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quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Tempos de ódio


            Vivemos tempos de ódio. E isto me lembrou a lenda da “batalha dos lobos” a qual relato: “Uma noite, um velho índio falou ao seu neto sobre o combate que acontece dentro das pessoas. Ele disse: A batalha é entre os dois lobos que vivem dentro de todos nós. Um é Mau. É a raiva, a inveja, o ciúme, a tristeza, o desgosto, a cobiça, a arrogância, a pena de si mesmo, a culpa, o ressentimento, a inferioridade, as mentiras, o orgulho falso, a superioridade e o ego. O outro é Bom. É alegria, fraternidade, paz, esperança, serenidade, humildade, benevolência, empatia, generosidade, verdade, compaixão e fé. O neto pensou nessa luta e perguntou ao avô: Qual lobo vence? O velho índio respondeu: Aquele que você alimenta”! Nestes tempos de fundamentalismo neoliberal imposto pela elite financeira mundial (a parcela do 1% mais rico e que detém a metade da riqueza do planeta), a democracia se tornou um obstáculo para o avanço da acumulação capitalista e no ver desta elite convém eliminá-la. O pensamento único não admite contestação: a fé inquebrantável na infalibilidade do Deus Mercado. A história não é linear dizem os mestres. O Mercado prova isso ao avançar na contramão do desenvolvimento econômico e social, reconvertendo em colônias, países que pretensamente ousaram se julgar soberanos e mandando de volta para a senzala os trabalhadores que pensaram ser perenes seus direitos trabalhistas e sociais. Estavam enganados, e distraídos, não perceberam, apesar dos avisos que o inimigo viria na calada da noite e também no clarão do dia para roubar-lhes a dignidade. Simone de Beauvoir acertadamente afirmou: “o opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os oprimidos”. Os algozes confiam o trabalho sujo aos cúmplices, e há muitos cúmplices, vários são conscientes disso, outros sequer suspeitam que agem em prejuízo próprio e de seus iguais na luta de classes. Ajuda também a bondade ingênua da parcela de Abel (is) que facilita o trabalho sujo da parcela de Caim (s) da sociedade.
            O ódio na população, tal como o Lobo Mau que existe em cada um, pode ser alimentado e isso não constitui novidade. Os meios de comunicação que segundo Noam Chomsky visam muito mais a moldar a opinião pública do que a ela informar, disso há muito têm consciência. Joseph Goebells fez escola, ensinou a elite como utilizar a mídia para propagar o ódio com o intuito de dividir a sociedade para fazer prevalecer seus interesses escusos. A Alemanha Nazista ensinou a odiar os judeus, os ciganos, os negros, os deficientes físicos, os comunistas, os sindicalistas e tais ensinamentos continuam a ser divulgados seja de forma subliminar, quando não de forma escancarada. Há alguns dias li que “as pessoas costumam acreditar que os amigos verdadeiros são aqueles que permanecem quando elas se encontram nos seus piores momentos. Porém, isso é um equívoco, pois, os verdadeiros amigos são aqueles que permanecem quando elas se encontram no auge do sucesso. Somente a amizade verdadeira suporta o sucesso do outro”. Em nosso país, sempre houve desinformação e manipulação grosseira acerca do sindicalismo e do socialismo, mas, foi a ascensão ao poder de Lula e Dilma (ambos do PT), e principalmente o seu sucesso, que fizeram com que o ódio antes oculto reverberasse na sociedade. Contribuiu fortemente para isso, a falta de espírito democrático de Aécio Neves (PSDB) e seus correligionários que preferiram incendiar o país, a esperar 2018, ocasião em que democraticamente poderiam, talvez, conquistar o poder nas urnas.

O surreal é que grande parte dessa população se diz cristã, porém destila o ódio. Quando penso em Jesus, o vejo entre os trabalhadores sem-terras; entre os favelados; entre os sem tetos; entre os desempregados; entre os trabalhadores explorados; entre os pobres; entre os famintos; entre os injustiçados! Jesus era um revolucionário; Era um contestador do sistema injusto que encontrou na Terra e por isso foi condenado injustamente, torturado e morto! Hoje há muitos que se dizem cristãos, mas, que a julgar pelas suas atitudes também estariam entre os que pediriam e comemorariam a condenação de Jesus!

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

A história revisitada na cozinha

Resultado de imagem para o fim do homem soviético
            A história costuma ser contada a partir da versão dos vencedores. Por isso, muita informação se produz de forma incompleta ou manipulada. E isso não é algo à toa, pois, há uma clara intencionalidade, a conquista da hegemonia do discurso. A história oficial (com claro viés ocidental) registra que o dia da virada dos rumos da Segunda Guerra Mundial foi 06 de Junho de 1944 (o dia “D”) quando ocorreu a invasão da Normandia por tropas aliadas que cruzaram o Canal da Mancha e adentraram em território francês ocupado pelas tropas nazistas. A história oficial concede aos Estados Unidos da América o papel principal na derrocada do regime nazista, mas, a história está sendo revisada, e sabe-se que o início do fim do regime nazista, foi a derrota alemã para tropas soviéticas na batalha de Stalingrado. A União Soviética teve a maior perda de vidas humanas de toda a Segunda Guerra Mundial, estima-se que para cada soldado alemão morto em combate morreram dois soldados soviéticos. A União Soviética após ter parte de seu território ocupado por tropas alemãs que chegaram às cercanias de Moscou retomou o fôlego e expulsou as tropas nazistas de seu território e de todo o leste europeu, libertando inclusive os prisioneiros dos famigerados campos de concentração até a conquista do bunker nazista em Berlim. Antes disso, Stalin implorava para que os Estados Unidos abrisse outro front contra a Alemanha, pois, esta concentrava a maior parte de seu arsenal contra a URSS e caso fosse atacada em dois flancos, teria que dividir suas forças, mas, os EUA hesitavam (o que irritava Stalin). Mais tarde, quando viram que havia a possibilidade de a URSS sozinha dar conta da Alemanha apressaram-se em desembarcar na Normandia com o receio de que o destino da Europa ficasse sob a influência soviética.
            A escritora e jornalista bielorrussa Svetlana Aleksiévitch se insere nesse grupo de pesquisadores que tem revisitado a história na busca de relatos que fogem ao habitual. Ao invés de buscar as fontes oficiais de informação e os personagens de alta graduação, ela vai ao encontro do andar de baixo para buscar no meio do povo a história não contada da superpotência soviética. Svetlana ganhou o Prêmio Nobel de Literatura de 2015 e entre suas principais obras estão “Vozes de Chernobyl”, “A guerra não tem rosto de mulher” e “O fim do homem soviético”. Este escriba, após a indicação de uma amiga virtual, tratou de comprar e ler a obra “O fim do homem soviético”. Nesta obra Svetlana, com seu gravador e bloco de anotações visita as cozinhas de várias residências, pois, é nestas segundo o antigo costume soviético que se recebia as pessoas e onde ocorriam as acaloradas discussões acerca da vida naqueles tempos. Svetlana buscou memórias de pessoas da sociedade sobre como elas viram a história passar diante delas. Aleksiévitch priorizou as pessoas que viveram os tempos de Stalin, Krushev, Brejnev, Gorbatchev e Ieltsin. Procurou deixar as pessoas à vontade, pois, queria apenas as impressões das pessoas sobre os tempos passados e atuais. O livro é excelente e nele há todo tipo de relato, desde mulheres lindas que se casam com homens machistas, beberrões e violentos aos fatos envolvendo o período de grandes transformações da superpotência soviética e seus personagens principais. Há relatos de dificuldades na sobrevivência diária, a falta de produtos, bem como, declarações acerca da camaradagem entre as pessoas que na visão delas com o advento do capitalismo se extinguiu. Há depoimentos de pessoas desiludidas com o capitalismo, pois, tinham uma esperança acerca dele que não se concretizou e que afirmaram que os proprietários de grandes fortunas são criminosos que se apossaram das riquezas nacionais. Há também depoimentos de pessoas que se sentiram traídas, pois, apoiaram Gorbatchev e Ieltsin pensando que o socialismo seria reformado e não extinto. Ler a obra de Svetlana é mergulhar na história não contada ou que não se quer contar!

Sugestão de boa leitura:

O fim do homem soviético – Svetlana Aleksiévitch, Ed. Companhia das Letras.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Quando o foda-se era a Lei


            A Espada era a Lei é um filme baseado no livro de mesmo título publicado em 1938 pelo escritor estadunidense T.H. White. De acordo com a história quem retirasse a espada do Rei Arthur que se encontrava encravada numa pedra seria Rei. Nos tempos atuais, penso que a Constituição Federal encontra-se encravada numa pedra e quem a retirar de lá será o quê? Ora, nada! Afinal, a Constituição Federal não vale mais que o seu peso em papel. Nossas autoridades não disfarçam mais, despem-se de quaisquer escrúpulos e tocam o foda-se. O foda-se foi institucionalizado. O foda-se virou a Lei. Diante das evidências, assim pensam nossas autoridades: “O povo? Foda-se o povo! O povo pensa ser importante, mas, sua importância restringe-se ao voto e voto pode ser comprado e até mesmo caçado”! As Instituições estão podres. Grande parte dos integrantes do Poder Legislativo faz parte do crime organizado ou vive à sua sombra. O Poder Executivo tem em seu representante máximo uma figura soturna que parece ter saído do caixão após nele descansar por milhares de anos e faminto quer o sangue da classe baixa e média, pois é sobre estas que recai todo o peso de seu desgoverno e de sua submissão ao capital rentista nacional e estrangeiro. O Grande Capital nacional e estrangeiro sabe que esse governo é ilegítimo e que as aquisições das riquezas nacionais a preço de banana, os perdões e as isenções fiscais constituem frutos de pilhagens, pois, jamais seriam conquistadas junto a um governo legítimo, democrático e patriota. Mas, o Grande Capital não têm consciência e não é patriota. É um estuprador que age com o consentimento da nossa elite vira-lata e rouba do povo e das futuras gerações a possibilidade de uma vida digna. O que dizer quanto ao Poder Judiciário que tenha escapado ao cidadão atento e honesto? Sempre tivemos uma Justiça que nas palavras do Ministro Barroso: “é dura com os pobres, e mansa com os ricos”. Nos últimos tempos o Judiciário tem aperfeiçoado suas funções.
Fui a favor da PEC 37, fiz modestamente meu papel ao tentar explicar nas redes sociais o monstro da insegurança jurídica que viria de sua não aprovação. Mas, ela acabou rejeitada no Congresso Nacional em grande parte pela força da Grande Mídia que cooptou os midiotas e sob cuja pressão os parlamentares sucumbiram. Num país verdadeiramente democrático, a Polícia, o Ministério Público e a Magistratura exercem suas funções de forma independente e limitadas ao âmbito de seu papel. No Brasil atual, não é mais possível distinguir a separação das funções, e, consequentemente o Braço da Lei é conduzido a pesar menos ou mais de acordo com as simpatias e antipatias envolvidas no caso, ou seja, pode-se determinar a sentença antes mesmo do veredicto. Vivemos uma Juristocracia. A ditadura dos sem votos. A ditadura que o notável intelectual e jurista Ruy Barbosa que assombrou o mundo com sua sabedoria tanto temia: “A ditadura do Poder Judiciário, por ele considerada a pior de todas, pois, contra ela não há a quem recorrer”. Há uma grande diferença entre fazer justiça e aplicar fielmente o Direito. Fazer justiça é coisa de justiceiros que agem à margem da lei ou manipulando-a (lawfare), portanto, coisa de criminosos. Aplicar o Direito é observar fielmente o código de leis, a Constituição Federal, a Declaração Universal dos Direitos Humanos sem observar a quem (independentemente de classe social, etnia ou ideologia). As pessoas costumam romantizar o Poder Judiciário, mas, ele é a expressão de seu tempo, inclusive de suas contradições, e, tem lado, o lado da classe dominante. Nem sempre o que é legal é moral, ou mesmo justo. No passado, escravizar seres humanos era legal e a lei dava ao senhor de escravos o poder de vida e morte sobre seus escravos. O Holocausto Judeu foi amparado em leis vigentes na então Alemanha Nazista. E o Poder Judiciário ao adotar a Teoria do Domínio do Fato acaba por fazer sua adesão ao nazismo mesmo que tardiamente. Vivemos uma época de insegurança jurídica. Agora imagine você, o que isso pode significar na sua vida e na de qualquer cidadão quando o ônus da prova é invertido. Não basta não praticar nenhum crime. Você não está a salvo das convicções do Ministério Público, ou de um Magistrado, que no caso da interpretação brasileira da Teoria do Domínio do Fato prescinde das provas.
No ano passado, fiquei sabendo que uma aluna lia um livro de 300 páginas em três horas, eu que me achava o máximo em ler o mesmo livro em três dias. Abismado fiquei quando ao ler comentário do intelectual Emir Sader que o desembargador Leandro Paulsen do TRF-4 leu as 250 mil páginas do processo de Lula em seis dias, o que o coloca como um fenômeno da leitura dinâmica, pois leu quase duas mil páginas por hora, o que deve ter feito privando-se do sono. Eu não consigo sequer folhar esse processo com essa rapidez sem me atrapalhar. O resultado do julgamento no TRF-4 foi antecipado em sete horas pela Band. Imagina que eu antecipo o resultado de um jogo em 3 x 0, e afirmo que determinado jogador vai receber o cartão vermelho. Você vai achar no mínimo estranho não é? Pois é! O Brasil anda muito estranho! O Juiz Moro costuma ir a eventos com integrantes de uma ala política embora se diga imparcial. Por assim agir, no mínimo desconhece ou não respeita o código de Ética da Magistratura. A República de Curitiba, ou se preferir da Casa Grande fez tanto bem (e o mesmo bem) à classe trabalhadora e ao país quanto o feitor de escravos fez aos escravos e a escravidão fez ao Brasil. Note-se que os prejuízos advindos ao país pela Operação Lava-Jato são imensamente superiores aos benefícios. E o Brasil não se tornará um país menos corrupto até porque é da percepção de qualquer pessoa atenta e honesta de que a Justiça no Brasil tem lado e esse lado é o do conservadorismo proveniente do DNA da Casa Grande que costuma estar no organismo da maioria dos magistrados brasileiros. Há até uma piada entre a população: “uma parte dos juízes acha que é Deus. A outra tem certeza”. Lembro que ante a rara notícia da condenação de um magistrado que foi “severa e exemplarmente” punido com uma precoce aposentadoria compulsória com vencimentos integrais, o mesmo se encontrava indignado. Perguntei a um colega professor: “Foi comprovada a culpa dele e ele mesmo assim está sendo premiado com a aposentadoria com vencimentos integrais. E está reclamando do quê? E esse professor me disse: mais importante do que o salário é a sensação de ser Deus, e é isso que ele não quer perder”!

A Ministra Carmem Lúcia, presidenta do STF, disse que se os brasileiros soubessem o que ela sabe não dormiriam à noite! Minha maior preocupação é se ela e os outros ministros continuam dormindo à noite. Maus exemplos no STF não faltam. Recentemente Carmem Lúcia jantou com representantes da Shell, uma das maiores beneficiárias do Golpe de Estado de 2016. Golpe que devido à omissão ou ação do STF parece ter sido chancelado por esta instituição. Mino Carta acerta ao dizer: “os heróis de hoje serão os vilões de amanhã”. A história será revisada, a verdade certamente aparecerá, e a nossa geração terá que explicar como deixou que uma minoria acabasse com o país e eliminasse as possibilidades de bem-estar das gerações futuras. O mico do ano 2017 foi o filme: “A lei é para todos”, com um título tão farsesco (que o digam os Jucás, os Serras, os Aécios, etc.) e a impossibilidade de atrair para seu público pessoas inteligentes, o fracasso era inevitável. Aliás, quem financiou esse filme? Quais seus interesses ante a parcialidade grotesca da versão filmada? Também não pegou bem, o imoral auxílio-moradia defendido por suas excelências, num país em que a parcela dos que comem bem criticam e pedem a extinção do programa bolsa-família dos que passam fome. Receber vencimentos que superam o teto legal é dar um foda-se à população. População esta que vem sendo imensamente prejudicada com o corte de direitos trabalhistas e previdenciários. Defender o auxílio-moradia dos que já ganham nababescamente é dar uma banana para a população, pois, como casta privilegiada, não precisam de votos, e juntamente com os políticos e os militares não terão seus direitos previdenciários tolhidos. Moro disse que pega o auxílio-moradia porque desde 2015 não tem reajuste de salário, ora, então que se faça uma lei assegurando o auxílio-moradia a todos que não tiveram reajuste. É vergonhoso o auxílio-moradia para juízes, parlamentares, etc. ainda mais com os altos salários que recebem, mesmo que brechas da lei o permitam. Ainda mais quando sabemos que o auxílio-moradia é superior ao salário de 92% da população do Brasil. Alguém poderá dizer que eles estudaram muito, mas, se estudar muito é o critério, por que professores não têm o mesmo direito? Precisamos seguir o exemplo da Suécia, lá juízes e parlamentares andam de transporte coletivo ou de bicicleta e ganham pouco mais do que um professor. O serviço público não deve ser lugar para enriquecer. Quem quer enriquecer que vá para a iniciativa privada! 

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

Lula, enfim, se libertou

Lula, enfim, se libertou
Por Jeter Gomes - Engenheiro mecânico, poeta, especializado em Economia do Trabalho e Sindicalismo, mestre em Educação e consultor para assuntos de Sindicalismo, Economia Solidária, Cooperativismo e projetos sociais.
O dia 24 de janeiro de 2018 ficará marcado na história como o dia em que Lula se libertou. Acabou a apreensão, o nervosismo da expectativa de um possível julgamento justo. O que se viu em Porto Alegre, durante horas e horas de sessão, foi a confirmação de que o Judiciário brasileiro não tem o menor pudor em assumir diante das câmeras que tem um lado: o das elites brancas, escravocratas e raivosas. Longuíssimas leituras e discursos políticos dos magistrados e nem uma migalha de provas da culpabilidade do ex-presidente da República. Como os inquisidores nada conseguiram provar, mostraram para seus patrões da mídia e do Kapital que são ainda mais cruéis que o TorqueMoro e aumentaram a pena. Tramando a confirmação do crime, vilipendiaram as leis, a Constituição, o Estado Democrático de Direito. Com punhos de renda, prestaram contas ao rentismo. Com inteligência média, ganharam as manchetes da mídia. E voltaram pra suas casas com as mãos sujas dos carrascos.
E ali começou a libertação de Lula do seu pequeno corpo físico de metalúrgico migrante do agreste pernambucano. O que era carne virou verbo: Lular. Se de um lado, o prefeito de Porto Alegre, seu inimigo figadal, tucano de filiação e MBL (essa seita dirigida por garotos fascistas, financiada por abastados e seguida por abestados) por convicção, não conseguiu juntar uma centena de g(p)atos pingados; do outro, 70 mil pessoas de todo o Brasil lularam numa demonstração gigantesca de apoio ao seu líder e que a mídia Golpista ocultou dos seus leitores. Certamente, Lula é o réu que mais arrastou simpatizantes para um julgamento na história da humanidade. E a massa lulava com força, com gana, com raça, com coragem, mesmo sabendo que os juízes jogavam no time adversário.
A farsa acabou, os véus foram rasgados, as máscaras deixadas nos bolsos das togas. Despiram-se das fantasias a menos de vinte dias do carnaval. E quando o mundo abriu os olhos, os três patéticos estavam nus diante do tribunal da verdade, aquela que adoece, mas nunca morre. A guilhotina foi armada para decapitar o maior líder popular e o presidente mais bem avaliado da história do Brasil. Mas Lula desencantou, bateu asas na Esquina Democrática da capital gaúcha, sobrevoou o Guaíba, se misturou ao vento e se espalhou pelo país. Se fez matéria nas universidades e institutos tecnológicos que construiu, nos 40 milhões que ajudou a tirar da miséria, na retirada do Brasil do mapa da fome da ONU, nas águas transpostas do Velho Chico, na Luz que ofertou para Todos, nos alimentos da Agricultura Familiar que saciou a fome nas merendas escolares, nos tetos seguros do Minha Casa Minha Vida, nos milhares de jovens negros e pobres que ingressaram nas universidades e adquiriram conhecimento até ultrapassaram nossos limites geográficos no Ciência Sem Fronteiras.
Esfumando-se da cidade que foi por vezes sede do Fórum Social Mundial, Lula aterrissou na Praça da República (ironia da história), na capital do Kapital brasileiro. Ali, num tom sereno, dos que portam a certeza da sua inocência, acalmou e orientou para a luta os 50 mil militantes que o ouviram atenta e emocionadamente. Paradoxalmente, a poucos quilômetros dali, na Avenida Paulista, os vitoriosos do dia não conseguiram amealhar mais do que 300 adeptos. Sintoma de que a população se cansou de ser manipulada por grupelhos infanto-fascistas e pela mídia golpista. Senão, como explicar que os torcedores do time campeão recolheram-se em seus lares e os “derrotados” desfilaram na avenida como se tivessem ganho o campeonato? E o mar de vozes e bandeiras vermelhas lulou até a Paulista, onde já não havia o menor sinal dos “vitoriosos”.
Lula não é mais de carne e osso. Não é mais um nordestino de voz rouca e língua presa. Lula virou pássaro, virou canção, virou poesia. Já entrara pra história como um dos nossos melhores presidentes, senão o melhor. Agora se perpetuará como um dos mais injustiçados, caçados, esquadrinhados, revirados, tripudiados. Seu corpo de 72 anos pode até ser encarcerado, mas não se pode prender seus ideais, seus projetos, seus sonhos, seus feitos, sua utopia. Eles não cabem nas gaiolas da FIESP, da Rede Globo, da FEBRABAM, da Veja ou da Folha de São Paulo, pois já estão fecundados nos corações e mentes de milhares de brasileiros e brasileiras que não desistirão nunca de serem livres. Lula não mais se pertence. Ele agora é do povo, dos mais humildes, dos mais conscientes, dos mais necessitados, dos excluídos. Não por acaso, lidera folgado todas as pesquisas de intenção de voto para presidente da República. E já não precisa mais receber nenhum desses votos, pois virou lenda, virou mito, virou luz na escuridão que o Golpe nos jogou. Virou estrela no céu cinzento, virou sol em meio à tempestade. Seus algozes quiseram transformá-lo em cinzas, mas Lula é Fênix. Renasce e cresce a cada derrota. O sapo barbudo ficará na história, os juízes na escória.
Contam que depois da sentença, pré-anunciada pela crônica, ouviu-se Lula declamando os versos do gaúcho (talvez uma homenagem à cidade que o abraçou e o fez mártir) Mário Quintana: todos esses que aí estão, atravancando o meu caminho, eles passarão... Eu passarinho!
Voa Lula, voa!
Disponível em: https://jornalggn.com.br/noticia/lula-enfim-se-libertou-por-jeter-gomes - acesso em 31 de janeiro de 2018.