quinta-feira, 24 de novembro de 2016
Jornalismo chapa-branca ou de secos e molhados!
É impressionante e deprimente como a grande mídia trata mal o jornalismo em nosso país. Isso é algo que ficou evidente durante o processo de Impeachment contra Dilma Rousseff quando a atenção internacional se voltou para o Brasil e grandes meios de comunicação estrangeiros perceberam que precisavam colocar correspondentes no país, pois, a grande mídia nacional não constituía fonte confiável para obter as informações necessárias para bem informar a população de seus países sobre o que ocorria nestas terras. A grosseira manipulação da opinião pública por meio da distorção e deturpação das notícias publicadas por gigantescas empresas de comunicação constituiu uma poderosa ferramenta a serviço do golpe e da interrupção da democracia em nosso país. Vivemos num estado de exceção e como é comum nesses períodos, a plutocracia e a mídia reacionária irmanadas no golpe pretendem conquistar a hegemonia do discurso. O governo golpista busca a aceitação tácita da população e a grande mídia deseja colher os frutos resultantes de seu “trabalho” prestado em favor dos golpistas e em desserviço à nação.
Durante os governos de Lula e Dilma, a publicidade do governo federal foi realizada por meio de um processo de relativa desconcentração de veículos midiáticos. O governo buscava interiorizar a publicidade governamental e isso favoreceu pequenas e médias empresas de comunicação situadas no interior do país que a receberam. Nos governos anteriores, principalmente na gestão FHC, poucos veículos de comunicação, notadamente os maiores e mais poderosos abocanhavam quase toda a publicidade do governo federal. É interessante observar que essa política dos governos petistas não foi bem recebida pelos mais poderosos meios de comunicação que não pouparam esforços para desestabilizar o governo perante a sociedade, mesmo que para isso os jornalistas chegassem ao ponto de metaforicamente rasgar seus diplomas ao esquecer a teoria aprendida nos bancos universitários sobre o bom jornalismo.
Ao assumir a presidência do Brasil, Michel Temer o fez marcado pela ilegitimidade de um processo que manchou ainda mais o país perante as nações democráticas do mundo. O Congresso Nacional manobrou, manipulou e desobedeceu a Constituição Federal ao levar adiante um processo que deveria ter sido sustado por não conter provas de culpabilidade contra a Presidenta. O Supremo Tribunal Federal ao permitir e avalizar o golpismo travestido de Impeachment “rasgou” a Constituição Federal e legitimou o governo plutocrata ao extinguir o Estado de Direito e colocar em seu lugar, o Estado de Juristas, cuja prática do “decisionismo” com suas interpretações bipolares da lei de acordo com o momento e as cores partidárias envolvidas jogou o país numa nova e triste realidade, a da insegurança jurídica.
A revista Carta Capital em seu artigo “O golpe será televisionado” (de 26/10/2016) destaca a reconcentração das verbas publicitárias por meio do aumento dos valores percentuais destinados aos mais poderosos grupos de comunicação nacionais e que são justamente aqueles que mais batiam/batem em Lula e Dilma. Tais grupos passaram a amenizar as críticas ao momento de crise econômica pela qual passa o país dando a impressão que a crise acabou, quando na verdade ela está se aprofundando. As notícias desfavoráveis ao governo são tanto quanto possível, evitadas, e há um esforço em dar notícias “neutras” ou positivas ao governo ilegítimo. Há uma frase bastante emblemática de Millor Fernandes: “jornalismo é de oposição, o resto é armazém de secos e molhados”. Ricardo Noblat, um dos figurões do jornalismo nacional citou essa frase ao justificar seus artigos em oposição aos governos petistas. No programa Roda Viva cujo entrevistado foi Temer, o referido jornalista por sua ação evidenciou a posição da grande mídia golpista que se tornou chapa-branca, ou se preferir, um grande “armazém de secos e molhados” ao fazer com Temer um programa que segundo os críticos mais parecia uma conversa de amigos leais num churrasco. O ativista estadunidense pelos direitos dos negros Malcom X fez uma declaração que deve ser objeto da reflexão de todos e com ela encerro este artigo: “A imprensa é tão poderosa no seu papel de construção de imagem que pode fazer um criminoso parecer que ele é a vítima e fazer a vítima parecer que ela é a criminosa. Esta é a imprensa, uma imprensa irresponsável. Se você não for cuidadoso, os jornais farão você odiar as pessoas que estão sendo oprimidas e amar as pessoas que estão fazendo a opressão”.
quinta-feira, 17 de novembro de 2016
A classe média brasileira na luta pela manutenção do status quo!
No momento atual não são poucos ideólogos que tentam passar a ideia (que nada tem de ingênua) de que as ideologias deixaram de existir com a queda do Muro de Berlim (infelizmente, para o lado errado) e o fim do Mundo Socialista. Porém, não sou nascido na era pós-moderna e abomino a ideologia que a sustenta. Entendo que a sociedade ontem, hoje, e sempre, será o resultado da luta de classes, e que não ter consciência disso apenas amplia a larga vantagem daqueles que defendem uma sociedade desigual visando manter os privilégios concedidos à minoria que representam. Privilégios que são frutos do suor da classe trabalhadora e dela obtidos por meio de fórceps, ou se preferir da apropriação de mais-valia.
O Brasil é um país em que o Poder sempre foi monopolizado pela direita desde 1500 por ocasião da invasão portuguesa ao território até então pertencente aos indígenas, e, desde então o Brasil foi construído pela elite e para a elite como uma legítima sesmaria repassada hereditariamente do Senhor de escravos, para os Sinhozinhos e Sinhazinhas (seus descendentes). Esse fato é observado ao se analisar historicamente a repetição dos sobrenomes de políticos nas casas legislativas estaduais e federais e também aqueles concernentes às grandes fortunas empresariais, pois, a “meritocracia parece funcionar melhor com os indivíduos nascidos em berço de ouro que tendem a permanecerem ricos ou avançarem mais na escala social tornando-se até mesmo bilionários”. Parte do sucesso meritocrático dos Sinhozinhos e Sinhazinhas está no sistema político e econômico nacional cujos governantes em sua quase totalidade governaram para preservar e ampliar os privilégios da elite à custa do sacrifício dos trabalhadores e, isso ocorre por meio de renúncias fiscais e reduções de impostos para os mais ricos e a adoção de tributação regressiva (que penaliza os mais pobres) o que deu origem a um “gigante” cuja economia figura entre as dez maiores do planeta, mas, cujo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e Índice de Gini (que mede a desigualdade social) o põe com os “pés” cimentados entre os países mais atrasados do planeta no que concerne à qualidade de vida de sua população haja vista a miséria que assola seu povo e a imensa desigualdade social que constitui um abismo imensurável entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos.
Nenhum país cuja desigualdade social seja extremada pode-se proclamar uma democracia, o conceito de democracia não se encerra com o fato de seu povo poder participar de eleições periódicas e de seu voto não ser cassado ilegalmente (aqui nem isso). A mobilidade social é importante e embora esta venha sendo reduzida quase no mundo todo como um dos múltiplos efeitos colaterais do neoliberalismo, nos governos progressistas de Lula e Dilma houve uma pequena melhoria, porém, isso foi o bastante para enraivecer parte da sociedade formada por Senhores da Casa Grande, Sinhozinhos e Sinhazinhas e principalmente feitores de escravos (a pequena burguesia) e escravos de confiança (os trabalhadores alienados) que trabalharam com afinco em apoio à concretização do golpe cujo presidente ilegítimo (Temer) adota medidas que aprofundarão a desigualdade social para o aplauso de pessoas pouco inteligentes e sem valores humanitários. É importante que se diga que a classe média não empobreceu nos governos petistas, mas, a sensação de que a distância em relação aos mais pobres encurtou ao vê-los nos aeroportos, frequentando shoppings, financiando automóveis, etc. foi o suficiente para encolerizá-la e ver nisto perda de status social, pois, não lhe basta que viva confortavelmente, a miséria dos demais é necessária para que se sinta especial. Parece-lhe que o prato vazio dos pobres torna seu alimento mais saboroso. Parece exagero, mas, não é! A essência da maldade humana costuma se travestir no falso discurso da meritocracia!
quinta-feira, 10 de novembro de 2016
Um país inteiro para as Excelências e as mordomias!
Claudia Wallin escreveu um livro intitulado “Um país sem excelências e mordomias” que deveria ser leitura obrigatória de cada brasileiro, obra capaz de ruborizar a face de todas as pessoas dignas deste país, falo daquelas que ainda apresentam o rubor facial da vergonha, característica atualmente tão rara a grande parte da classe dirigente do Brasil, especialmente nestes tempos sombrios que vivemos definidos pelo intelectual português Boaventura de Souza Santos como um momento de baixíssima intensidade democrática. Penso que o famoso escritor português foi generoso, pois, um Estado com baixíssima intensidade democrática o Brasil se apresentava antes de 2014, porém, com a quarta derrota consecutiva, a Casa-Grande (a grande burguesia nacional e internacional) apoiada pelos sempre fiéis feitores de escravos (a baixa burguesia) e os escravos de confiança (os trabalhadores alienados) iniciaram um golpe que deu fim à insipiente democracia existente no país e fez do Brasil uma República das Bananas.
Após o golpe de 2016, que alguns escritores coxinhas tentam em vão dizer que foi constitucional, apelando apenas para o fato de que a Constituição Federal prevê o Impeachment, mas, nada dizem quanto ao fato de que esta também afirma que o Impeachment somente deve ocorrer com a comprovação de crime praticado pelo (a) Presidente (a) e isto jamais se comprovou e gravações mostraram que as razões para se fazer o Impeachment/golpe era para salvaguardar o grupo criminoso contra a Operação Lava-Jato. Com o golpe, o Brasil abandonou o protagonismo que vinha tendo ao lado do BRICS, da UNASUL, do G-20, das relações Sul-Sul para voltar a ser aquele primo pobre, indesejável e pidão que os Estados Unidos e demais potências do G-7 se acostumaram a ignorar. É que embora os Estados Unidos digam defender a democracia, preferem uma ditadura amiga em países estratégicos do que uma democracia soberana e independente que não se curve às suas vontades e caprichos. O país está quebrado, dizem os golpistas, e, no entanto o supremo mandatário concedeu 41,5% de reajuste (somente em 2016) aos Magistrados cujos salários anabolizados e turbinados com adicionais eleva-os além do teto salarial constitucional, (numa manobra considerada legal, pois, este é o país do “jeitinho”) fazendo corar de vergonha os magistrados suecos, que não possuem carros oficiais e nem motoristas particulares, nem auxílios-moradia, etc. ou qualquer outro tipo de privilégio e seus salários tal qual os dos políticos são pouco acima daquele recebido por um professor.
Na Suécia, Deputados regionais (equivalente aos nossos Deputados Estaduais) recebem apenas ajuda de custo e, de forma geral, os parlamentares não possuem assessores particulares, estes são fornecidos pelos partidos políticos e cada assessor presta auxílio a três ou quatro parlamentares da legenda. Dessa forma, cada parlamentar organiza sua agenda, prepara os seus discursos e reserva suas passagens para os eventos oficiais sempre tendo o cuidado de utilizar o meio de transporte mais barato para não onerar o Estado. Os parlamentares suecos não aumentam o próprio salário como fazem os parlamentares brasileiros que há muito perderam a vergonha e o fazem até em momentos de corte de investimentos para a Educação, a Saúde, a Assistência Social em atitude de total escárnio com a sociedade. Em Estocolmo é fato comum encontrar parlamentares e magistrados indo para o trabalho ou para casa por meio do transporte coletivo. Houve até o caso de um Ministro milionário que adquiriu uma mansão e teve que pedir demissão por isso, pois, embora a aquisição da casa se fizesse com recursos comprovadamente próprios, a população escandalizada não se julgou representada por um político que não vivesse com o estilo de vida da maioria da população. Na Suécia, a política não é considerada um lugar para se fazer fortunas e nem viver nababescamente inversamente ao Brasil. Outro caso relatado no livro foi de uma Ministra que precisou pedir demissão do cargo, porque a imprensa descobriu e divulgou que ela não havia feito o registro trabalhista formal de sua babá e outra sofreu sério processo judicial que atrapalhou sua carreira política porque comprou um chocolate com dinheiro público. Enfim, a Suécia é do outro lado do mundo, mas, não é em outro mundo, saber que ela existe nos anima a acreditar, e lutar, para que a decência no trato da coisa pública ocorra também aqui, nestes até o momento “tristes trópicos”!
Sugestão de boa leitura:
Um país sem excelências e mordomias. Claudia Wallin. Geração Editorial, 2014.
sexta-feira, 4 de novembro de 2016
A ascensão do resto!
O cientista político Fareed Zakaria nasceu em 1964 na Índia, estudou em Yale e doutorou-se em Ciência Política em Harvard. Na orelha de sua obra “O mundo pós-americano” consta que é editor da Newsweek International e que nesta revista mantém uma coluna semanal sobre assuntos internacionais, além de ter um programa da Rede CNN de Televisão. Zakaria seguiu os passos de vários de seus conterrâneos, pois, na Índia como em vários países do mundo subdesenvolvido, a “fuga de cérebros”, ou seja, a ida de jovens promissores dos países pobres para estudar em importantes instituições do mundo desenvolvido, especialmente nos Estados Unidos, e dentre estes, os mais talentosos acabam recrutados a permanecer e desta forma contribuir para o engrandecimento daquela nação que chama a atenção mundial, por vezes, pelo que há de mais odioso e repugnante, noutras, pelo brilhantismo inovador. Zakaria nasceu no país, cuja população à exceção da estadunidense é que mais admira o país iankee. Em nenhum outro país os ideais estadunidenses impostos pelo Big Brother Sam foram tão bem recebidos e assimilados. O sonho de grande parte dos jovens indianos é conseguir uma bolsa de estudos numa grande e famosa instituição estadunidense de Ensino Superior para fazer a graduação ou a pós-graduação. A maior parcela destes jovens retorna à Índia e aplica os conhecimentos adquiridos em benefício do país que juntamente com o Brasil, a Rússia, a China e a África do Sul formam o grupo de países emergentes conhecidos como BRICS.
Apesar do título “O mundo pós-americano”, Zakaria, logo na primeira linha à página 11, esclarece: “este livro não é sobre o declínio dos Estados Unidos da América, mas, sobre a ascensão de todos os outros países”. E em toda a obra o autor, apesar de indiano de nascimento demonstra grande assimilação da cultura e modo de pensar estadunidense e, por vezes, tem-se a impressão de que pensa e escreve como um indiano, noutras, como um estadunidense de nascimento. Como exemplo, e fortemente discordando de sua opinião, Fareed menospreza o poder bélico da China, talvez, pela dupla influência cultural indo-estadunidense ao afirmar que a China não teria poder suficiente para bombardear com artefatos nucleares mais do que a costa estadunidense e que o país asiático teria apenas cerca de 50 mísseis nucleares, esquecendo-se que a China já colocou um astronauta no espaço e que possui submarinos nucleares nas proximidades daquela potência que dispensam os mísseis de longo alcance, porém, mesmo estes, são estimados pelos especialistas em geopolítica em um número entre mil e dois mil mísseis armados com ogivas nucleares de alto poder, quantidade suficiente para riscar a vida humana do planeta. Zakaria também possui uma interpretação nitidamente estadunidense dos fatos acerca da Venezuela e do Irã e coloca ambos os países no status de pária, no entanto, quem conhece a história e a estudou com distanciamento científico entende a razão destas nações nos seus posicionamentos e concorda com a maioria das opções por elas adotadas, mas, isso é algo que não está acessível na Grande Mídia, que nada mais é do que um forte instrumento a serviço do Imperialismo.
Fareed evidencia o grande crescimento econômico de várias nações do planeta nas duas últimas décadas e dá especial atenção aos países emergentes que constituem o grupo de países subdesenvolvidos cujo resgate do anonimato e ascensão ao protagonismo no palco dos debates da governança global se deu pela crescente importância econômica e política, pois, já não é mais possível gerir o planeta sem consultá-los. O autor em sua obra relata feitos grandiosos de tais países na área da educação, da inclusão social, do avanço tecnológico e na construção de uma infraestrutura interna mais elaborada e funcional. Afirma que a história humana é marcada por três mudanças: A ocidentalização do mundo; a ascensão dos Estados Unidos; e, a ascensão do resto. O livro discorre sobre o que esperar deste mundo em gestação e o que esperar dos Estados Unidos e ao se referir à história, aponta que os Estados Unidos podem agir como a Inglaterra que tentou minar o desenvolvimento de novas potências na Europa e reinar absoluta, iniciativa em que fracassou, ou agir como o chanceler alemão Bismarck e fazer alianças e estreitar laços de cooperação. O autor aponta caminhos para a governança estadunidense nesse novo tempo. Penso que somente o tempo dirá, mas, a impressão até aqui (2016) é que os governantes daquele país têm bastante sangue inglês nas veias.
Sugestão de boa leitura:
O mundo pós-americano. Fareed Zakaria. Editora Companhia das Letras, 2008.
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