terça-feira, 25 de novembro de 2014
O poema que perdi!
Leonardo Boff é um dos maiores intelectuais brasileiros vivos, foi frei da Igreja Católica e uma das mais importantes lideranças do movimento conhecido como Teologia da Libertação, em meu ver, uma semente do Reino de Deus que foi plantada no seio da Igreja Católica, mas, que infelizmente foi sufocada, pois, a Igreja é conduzida por homens e homens ao contrário de Deus são falíveis, mas, não vou me estender neste tema, pois, esta não é a intenção deste artigo. Há alguns anos sua Santidade o Dalai Lama, líder da religião budista, exilado na Índia desde que a China ocupou o Tibete veio ao Brasil e Leonardo Boff em audiência com o Dalai Lama preparou-lhe marotamente a seguinte pergunta: “Na opinião de Sua Santidade, qual é a melhor religião do mundo”? Imaginando que o líder budista afirmaria ser o budismo e neste caso Boff teria uma contra-argumentação, mas, o Dalai Lama que segundo Boff é uma alma iluminada, cuja paz por ele pregada pode ser sentida pela sua simples presença, respondeu genialmente: “A melhor religião do mundo é aquela que faz de você uma pessoa melhor”! Leonardo ficou sem palavras diante da sabedoria e da humildade do líder budista.
Tenho boas lembranças do tempo de juventude, especialmente, do tempo em que participei de grupo de jovens na Igreja Católica à época da Teologia da Libertação e neste período comecei a participar de discussões sobre política, movimentos sociais, reforma agrária, etc. Eu sempre me questiono: Se Jesus viesse hoje ao mundo qual seria o teor dos seus discursos? Qual seria a sua prática? E costumo imaginá-lo na favela, nos acampamentos de refugiados da violência pelo mundo, junto aos sem terra e sem teto, também o imagino com os líderes mundiais pregando a conciliação, a solidariedade, e, tal como vi num post no Facebook, penso que Jesus seria chamado de comunista, de populista, etc., pois, pensar que todos merecem ter uma vida digna e que o Reino do Céu precisa acontecer na Terra é algo que alguns que se encontram no topo da pirâmide social consideram injusto, afinal, devem pensar que possuem o que têm por que todos sem exceção são “self made man”. Penso que é muito fácil falar em meritocracia quando se começa a correr quilômetros à frente de seus adversários e com a linha de chegada mais próxima. Penso que Jesus falaria de respeito à diversidade de opinião, de respeito e cuidado para com a natureza, para com os pais, os idosos, os professores, os pobres, os injustiçados, etc. Quando participante de grupo de jovens tive contato com uma poesia de José Wanderlei Dias que à época considerei profundamente inspiradora tanto que já a procurei diversas vezes na Internet sem lograr êxito, mas tenho sempre comigo outra poesia que também considero tocante, escrita por uma pessoa que somente pode ter uma alma iluminada. Ei–la:
Além da imaginação
Tem gente passando fome/E não é a fome que você imagina/entre uma refeição e outra.
Tem gente sentindo frio/E não é o frio que você imagina/entre o chuveiro e a toalha.
Tem gente muito doente/E não é a doença que você imagina/entre a receita e a aspirina.
Tem gente sem esperança/E não é o desalento que você imagina/entre o pesadelo e o despertar.
Tem gente pelos cantos/E não são os cantos que você imagina/entre o passeio e a casa.
Tem gente sem dinheiro/E não é a falta que você imagina/entre o presente e a mesada.
Tem gente pedindo ajuda/E não é aquela ajuda que você imagina/ entre a escola e a novela.
Tem gente que existe e parece imaginação.
Fonte: Ulisses Tavares. Viva a poesia viva, p. 57.
São Paulo, Saraiva, 1997.
quinta-feira, 13 de novembro de 2014
Tributo a São Pedro
“Água é fonte de vida”! Que o digam os paulistas em meio a maior crise hídrica de sua história. A crise de abastecimento de água na metrópole paulistana tem sido assunto frequente nos telejornais e na imprensa escrita. O tema foi inclusive debatido durante as últimas eleições em que os políticos situacionistas do estado mais rico do país, culpavam São Pedro, o El Niño, etc. Do outro lado, os oposicionistas afirmavam que houve má gestão, pois, importantes obras deveriam ter sido efetivadas e não o foram, ou seja, as denúncias davam conta de que a gestão da Sabesp se preocupou muito em distribuir dividendos aos acionistas e investiu pouco na ampliação de sua capacidade de armazenagem, tratamento e distribuição de água à população.
As reportagens diárias na TV, principalmente após as eleições (por que será?) mostravam que ao contrário da afirmação do Governo paulista de que não havia racionamento, interrupções sistemáticas de fornecimento estavam acontecendo principalmente em áreas periféricas (por que será?). O Governo paulista chamado à realidade (que não é aquela dos felizes acionistas da Sabesp) anunciou que iria fazer a captação, tratar e enviar para a população água da chamada reserva técnica, também conhecida como volume “morto” denominação (que não anima muito não é?) dada para a água do fundo do reservatório abaixo do nível dos túneis de captação. Essa água é segundo os especialistas de qualidade inferior, pois, apresenta maiores índices de contaminação, inclusive por metais pesados.
O tempo passou, a eleição chegou e o povo deu à “situação” por resolvida concedendo mais um mandato de quatro anos e Alckmin reeleito fez um brinde com água do volume morto (será?). Porém, a imprensa começou a falar sobre o risco da perda do poder de atração de São Paulo para novos investimentos industriais por causa da crise hídrica, e como São Pedro lhes parecia ser petista (a direita adora chamar de petista qualquer um que se posicione em seu caminho e não partilhe dos mesmos ideais!), pois, as chuvas quando vinham eram insuficientes, viu que precisava pensar seriamente na situação e então o governo paulista resolveu apostar na “água de reuso”, ou seja, esgoto tratado que servia apenas aos processos industriais que agora seriam despejados e diluídos nos reservatórios cuja água seria então captada, tratada e enviada à população. Certo, existem países europeus e mesmo algumas regiões dos Estados Unidos onde essa prática é utilizada, porém, existem elementos químicos que não desaparecem mesmo após o tratamento da água e que podem causar problemas no sistema endócrino dos seres humanos, um destes é o hormônio feminino estrógeno que devido ao consumo de anticoncepcionais é eliminado de forma generosa na urina. Menarcas precoces, tumores e outros problemas podem ser as consequências da exposição a tal contaminação de forma crônica.
A revista Carta na Escola (Out.2014) trouxe uma bela reportagem sobre o tema e mostrou que houve má gestão na Sabesp (e consequentemente do governo tucano) e os investimentos que deveriam ter sido feitos teriam evitado a crise atual. Alckmin reeleito foi à Brasília conversar com o governo federal para fazer uma parceria por meio de empréstimos bilionários para a realização de obras que já deviam ser realidade há pelo menos uma década. Sempre afirmei que fazer oposição é legítimo, mas a oposição deve se basear em atitudes inteligentes e recusar a mão estendida do Governo Federal nessa hora em que as torneiras paulistas secam seria uma atitude desumana com o sofrimento da população! Perdoe-lhes São Pedro! Eles não sabiam o que falavam!
Referências:
FIERZ, M.S.M. A fonte secou. Revista Carta na Escola. Out. 2014.
VENTURI, L.A.B. O mito da estiagem de São Paulo. Revista Carta na Escola. Out. 2014.
ZIEGLER, M.F. Água de reuso que SP irá adotar pode trazer riscos à saúde, dizem especialistas. Endereço: http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2014-11-10/agua-de-reuso-que-sp-ira-adotar-pode-trazer-riscos-a-saude-dizem-especialistas.html - acesso em 10/11/2014
LIMA, L. Alckmin diz que São Paulo precisa de 3,5 bi contra crise da água. IG Brasília. Endereço: http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2014-11-10/alckmin-busca-parceria-do-governo-federal-para-solucionar-crise-hidrica.html - acesso em 10/11/2014.
quinta-feira, 6 de novembro de 2014
A classe média não me representa! – Parte 2
Há algum tempo, um aluno pediu a palavra e perguntou: “Professor, a qual classe o senhor pertence”? Prontamente respondi: à classe trabalhadora! E o educando novamente inquiriu: Professor, o senhor não entendeu! Eu quero saber se o senhor é classe média, classe baixa.... Sem hesitar lhe respondi: Entendi sim! Eu pertenço à classe trabalhadora, pois, penso que a sociedade tal como afirmou Karl Marx é dividida em classe trabalhadora ou proletária que precisa vender sua força de trabalho para sobreviver e a classe capitalista que é a possuidora dos meios de produção e que se apropria da mais-valia, ou seja, da produção excedente de riquezas realizada pelo trabalhador”. É óbvio que para alguns setores da economia, ou até para o governo seja importante saber a classificação da sociedade de acordo com critérios de renda, porém, estes sempre foram polêmicos. Há algum tempo a classificação era determinada de acordo com a posse de aparelhos eletrônicos, também, há classificações que estabelecem a divisão de acordo com faixas de rendimentos em classes A, B, C, D, e, E. Não é nosso intuito discorrer sobre as faixas de renda neste artigo até porque existem muitas imprecisões baseadas em interpretações equivocadas e também por que nossa visão acerca da classe média é outra e não diz respeito ao aspecto material, mas, conceitual.
Penso que para nós trabalhadores, a interiorização de pertença à classe média não alivia a nossa carga de trabalho, não nos outorga os direitos pelos quais lutamos e serve para a nossa alienação. Ao pensarmos que pertencemos a um grupo específico de renda esquecemos a nossa militância, abandonamos o sindicato, e, alienados, nos tornamos indiferentes à luta de outros companheiros trabalhadores que eventualmente tenham renda inferior à nossa e passamos a defender os interesses da elite, que não somos, pois, sobrevivemos por meio da venda de nossa força de trabalho. A intelectual Marilena Chauí afirma que: “O que distingue uma classe social da outra não é a renda ou a escolaridade. O que distingue uma classe social da outra é a maneira de ela se inserir no modo social de produção”. Então, segundo Chauí, temos os capitalistas (banqueiros, latifundiários, industriais, etc.), os proletários (trabalhadores que vendem sua força de trabalho). Aquela parcela da população que não está inserida nas categorias anteriores é que forma conceitualmente a classe média, ou seja, a pequena propriedade comercial, agrícola e das profissões liberais. Cazuza gravou uma música que afirmava “a burguesia quer ficar rica” e na mesma letra disparava “enquanto houver burguesia não vai haver poesia”, nada mais verdadeiro, a classe média quer ser o topo da pirâmide social, não consegue, e vive resmungando a sua sina.
Marilena Chauí causou polêmica algum tempo atrás quando afirmou: “a classe média é uma abominação política porque é fascista; é uma abominação ética porque é violenta; é uma abominação cognitiva porque é ignorante”. Em entrevista posterior, ela afirmou que não se dirigiu à chamada “nova classe média” que é em seu ver, “uma nova classe trabalhadora”. Afirma que se dirigiu à classe média já estabelecida que considera petulante, arrogante, ignorante e fascista. De minha parte, sou contra generalizações, mas concordo que há no seio da classe média, uma parcela de integrantes com discurso alienado, preconceituoso e extremamente autoritário. É por essas atitudes grotescas de parte de seus representantes que digo: a classe média não me representa!
Referência:
CHAUÍ, M. Não existe nova classe média. Disponível em: http://socialistamorena.cartacapital.com.br/marilena-chaui-nao-existe-nova-classe-media/ - acesso em 27/10/2014.
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