana é
mergulhar na história não contada ou que não se quer contar!
Sugestão
de boa leitura:
O
fim do homem soviético – Svetlana Aleksiévitch, Ed. Companhia
das Letras.
Nenhum comentário:
Postar um comentário